Agentes da Comissão Pastoral da Terra (CPT) estiveram reunidos entre os dias 12 e 15 de julho em Canindé, no Ceará, para o Encontro Anual de Formação da Grande Região. Confira o documento final:
“No meio do caminho tinha uma pedra,
tinha uma pedra no meio do caminho,
tinha uma pedra,
no meio do caminho tinha uma pedra”
(Carlos Drummond de Andrade)
Nós, 42 agentes da Comissão Pastoral da Terra do Nordeste, Regionais – Ceará, Piauí, Bahia e Nordeste II (RN, PE, PB, AL) – estivemos reunidos em Canindé, CE, entre os dias 12 a 15 de julho de 2016, para o encontro anual de formação da Grande Região. Nas terras romeiras de São Francisco das Chagas, acolhedora de milhares de romeiras e romeiros nordestinos, rezamos, convivemos, estudamos, fortalecemos a esperança, reafirmamos compromissos e nos indignamos diante de tantas ameaças à vida das pessoas, especialmente as empobrecidas, e com a destruição da natureza, nossa Casa Comum. Animados por Francisco das Chagas e entusiasmados por Francisco de Roma, reafirmamos nossa missão de cuidar das pessoas e defender o planeta.
Dentre estas ameaças nos preocupa o avanço da mineração no Nordeste e em várias regiões do país e da América Latina, projetos de morte que seguem removendo pedras de forma assustadora e irresponsável. Não podemos esquecer o crime anunciado de Mariana – MG, onde a ganância do capital, materializada na ação das empresas Vale do Rio Doce, Samarco e BHP Billiton, arrasou com um mar de lama comunidades inteiras, destruiu rios, matas, casas, expulsou famílias e ceifou vidas humanas, mas sabemos que a situação de Mariana, em Minas Gerais, é apenas uma de muitas provocadas pela ganância de poucos, e segue a expansão dos projetos de extração mineral no Nordeste e Brasil afora.
Milhares de famílias no campo, bem como nas cidades, vivem hoje sobre uma total insegurança em relação ao seu futuro diante da descoberta de novas jazidas e projetos de exploração mineral propagandeados, incentivados e financiados pelos governos brasileiro, na sua maioria, com recursos públicos. Comunidades inteiras, invisibilizadas pela grande mídia têm seus direitos desrespeitados, são atropelados pela desenfreada procura por estes bens que sustentam a atual sociedade consumista em crise, são elas que sofrem diretamente as consequências da mineração sobre a saúde, o modo de vida e o meio ambiente.
Constatamos essa realidade durante uma visita ao Assentamento Morrinhos, localizado no município de Santa Quitéria – CE, uma das 156 comunidades que podem ser atingidas pelo “Projeto Santa Quitéria” de Mineração Urânio e Fosfato através da empresa INB (Indústrias Nucleares do Brasil) e Galvani (Tendo como sócio majoritário a empresa Norueguesa YARA). A insustentabilidade desse projeto de morte se dá claramente quando necessita-se o equivalente a 115 carros pipas por hora enquanto que as comunidades locais são abastecidas apenas por 28 carros pipas durante todo o mês.
O Assentamento Morrinhos fica apenas a 4 km da “mina de Itataia”, principal mina do Projeto. A desapropriação aconteceu em 1994 e desde esse período a comunidade vem produzindo alimentos da agricultura familiar para o consumo das famílias e comercialização dos seus produtos nas feiras locais, abastecendo diretamente as famílias dos municípios vizinhos, no entanto, com a instalação desta mineradora, a realidade será alterada, pois toda área de produção será contaminada pelos rejeitos radioativos a serem depositados em um reservatório acima dos cursos d’agua que abastecem três bacias do Ceará (Acaraú, Curú e Banabuiú).
Neste ano, a CPT comemora seus 41 anos de existência junto aos povos do campo, das águas e das florestas. O grito que sobe das comunidades atingidas denunciando a mineração nos faz reafirmar que estamos do lado de quem sofre as injustiças. Nossa opção pelos pobres da terra é inegociável e, com ela, a opção por defender a Casa Comum de qualquer ação destruidora na busca desenfreada pelo lucro. Em sua Carta Encíclica “Laudato Sí”, o Papa Francisco afirma: “...Toda abordagem ecológica deve integrar uma perspectiva social que tenha em conta os direitos fundamentais dos mais desfavorecidos” (n. 93). Neste sentido, o meio ambiente deve ser considerado à luz do destino comum dos bens e ser considerado um “bem coletivo” (n. 95). Por isso reafirmamos nosso compromisso com as comunidades camponesas, comunidades e povos tradicionais que historicamente vivem na terra e cuidam dos bens naturais com responsabilidade e equilíbrio.