Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2016, a região Nordeste foi uma das que mais registrou ocorrências de conflitos por terra e pela água no Brasil. Foram ao todo 473 ocorrências nessa região. Entre os estados mais conflituosos estão a Bahia, Maranhão, Pernambuco, Piauí. Os dados só não são piores do que os da região Norte, que soma um total de 629 ocorrências de conflito por terra e água. As informações constam no Caderno Conflitos no Campo Brasil 2016, lançado recentemente pela CPT.

Ainda segundo os dados apresentados no Caderno,  é possível constatar que em 2016 os conflitos no campo na Região Nordeste foram motivados predominantemente pela atuação de latifundiários da cana-de-açúcar, de empresas do agrohidronegócio,  sobretudo na região do MATOPIBA, pela atividade da mineração e pela presença ou avanço de grandes empreendimentos de infra-estrutura, como o Porto de Suape, a Transnordestina e os investimentos em energia eólica, por exemplo. Do outro lado, as diversas categorias de comunidades tradicionais e famílias posseiras foram, mais uma vez, as principais impactadas.

No entanto - e infelizmente -, os registros não provocam estranheza.  Já há vários anos, a região Nordeste vem apresentando altos índices de conflitividade no campo, o que a faz atingir patamares alarmantes de violência contra as comunidades camponesas.

Para compreender os seus porquês, será preciso levar em consideração a conjunção de alguns fatores específicos e fortemente presentes no Nordeste. Primeiro, cabe destacar que se trata de uma região que concentra aproximadamente 50% do campesinato brasileiro.  Segundo, o Nordeste, nos últimos anos, tem sido a região que mais cresceu economicamente no país, a partir de uma política de Estado de descentralização e regionalização do acúmulo de capital. Esse crescimento econômico significou o aumento da presença de capital nacional e estrangeiro na região, o aumento da apropriação das águas, das terras, dos minérios e dos ventos e o crescimento da violência no campo.

Ocorre que o fortalecimento e o avanço desse modelo de desenvolvimento na região Nordeste não encontrou somente uma alta concentração de homens e mulheres vivendo no campo. Encontrou, isso sim, um tecido social organizado e historicamente resistente/ re-existente na luta frente ao capital, e principalmente na luta pela afirmação de identidades outras.

Canudos, Caldeirões, Quilombos dos Palmares, Pau de Colher. Esses são alguns exemplos de lutas que, apesar de terem sido caracterizadas hegemonicamente como revoltas messiânicas, expressaram, por sua natureza, o encontro de pobres, negros/as, índios/as e trabalhadores/as. Reescreveram a história do Brasil, sob outra perspectiva que não a do colonizador. Por isso, foram tão reprimidas pelo próprio Estado/exército brasileiro, mesmo sendo vistas também como revoltas pontuais.

É a articulação de elementos como esses (apontados aqui de forma sucinta, vale ressaltar) que pode nos dar pistas para compreender o Nordeste: região de lutas de longa duração, de lutas que reescrevem outra história do Brasil, que apontam outros caminhos e afirmam outra história de vida, que não é a do colonizador. Até hoje, o DNA do povo camponês na região é o DNA de outra história possível e profunda.

 

 

Texto elaborado a partir de entrevista realizada com Plácido Júnior, em maio de 2017.

 

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