Na manhã desta terça-feira, 19/05, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) recebeu mais um relato de violência praticada pela empresa Agropecuária Mata Sul S/A contra a comunidade de Fervedouro, localizada em Jaqueira, Zona da Mata Sul de Pernambuco. Segundo informações locais, por volta das 7h, cerca de 20 funcionários da empresa destruíram aproximadamente dez mil pés de banana plantados pela família do agricultor Reginaldo Felix. Durante a destruição, a família se encontrava na escola comunitária, na sede do Engenho Fervedouro, participando da campanha de vacinação promovida pela Prefeitura de Jaqueira. Só chegou ao sítio quando tudo já havia sido destruído, mas ainda a tempo de avistar funcionários da empresa indo embora com carros e motos.
Nos últimos meses, avolumam-se denúncias de violência praticada pela empresa. No dia 28 de janeiro, a empresa foi acusada de destruir dez mil pés de banana de outro agricultor, na comunidade vizinha, chamada de Barro Branco. Já no dia 03 de abril, funcionários da Agropecuária Mata Sul S/A tentaram cercar uma das fontes de água que abastece diversas famílias daquela comunidade, o que só não se concretizou porque houve mobilização para impedir o cercamento. No dia 24 de abril, nove agricultores da comunidade de Fervedouro denunciaram terem sido vítimas de uma tentativa de homicídio, provocado pelo representante da empresa, Guilherme Maranhão. Dias depois, em 07 de maio, um camponês da comunidade de Fervedouro registrou Boletim de Ocorrência denunciando estar ameaçado de morte pela "elite da empresa". No mesmo dia, famílias relataram que foram surpreendidas com um helicóptero sobrevoando suas áreas e despejando agrotóxico, atingindo suas lavouras, fontes de água e também alguns camponeses, os quais apresentaram sintomas de intoxicação.
No dia 09 de maio, Policiais e seguranças privados contratados pela Agropecuária Mata Sul S/A intimidaram e ameaçaram as famílias da comunidade, proferindo frases do tipo “vocês vão se f---“, enquanto acompanhavam a reinstalação de postes e de câmeras de segurança da empresa. Já no dia 13, Policiais fortemente armados ameaçaram e chegaram a apontar suas armas para agricultores e agricultoras da comunidade de Fervedouro, enquanto estavam dando cobertura para que funcionários cercassem uma suposta área de posse da empresa. A lista de violência é ainda maior, pois há anos as famílias denunciam de modo recorrente a destruição de suas lavouras, único meio para a sua subsistência, além de outras situações de intimidações, perseguições, contaminação de fontes de água e esbulho de suas posses.
Com essas ocorrências, a situação ganha contornos ainda mais dramáticos na atual conjuntura de pandemia, que impõe um isolamento social para resguardar a vida das pessoas. No entanto, as famílias atingidas pela empresa têm sido obrigadas a sair do isolamento diante da violência extrema a que estão submetidas.
O conflito fundiário promovido pela Agropecuária Mata Sul S/A tem também grandes proporções geográficas e sociais. Mais de 1.200 famílias de várias comunidades rurais de Jaqueira estão sendo alvo da empresa, o que representa cerca de 40% dos habitantes do município. A área arrendada pela empresa – cinco mil hectares - equivale a aproximadamente 50% do município. As terras arrendadas são da Usina Frei Caneca, que se encontra paralisada e com débitos milionários, seja trabalhista, seja com o Estado, seja com a União.
A Comissão Pastoral da Terra vem alertando aos órgãos públicos sobre o acirramento do conflito, o qual só cessará quando forem tomadas medidas enérgicas por parte do Estado e, principalmente, quando o imóvel foi adjudicado, conforme reivindicação feita pelas famílias ao governo do Estado. O conflito já foi denunciado ao Ministério Público Estadual, ao Incra, à Secretaria de Desenvolvimento Agrário, à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, à Secretaria de Defesa Social, à Prefeitura Municipal de Jaqueira, ao Governador Paulo Câmara, à Câmara de Vereadores e Vereadoras do município, à Diocese de Palmares e a Deputados e Deputadas Estaduais.
Contudo, até o momento, nenhuma medida efetiva foi tomada para solucionar definitivamente o conflito e para garantir às famílias o direito à vida, à dignidade, ao trabalho e à permanência na terra em que vivem há décadas. Conforme ressalta um dos camponeses da localidade, “as comunidades estão pedindo clemência. Nossas crianças ficam em tempo de morrer com essa situação. Hoje em dia, acordamos e abrimos as portas de nossas casas com medo. Nascemos naquelas terras, ajudamos a construir aquele lugar, é lá que temos que viver”.