Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Marcada pela participação de educadores e educadoras das cinco regiões do país, a II Plenária Nacional debateu na última sexta-feira (26/3), a atual conjuntura educacional brasileira e homenageou o educador Paulo Freire, que este ano completa cem anos. Mais de 300 pessoas participaram da atividade via Zoom e ao vivo pelo YouTube.
O Estado Brasileiro não oferece as estruturas necessárias para garantir o distanciamento social e as demais medidas de segurança, “colocando em risco a vida de todo o corpo docente e discente nas escolas públicas e particulares”, afirma a professa Ingrid D’avilla. Foto: Bruno Cavalcanti

Da Página do MST

 

Animada pelas canções populares do violeiro Zé Pinto, poesias, informes e o lançamento do Especial da “Jornada Nacional Viva Paulo Freire: Um Educador do Povo”, a iniciativa apresentou os desafios no enfrentamento a pandemia do Coronavírus e seus reflexos na construção de uma educação do campo. Além disso, foi apresentado um calendário de atividades que serão desenvolvidas pelo Setor de Educação do MST durante o ano.

Para contribuir com o debate da atual conjuntura brasileira, a Plenária contou com a participação de Kelli Mafort, da coordenação nacional do MST, Celi Taffarel, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), e Ingrid D’avilla, professora pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz.

De acordo com Mafort, a análise de conjuntura é determinada pela movimentação das classes. Nesse sentido, ela afirma que existem, pelo menos, três grandes elementos que se destacam.

“O primeiro elemento é a questão da crise da pandemia, que só revela e acentua a crise estrutural do capital. Coube a nossa geração lutar contra essa crise metabólica que tem uma dimensão econômica, cultural, social e ambiental. Esse modelo do capital tende a gerar muitas pandemias. Pensando nisso, conectando-o a questão agrária e a política brasileira, precisamos questionar o modelo do agronegócio. Na perspectiva da política genocida do Bolsonaro, esse elemento de massa sobrante, desempregada e excluída, faz parte de um projeto de poder com bases na necropolítica. Ou seja, lutar pela vida é um grande desafio”, explica a dirigente.

Kelli Mafort durante exposição na Plenária Nacional das Educadoras e Educadores da Reforma Agrária. Foto: MST

Ela diz também que pensando na questão brasileira, o segundo elemento conjuntural importante é a restituição dos poderes de Lula, que muda o cenário da disputa política nacional. Porém, é importante entender o que está por detrás da Lava Jato, que é “a atuação do império. Quando a gente bota o Lula para jogar, ele próprio está consciente que a disputa principal é agora e não em 2022. O 2022 é importante, mas a luta é desde já”, comentou Mafort.

A terceira e última questão apontada por ela foi a “aplicação do medo como método”. “Toda vez que o Bolsonaro se sente acuado ou isolado, ele utiliza a tática do medo. Não é a toa que tem utilizado o PL [Projeto de Lei] do Terrorismo. […] Sentimos com força, a pandemia do vírus, da fome, mas também do extermínio propagado a partir do medo”, explicou.

Sobre a fome, tema citado por Mafort e que apareceu com muita frequência durante a Plenária, dados das últimas Pesquisas de Orçamentos Familiares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), realizada em julho de 2017, mostram que a situação da fome piorou, os números são extremamente elevados, tendo em vista a extensão territorial do país que a apresenta grande potencial agrícola. Em média 15 pessoas morrem de fome, por dia. Ao todo até o último apontamento feito pelo IBGE, 5.653 pessoas morreram por desnutrição no Brasil.

Ingrid D’avilla é professora pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz. Foto: Arquivo Pessoal

Nesse sentido, a dirigente nacional, Kelli apresentou pelo menos três grandes bandeiras de lutas: a defesa do Auxílio Emergencial de R$ 600,00, a Vacina para Todos e o Fora Bolsonaro!

As professoras Ingrid e Celi falaram sobre os impactos da pandemia na conjuntura educacional e reafirmaram a necessidade do não retorno as aulas. No estado de São Paulo, por exemplo, as escolas estaduais foram liberadas para a volta das aulas presenciais em fevereiro deste ano, desde que sigam protocolos de proteção contra a Covid-19. Na rede particular, o governo paulista liberou o retorno a partir do dia 1° de fevereiro e na rede pública municipal da capital paulista, a prefeitura determinou a volta às aulas para o dia 15 de fevereiro. Cada município teve autonomia para determinar a volta.

Na avaliação de Ingrid, o Estado Brasileiro não oferece as estruturas necessárias para garantir o distanciamento social e as demais medidas de segurança, “colocando em risco a vida de todo o corpo docente e discente nas escolas públicas e particulares”. Além disso, destacou que o retorno das aulas é de interesse de uma rede privada de ensino, que não tem compromisso com a vida, mas sim com o lucro.

Volta às aulas na Pandemia é Crime!

Sobre essa realidade, a BBC News Brasil publicou no mês de março o depoimento de uma professora que foi infectada pelo Coronavírus.

“Sou professora da Educação Infantil (para alunos de até cinco anos de idade). Parte de mim foi trabalhar (presencialmente) morrendo de medo e pensando: é questão de tempo até eu pegar (o novo coronavírus)… São muitas turmas, muitas chances diferentes todos os dias”, escreveu Luiza* em mensagem no Instagram.

Celi Taffarel é professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Foto: Arquivo Pessoal

Após retornar à escola, em fevereiro, Luiza, professora de inglês em João Pessoa (PB), diz que: “Peguei covid-19 na segunda semana de aulas (presenciais)”, relatou na mensagem. A situação trouxe revolta para ela, que diz ter tomado muito cuidado para evitar a infecção pelo coronavírus desde o início da pandemia. Para Luiza, não há dúvidas de que foi infectada no trabalho. “Outros cinco professores da escola também pegaram o vírus no mesmo período.”

Terra e educação

Conectando essas questões com o debate da luta pela terra, Tafarel apontou que existem três pontos centrais que nascem da luta concreta dos trabalhadores e trabalhadoras do campo. “Primeiro tem dados que demonstram que existe um processo planetário de destruição de forças produtivas, como a natureza, o ser humano, o trabalho, a educação, a ciência. O capital destrói de forma violenta a vida e massacra os trabalhadores do campo e da cidade.”

Para ela, é importante reconhecer as lutas construídas pelo MST na defesa da terra, do território e da educação do campo como centrais. “O Movimento está dando um indicador de nossas lutas neste momento”.

Centenário Paulo Freire

A mística em torno do legado de Paulo Freire ocupou toda plenária. Entre uma discussão e outra, foi lançado o Especial da “Jornada Nacional Viva Paulo Freire: Um Educador do Povo”, como marco dos cem anos que o educador completaria em vida.

O Especial reúne diversas informações e conteúdos, como vídeos, textos, fotos, cartilhas e cartazes, sobre a comemoração do Centenário de Paulo Freire, que já estão acontecendo nos quatro cantos do país. Muitas dessas iniciativas puxadas e organizadas pelas Escolas do Campo e pelas educadoras e educadores que participaram da Plenária.

*Nome alterado para preservar as identidades dos entrevistados(as).

**Editado por Solange Engelmann

 

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