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Antônio Ramin havia chegado da Itália há dois dias, quando participou da abertura do IV Congresso Nacional da CPT, na Universidade Federal de Rondônia (Unir). Ele é irmão de Padre Ezequiel Ramin, assassinado por defender os sem terra e indígenas de Rondônia. Foi no dia 24 de julho de 1985. Na próxima semana seu martírio completa 30 anos.
(Equipe de Comunicação João Zinclar - IV Congresso Nacional da CPT
Imagem: Projeto Padre Ezequiel)
O irmão do religioso esteve no Congresso com José Aparecido, coordenador do Projeto Padre Ezequiel. Antônio ficará um mês em Rondônia para participar da celebração do martírio de Padre Ezequiel e visitar ações apoiadas pelo projeto.
Conversamos em uma tenda, próxima às cozinhas. "Vem sempre ao Brasil?", pergunto. "Venho a cada cinco anos para a memória do meu irmão. Eu gosto muito da participação do povo. A memória de Ezequiel é muito sentida no povo", afirma Antônio, que fala bem o português. Conta que aprendeu o idioma lendo "a gramática portuguesa" (risos). "É difícil, não é?". Antônio confirma, mas para ele o difícil, agora, é entender as palavras e expressões regionais.
Ao longo de uma conversa de 30 minutos, seu Antônio falou sobre a origem camponesa de sua família, a vida de Ezequiel junto aos povos do campo, e os relatos que ele fazia sobre o Brasil através de cartas. "A sensibilidade que Ezequiel carregava no coração era naturalmente camponesa", destaca Antônio.
Padre Ezequiel escrevia cartas para a família italiana narrando sua vida aqui na Amazônia. "Ele gostava muito de estar aqui. Escrevia para casa e dizia que o povo de Rondônia, de Cacoal, da Paróquia, era muito bonito. Ele gostava de brincar com os jovens. Gostava de ajudar os casais separados. De visitar os idosos doentes", relembra o irmão.
Ezequiel era missionário comboniano. Foi morto novo, tinha 32 anos, sendo cinco de sacerdócio. Trabalhou na diocese de Ji-Paraná. Na região, um dos maiores conflitos era entre fazendeiros e posseiros. A fazenda Catuva mantinha vários pistoleiros armados, que ameaçavam o povo constantemente. O religioso procurava intervir e denunciar as injustiças. Sua congregação relata que o padre se deparou, ali, com milhares de pessoas passando fome. Os conflitos não paravam. Foi morto por defender a vida. "A herança de sua morte, de seu sangue, significa que ele tinha uma aliança com o povo", atesta Antônio.
30 anos
A celebração dos 30 anos do martírio do Padre Ezequiel Ramin acontecerá em Cacoal (RO), no dia 25 de julho. Haverá uma caminhada pela paz, com concentração na Praça Municipal. Depois, acontece a celebração na Paróquia Sagrada Família. No dia seguinte, na parte da manhã, haverá uma missa em Rondolândia, onde Ramin foi morto. Na ocasião, será inaugurada a capela construída em memória ao padre.
Na celebração também será momento de tratar da abertura do inquérito diocesano sobre o martírio do Padre Ezequiel. José Aparecido explica que em 2013 os Missionários Combonianos começaram a mobilização. "Mas no caso é a diocese de Ji-Paraná, onde o padre trabalhava, é que tem de manifestar esse pedido para a Congregação das Causas dos Santos, que fica em Roma. Então, a partir dessa iniciativa da diocese, que creio que Dom Bruno apoie", destaca.
Além disso, José pede o apoio destacou o quanto o apoio do povo nesse processo é importante. "É interessante que as pessoas falem, deem depoimentos. Quem conheceu ou quem não conheceu. Mas que falem sobre o que conhecem da vida dele. Até mesmo sobre alguma graça que conseguiu a partir da invocação em nome dele. Então, tudo isso é muito importante, além da moção, que é muito importante", ressalta Aparecido.
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O IV Congresso Nacional da CPT levantou a necessidade de denunciar mais intensamente e combater o fechamento das escolas no campo, prática que tem se intensificado nos últimos tempos no Brasil, bem como cobrar de forma mais veemente políticas públicas que garantam educação de qualidade para o povo no e do campo.
(Equipe de Comunicação João Zinclar - IV Congresso Nacional da CPT / Imagens: Joka Madruga)
O campo nunca foi pensado como espaço de vida pelo Estado. Ao longo da história do campo brasileiro as políticas educacionais sempre foram pensadas de forma desigual, inferiorizada e residual. Nesta concepção, para viver no e do campo bastava apenas saber ler, pois cabia ao camponês somente reproduzir sua força de trabalho e tirar da terra os alimentos para atender à cidade. O reflexo desta lógica foi a ausência e formulação de políticas que levassem em consideração o modo de viver e de se organizar das populações do campo.
“A escola do campo ensina para além do letramento, promove e garante o convívio das pessoas em suas diferenças e suas identidades camponesas para a liberdade”, disse a educanda do campo Elen Lisboa, de Terra Nova (MT), da tenda Rio São Miguel.
Os camponeses e camponesas, trabalhadores e trabalhadoras do campo sempre produziram grande parte da cultura brasileira e múltiplos saberes populares e conhecimentos, em suas várias formas de organização em seus territórios.
A Comissão Pastoral da Terra, ao longo dos seus 40 anos de existência, vem apoiando e reafirmando as lutas camponesas, por terra, água, educação, direitos e vida plena aos povos campo. As experiências dos quilombolas, dos indígenas, das comunidades tradicionais, assentados, acampados, assalariados refletem seus projetos de vida alicerçados num projeto de educação emancipadora, libertadora. A educação do campo se diferencia da educação rural principalmente por contrapor ao modelo de educação bancária, alienante e reprodutora do capital. Ela tem em seus princípios fundamentais o diálogo de saberes tradicionais, de gerações, de igualdade de gênero, de cultura popular na autorganização dos territórios e dos assentamentos.
A educação do e no campo de fato e de direito, reconhece a realidade e necessidade dos povos campesinos, tendo como ponto de partida seu lugar, vivência e cultura para afirmar e reafirmar a identidade camponesa.
O cenário nos últimos dez anos revela que mais de 37 mil escolas foram fechadas no campo de acordo com (INEP). Esses dados apontam como as políticas educacionais tem sido tratadas pelos governos em suas diferentes escalas. Programas específicos e pontuais de educação do campo não garantem continuidade nas ações. O fator quantitativo é sempre levado em consideração para o fechamento das escolas, sem sequer consultar as comunidades. Muitas escolas rurais e não do campo, encontram-se em situações precárias, gestores da cidade, educadores sem formação específica, mesmo tendo atualmente mais de 40 cursos de Licenciatura em Educação do Campo em curso em todo o país.
De fato, muitas ações de luta pela educação do campo tem sido travadas pelos camponeses e camponesas, quilombolas e indígenas, seja pela ocupação do Ministério da Educação, realização de fóruns municipais e estaduais, participação em conferências, mobilizações, construção de audiências públicas, elaboração de propostas curriculares diferenciadas junto aos conselhos municipais e estaduais, pressão junto aos governos para a realização de concursos públicos específicos entre outras ações.
A partir dos diversos relatos das experiências apresentadas no IV Congresso Nacional da Comissão Pastoral da Terra, tendo o Rio Madeira a nossa volta, em plena floresta amazônica, foi reafirmado coletivamente o nosso compromisso com a educação do campo e a vida, através da denúncia e combate do fechamento das escolas no campo, uma violação dos direitos das populações do campo, das águas e das florestas. Nesse sentido, a lei 12.960/14, que dificulta o fechamento das escolas rurais, quilombolas e indígenas é fruto dessa luta.
"É necessário um amplo debate político em escala nacional sobre os rumos da educação no campo no País, executadas nos municípios e estados, tão submissos à estrutura conservadora da propriedade privada da terra e sua função", analisa a educadora popular Creuza Teles.
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“Nós queremos garantir o direito de existir. Queremos o reconhecimento e a titulação dos nossos territórios para garantir a existência das comunidades”. O depoimento de Naldo Braga Correia, integrante do Movimento Quilombola do Maranhão (Moquibom), ecoou alto na Tenda Rio Guaporé, onde se discutiu o eixo “Esperança”, na quarta-feira (15), durante o IV Congresso Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), realizado em Porto Velho, Rondônia.
(Equipe de Comunicação João Zinclar - IV Congresso Nacional da CPT
Imagem: Rafael Oliveira)
Em sua fala, Correia destacou a importância das comunidades se organizarem para conquistar os direitos que lhes cabem. “Em outros tempos, nós só recebíamos migalhas de organizações e órgãos públicos responsáveis por acompanhar os quilombolas. Hoje, com a criação do Moquibom, nós mesmos somos os protagonistas de nossas batalhas”, disse.
O resgate da cultura e da identidade quilombola proporcionou às famílias maior poder de mobilização para pressionar o poder público. “Com os grupos unidos, nós já fechamos estradas e ocupamos a sede do Incra no Maranhão. Esses atos trouxeram alguns avanços para os quilombos”, relembrou.
Nesse mesmo caminho segue um grupo de trabalhadores e trabalhadoras que compõem a Articulação Camponesa de Luta pela Terra e Defesa dos Territórios do Tocantins. Segundo Reginaldo Lima Viana, um dos coordenadores dessa articulação, mais de 18 comunidades se juntaram para fortalecer as lutas em comum. “Muitas vezes, nossas reivindicações são as mesmas, ainda que em regiões diferentes. É muito difícil avançar na luta pela terra se caminharmos individualmente”, argumentou.
As mobilizações organizadas pela Articulação ocasionaram audiências públicas com órgãos como o Incra, Ministério Público Federal, Defensoria Pública Agrária e Programa Terra Legal. “Quando fechamos a BR-153, juntamente com os indígenas, conseguimos alguns resultados satisfatórios. A mesma coisa aconteceu quando ocupamos a sede do Incra de Araguaína (TO). Portanto, no meu modo de ver, o caminho para nosso fortalecimento é trabalhar o diálogo entre as comunidades”, finalizou.
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Empurrados pelos exemplos de Memória e Rebeldia, vistos nos primeiros dias do IV Congresso Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), camponeses e camponesas, indígenas, quilombolas e agentes pastorais demonstraram na manhã desta quinta-feira (16) os diversos sinais de Esperança presentes na luta dos povos da terra e das águas.
(Equipe de Comunicação João Zinclar - IV Congresso Nacional da CPT
Imagem: Douglas Mansur)
Em uma espontânea e harmoniosa sintonia, os conteúdos dos grupos das sete tendas se complementaram nas apresentações. Com muita força, destacou-se como principais sinais de esperança a valorização da força das mulheres, a capacidade dos jovens e crianças, o reconhecimento dos saberes milenares, a certeza de que agroecologia e sementes crioulas são ferramentas para a resistência das comunidades, entre outros elementos.
O grupo da Tenda Rio Machado disse acreditar que “formação, conquista, trabalho de base, organização, comunidades tradicionais, reserva extrativista, resistência, persistência, defesa dos povos das florestas, fraternidade e ocupação” são importantes símbolos de esperança no campo.
Em um momento místico, o Credo das Sementes foi rezado pelos integrantes da Tenda Rio Madeira: “Creio na semente criada por Deus e guardada por camponeses em todo o mundo [...] creio na semente plantada na terra livre de transgênicos e agrotóxicos [...] creio nas crianças que são sementes humanas de um futuro melhor”.
Mas no fim, quem emocionou e surpreendeu a Plenária foram três crianças, que fazem parte dos “Amiguinhos do Cerrado”, experiência também apresentada ontem. Um dos pequenos, vestido de onça pintada, correu em meio aos congressistas, subiu ao palco, urrou, engatinhou... demonstrou toda energia digna do felino. Outras duas crianças leram um cartinha feita por elas próprias, clamando pela preservação do Cerrado:
“Somos os Amiguinhos do Cerrado. Somos frutos desta terra tão querida. Estou aqui para pedir à população que preserve nosso Cerrado. O Cerrado grita por socorro! Até quando o Cerrado vai aguentar tanta maldade? Tanta destruição? Se não cuidarmos agora, no futuro tudo será um grande deserto.
Cadê a onça pintada? O lobo guará? A arara azul? Quase não vejo mais tamanduá. E a ema, as seriemas? Será que eles só vão aparecer nas fotos antigas? Somos crianças e ainda temos muito que viver. Mas o que a humanidade está deixando para nós? Neste congresso queremos pedir: ajude a nós, os Amiguinhos do Cerrado, a defender e preservar nosso Cerrado!”.