“Não apaguem o Espírito. Não desprezem as profecias” (1Ts 5,19)
Reunidos na 16ª Assembleia da CPT Regional Nordeste II, entre os dias 15 e 18 de agosto de 2016, no Santuário Padre Ibiapina, em Santa Fé/Solânea – PB, local santo de inspiração e expressão da religiosidade popular, nós, camponeses, camponesas e agentes de pastoral, fizemos a memória das lutas dos povos do Nordeste. Lembramos dos lutadores Ivanildo Francisco da Silva - camponês brutalmente assassinado pelo latifúndio, em abril de 2016 na cidade de Mogeiro/PB -, Margarida Maria Alves, Padre José Comblin e o Padre Mestre Ibiapina: grandes defensores dos direitos dos povos do Nordeste. Com esta carta, queremos comunicar para a sociedade brasileira, para as Igrejas e especialmente para as comunidades com as quais partilhamos a luta, nossas discussões nessa assembleia, nossas decisões e anunciar nossas esperanças.
É notório que os camponeses e camponesas, através de lutas e resistências históricas, garantiram nos últimos anos várias conquistas de direitos. Nesse mesmo processo de luta, houve também o avanço da participação efetiva da juventude, das mulheres camponesas e das comunidades tradicionais.
Não obstante às conquistas obtidas, temos consciência de que a realidade no campo está muito distante da desejada. Ainda existem inúmeras comunidades em conflito pelo acesso à terra, ao território e à água. Os lutadores e lutadoras do povo continuam sendo criminalizados e assassinados e a estrutura agrária do país é marcadamente concentradora. Os governos privilegiam o latifúndio, o agro e hidronegócio, a mineração, os grandes projetos do capital e a especulação imobiliária, que são causadores dos conflitos enfrentados pelas comunidades. Em todo esse contexto, impera uma violência física e simbólica do projeto das elites privilegiadas contra o povo.
Esse cenário de violação e negação de direitos é uma triste marca da história do Brasil, expressa em sucessivos golpes contra os povos do campo, consequência de alianças espúrias entre majoritários setores do legislativo, do executivo e do judiciário. A conjuntura atual é ainda mais preocupante quando está claro que o golpe em curso tem como alvo principal o ataque aos direitos da classe trabalhadora, conquistados a duras lutas, e o fortalecimento do capital financeiro, ameaçando inclusive a própria democracia brasileira. Não aceitamos os atuais rumos da política do país e o avanço das forças conservadoras contra a liberdade e a democracia.
Os desafios são enormes. Não nos deixaremos dominar pela desesperança. Os povos do Nordeste reafirmam que irão permanecer na luta contra o latifúndio e contra todo projeto de morte. A CPT sente-se encorajada a continuar companheira e solidária em suas lutas e reafirma seu apoio a todas as experiências alternativas e comunitárias de liberdade e autonomia camponesa. Não deixaremos extinguir o Espírito que nos dá vida e nos ilumina. Não desprezaremos a profecia bendita, que nos faz gritar cada vez mais alto: “Malditas sejam todas as cercas que nos impedem de viver e amar” (Dom Pedro Casaldáliga).
Se companheiros e companheiras que nos precederam nessa luta conseguiram resistir ao mal, à violência e à injustiça, nós também conseguiremos, reafirmando diariamente nossas grandes utopias. Com a firmeza de quem sabe que o seu lugar é na luta, ao lado dos empobrecidos, convocamos a todas as pessoas comprometidas com a justiça e indignadas com todas as formas de desigualdades, a afirmar como o profeta bíblico Isaías: “Aqui estou, Senhor, envia-me!” (Is 6,8).
Santa Fé, Solânea - 18 de agosto de 2016
Os/as participantes da 16ª Assembleia da Comissão Pastoral da Terra – Regional Nordeste II