Artigo
Do Bem viver no Equador vem a ideia do desaprender ou do descolonizar as mentes e os corpos sedentos de liberdade. Para as mulheres, este é um desejo tão antigo quanto o patriarcado e seus símbolos que dominam o inconsciente individual e o coletivo do universo feminino. Como diz Carl Gustav Jung, em sua teoria analítica, as mensagens oriundas do inconsciente influem no âmbito fisiológico cerebral e nas dimensões simbólicas que constroem ou destroem os sonhos.
Desaprender, então, é refletir sobre a morte dos sonhos. É reaprender sobre como o machismo nosso de cada dia está aliado ao capitalismo neoliberal. É abandonar os históricos modos de conhecer e sentir, que ferem o nosso saber e subjetividade e que foram construídos através das ficções e da educação para sustentar um modo de produção predador. É reaprender que felicidade e liberdade não são sinônimos de consumismo. Esse é somente um instrumento pelo qual a economia, aliada ao Estado Brasileiro, amplia a colonização de corpos e mentes.
No entanto, resistimos ao poder neoliberal, ao poder patriarcal, à frequente onda de violência e a mercantilização dos nossos corpos. Resistimos à retirada de direitos - conquistados a “duras penas” - em favor de uma agenda econômica que aprofunda a desigualdade de gênero. Seguimos no caminho por uma vida em igualdade, pautando nossas lutas na desconstrução do modelo predador atual. Sonhamos e lutamos por comunidades autônomas frente ao Estado e às corporações, comunidades que possuam outros modos de pensar, sentir e se relacionar.
A luta feminista é uma força política importante neste processo de desconstrução do modelo de sociedade vigente. É uma luta que avança, há tempos, enfrentando a expressão mais dura do sistema patriarcal, capitalista e neoliberal: a “coisificação da mulher”, que ganha um reforço simbólico nas mídias.
As lutas feministas se somam a outras iniciativas de desconstrução do capitalismo neoliberal. Sabendo ser necessário e urgente, o feminismo aponta para a construção de um projeto social que repense as simbologias opressoras, que sare as feridas abertas pelo patriarcado - feridas remexidas à medida que se regula o comportamento de gênero e a sexualidade.
Desaprender e reaprender a sermos nós mesmas: observando as muitas iniciativas que afloram na atualidade; fortalecendo a imensa capacidade de mobilização das mulheres no mundo por visibilidade e por garantia de direitos; lutando pelo reconhecimento político, social, cultural, econômico, familiar e, como se diz em toda América Latina, pelo papel comunitário das mulheres, sem esquecer, claro, da árdua luta contra o feminicídio e contra as desigualdades de gênero.
Diferente da cultura machista, nós mulheres não queremos o controle, mas também não queremos continuar controladas pelo poder patriarcal. Descolonizar o sentir e o saber, mulheres e também os homens, pois, como bem diz a “mulherada”: “Quando uma mulher avança, nenhum homem retrocede”.
Referências bibliográficas:
C LACSO, “Las mujeres celebramos y resistimos” – Declaração dos Grupos de Trabalho.
Gebara, Ivone, O pensar a partir do corpo e da cultura – provocações de.21 de março de 2017, SOS Corpo.
Jung, Carl Gustav – A Natureza da Psique – Obras Completas Volume VIII/2, 1971, Editora Vozes Ltda, Petrópolis, 2000.
* Vanúbia Martins é psicóloga, agente pastoral e coordenadora da CPT NE 2