Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Membros do grupo móvel de fiscalização que resgatou 1.064 trabalhadores escravos defenderam suas atividades, mas sessão foi suspensa devido a atividades do plenário. Reunião será retomada nesta quarta-feira

Nesta terça-feira (2), a comissão externa do Senado criada para investigar a ação do grupo móvel de fiscalização na fazenda e usina Pagrisa, de onde foram libertados 1.064 trabalhadores em junho, ouviu envolvidos no caso. O auditor fiscal Humberto Célio Pereira, o procurador Antônio Luiz Fernandes e o diretor adjunto da empresa, Fernão Vilela Zancaner, falaram aos senadores em uma sala lotada, com mais de 80 presentes, entre parlamentares, funcionários do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), repórteres e pessoas convidadas pela Pagrisa.

Os depoentes não chegaram a ser interrogados porque a sessão foi suspensa devido a uma votação no plenário. A reunião será retomada nesta quarta-feira (3) à tarde, quando os integrantes da comissão externa devem discutir os rumos a serem tomados e se farão perguntas aos envolvidos. Humberto Célio, coordenador da operação do grupo móvel na Pagrisa, avalia positivamente o encontro. "Mostramos o que realmente aconteceu lá, através de documentos fortes", considera.

Para o subprocurador-geral do Trabalho e coordenador nacional de combate ao trabalho escravo do Ministério Público do Trabalho, Luiz Antônio Camargo, "[os senadores] perderam o fôlego, porque não conseguiram desqualificar o trabalho do grupo móvel". Ele frisa que a comissão externa "não tem propósito" e que a questão está sendo superdimensionada. "Essa situação é prejudicial até para a própria empresa, que fica aparecendo na mídia no meio de uma discussão sobre trabalho escravo."

A secretária de Inspeção do Trabalho do MTE, Ruth Vilela, completa que também é de interesse do grupo móvel defender os produtores nacionais. "Através de nossa ação, mostramos que o governo brasileiro está atuando para melhorar as condições de trabalho e as empresas brasileiras agindo para melhorar suas condições", explica. "O problema [do trabalho escravo] merece atenção do Estado não pelo número de envolvidos, que é pequeno, mas pela gravidade da situação."

O senador José Nery (PSOL-PA), presidente da Subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo, defende que o caso siga o procedimento normal: que a empresa entre na Justiça, que sejam sanadas as irregularidades e ela prossiga produzindo. Para ele, é muito difícil que a comissão tome uma decisão isenta sobre a ação fiscalizatória. "Qualquer decisão será política", ressalta. No encontro, o senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) da casa, também declarou que havia exagero na criação de uma comissão para investigar apenas a autuação em uma empresa.

Nesta quarta-feira, além de novo encontro da comissão externa do Senado, haverá reunião do grupo móvel de fiscalização e da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), das quais deve sair um posicionamento sobre a retomada das atividades de fiscalização, suspensas desde o dia 21 de setembro.

Vídeo e Processo

Primeiro a falar, o auditor fiscal Humberto exibiu um vídeo em que trabalhadores reclamam das condições de trabalho, logo nos primeiros dias da operação. Também leu uma matéria do jornal Folha de S. Paulo com depoimentos dos cortadores de cana. Um deles disse ter sido tratado "como porco" na fazenda. Humberto mostrou ainda fotos tiradas pela equipe de fiscalização e enumerou as irregularidades encontradas.

O procurador Antônio Luiz ratificou as palavras de Humberto Célio e declarou que assume "toda a responsabilidade" sobre o relatório do Ministério do Trabalho e Emprego. "O lugar onde se armazenava a carne era irrespirável", testemunhou. Garantiu também que não houve abuso da equipe do grupo móvel. Disse, por fim, que o Ministério Público do Trabalho (MPT) apenas defende a lei. "É uma questão de mudar a lei. Se a lei disser que trabalho escravo agora é só apanhar de chicote, então o Ministério Público do Trabalho só vai considerar trabalho escravo onde se apanha de chicote", provocou.

Ao prestar o seu esclarecimento, a Pagrisa exibiu um vídeo em forma de telejornal, em que diz ter "profundo respeito pelo ser humano" e afirma que seus alojamentos seguem "padrões de hotelaria" - o que arrancou risos da platéia. O vídeo sustenta que os trabalhadores foram iludidos pela equipe de fiscalização, frente à oferta de recebimento das verbas rescisórias e do seguro-desemprego, e por isso concordaram em se demitir.

Em seu depoimento, o diretor-ajunto da empresa, Fernão Vilela Zancaner, reforçou os argumentos do vídeo e insinuou diversas vezes que teria havido abuso por parte da fiscalização. Ele sustentou que não houve contenção de salários. "Temos os recibos de pagamento e comprovante de depósito no banco", argumentou. Também afirmou que os depoimentos dos trabalhadores registrados no relatório eram iguais, com nomes diferentes.

Uma outra versão do mesmo material audiovisual exibido pela Pagrisa está desde o início de setembro no site You Tube. O procurador Antônio declarou que vai entrar com um pedido de indenização por danos morais contra a empresa, pela utilização indevida de sua fala nas duas edições do vídeo. Em um trecho, uma imagem sua mostra a seguinte fala: "quando eu cheguei aqui, eu vi que a empresa oferecia boa estrutura". Porém, o resto da frase, em que o procurador ressalta que há diversos problemas no tratamento dado aos trabalhadores, foi cortado. "A estrutura é boa, o problema é o tratamento", reforçou Antônio Luiz na fala aos senadores.

Por Beatriz Camargo - Repórter Brasil

 

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