Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Veja a baixo o relato do Padre Herminio Canova, da Coordenação Nacional da CPT, que visitou as obras das Hidrelétricas Jirau e Santo Antonio no Rio Madeira, em Rondônia

São obras grandiosas, de tecnologia avançada e de engenharia inovadora. A obra mais adiantada é a Usina Hidrelétrica Santo Antônio, a 10 km de Porto Velho, 18.000 operários, consórcio Odebrecht e outros, já com a parede quase terminada, com 09 comportas/segmento já funcionando e com as primeiras das 50 turbinas/bulbo já produzindo energia no final deste ano.Em Santo Antônio, os operários e operárias (10% da mão de obra) são de Porto Velho e passaram por cursos de qualificação. Segundo a opinião do MAB, grupos de famílias desta área foram reassentados de maneira razoável; o assentamento Santa Rita foi realizado de forma aceitável, embora faltem ainda muitas coisas, sempre segundo a informação do MAB. A empresa da Usina Santo Antônio informa que uma equipe de técnicos e biólogos cuida do meio ambiente e da transferência das espécies vegetais e animais.

A barragem não é alta, como nas hidrelétricas tradicionais, pois as turbinas são deitadas aproveitando a força da correnteza da água, portanto não precisa de uma grande queda de água. Em geral, as informações das empresas das duas obras tem como objetivo de amenizar os problemas que são evidentes: danos ambientais, desrespeito das leis trabalhistas e da dignidade das pessoa, indenizações insuficientes e re-assentamento precário das famílias atingidas, tentativa de criminalizar os movimentos de apoio.

Mais problemática é a obra da Hidrelétrica de Jirau, a 100 km de Porto Velho, consórcio Suez/Camargo Corrêa e outros, com 15.000 operários, a maioria do Nordeste, sobretudo do Maranhão. A dona desta Usina será a empresa francesa Suez (!). A obra do Jirau está atrasada no cronograma, pois houve mudança do local de construção e recentemente houve descontentamento e tumulto entre os operários, os alojamentos foram incendiados e a obra ficou paralizada por vários dias.

Das famílias do distrito Mutum Paraná poucas aceitaram de morar na Nova Mutum Paraná, construída pela empresa e afastada do rio, com 1.600 casas de diferente padrão: as mais simples para os atingidos, as melhores para os técnicos da empresa. A maioria das famílias atingidas aceitou uma indenização e, algumas foram morar na grande cidade, outras foram morar em Imbaúba, na beira de outro rio. A quebra da história desta população e a desestruturação do tradicional modo de vida são as feridas mais profundas para as famílias que visitamos. Os anciãos choram lembrando o local antigo de moradia; os adultos dizem que agora é melhor, pois no novo distrito tem asfalto e casas novas, mas sentem falta do rio, do peixe, da terra.... Os jovens não sofrem tanto o impacto da mudança: a filha de dona Rosa, de 20 anos, já abriu no novo distrito uma boutique de roupas de moda, a outra filha adolescente de 12 anos mostra no seu net book as fotos do gato e do cachorro deitados no velho sofá abandonado lá no velho distrito onde a água logo irá chegar e carregar tudo. Os jovens sofrem menos, mas aos adultos e aos idosos rasga o coração ver em pouco tempo tamanha mudança de vida. Jaciparaná, distrito na região de Jirau, situado ao longo da Br, cresce assustadoramente; milhares de pessoas chegaram para construir barracos, casas, pousadas. Aqui a vida noturna é intensa, com pontos de prostituição e bocas de fumo.

CPT, SPM e CIMI acompanham a situação, grupos de famílias e comunidades ribeirinhas e apóiam a luta do MAB; o SPM presta atenção a massa migratória da mão de obra.

Luta-se para que, antes das Usinas começarem a produzir energia, as famílias atingidas sejam atendidas em suas reivindicações e direitos. O reassentamento em geral é precário, em lugares distantes do rio, sem terra necessária e suficiente para viver dignamente.

Busca-se, nos movimentos, um novo e mais amplo conceito de “atingido”, pois o que as empresas e o governo entendem por “atingido”, é um conceito diferente e parcial. Precisa-se de um conceito que contemple os aspectos ambientais, sociais, econômicos e culturais conjuntamente.

O “complexo Madeira” contempla a construção de outras grandes obras.

“ Pobre rio Madeira, quebrado e controlado pelas grandes obras”.

E que Deus salve o nosso planeta !

Porto Velho (RO), primeira semana de Setembro de 2011.

Pe. Hermínio Canova, coordenador nacional.

 

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