A Comissão Pastoral da Terra Nordeste 2 (CPT NE2) e o Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Espaço Agrário e Campesinato (LEPEC/UFPE) lançam o “Almanaque Faíscas da Juventude Camponesa”. Por meio de artigos, brincadeiras, receitas, depoimentos, poesias e muito mais, o Almanaque Faíscas aborda temas que tratam sobre a realidade vivida pela juventude do campo.
São alguns assuntos: os impactos causados pelos agrotóxicos e pelo agronegócio, o modo de produção camponês, as experiências agroecológicas, a luta pela reforma agrária, a organização da juventude em busca de direitos, além de conter dicas de como fortalecer meios próprios de comunicação nas comunidades camponesas.
O Almanaque Faíscas é resultado da sistematização de saberes e conhecimentos construídos coletivamente pela juventude e partilhados no curso Residência Agrária “Juventude Camponesa: educomunicação e agroecologia”, realizado no estado de Pernambuco durante os anos de 2015 e 2017. O curso envolveu mais de 70 jovens de vários assentamentos, acampamentos, comunidades quilombolas e posseiras do estado.
A publicação tem como objetivo apresentar a memória e a sistematização das reflexões feitas ao longo do curso, mas, também, pretende ser um instrumento de formação e animação para toda a juventude camponesa que busca a efetivação de seus direitos e a permanência no campo.
Para ver o Almanaque na íntegra, clique aqui:https://cptne2.org.br/images/cartilhas/Almanaque_web.pdf
Formação e resistência para enfrentar a violência
Imagens: Crianças e jovens com o Almanaque Faíscas da Juventude, em comunidade no sertão do Pajeú/PE - Crédito: Plácido Júnior.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dois milhões de pessoas migraram do campo para as os centros urbanos entre os anos de 2000 e 2010. Desses, aproximadamente um milhão eram jovens. A violência e os conflitos no campo provocados por grandes empresas do agrohidronegócio são considerados alguns dos grandes causadores da expulsão e da migração desses milhares de jovens camponeses para áreas urbanas.
Ontem e hoje, essa violência no campo segue sua marcha. Assim foi no dia 17 de abril de 1996, quando 19 trabalhadores rurais sem terra foram brutalmente assassinatos em um episódio conhecido como o Massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará. Assim é hoje, quando, segundo dados mais recentes da Comissão Pastoral da Terra, no ano de 2017, 70 camponeses e camponesas foram assassinados em conflitos agrários.
“São dados que assustam. Infelizmente, nesse cenário, ainda continuam ‘atrativos’ os grandes centros urbanos quando os jovens não encontram situações adequadas na área em que nasceram e em que vivem. Nesse contexto, os jovens são obrigados a se desfazerem de seus sonhos e de seus desejos, e os grandes grupos econômicos passam a desintegrar o tecido social de muitas comunidades e organização de juventudes”, ressalta o professor do departamento de geografia da UFPE e coordenador do curso Residência Agrária, Cláudio Ubiratan.
Para enfrentar essa realidade de morte, o professor ressalta que são indispensáveis iniciativas que objetivam fortalecer as memórias das lutas por direitos e partilhar experiências de organização, de produção agroecológica e de cuidado com o meio ambiente, como o curso Residência Agrária e o Almanaque - que sistematiza seus conteúdos. Com essa inciativa, “eu aprendi que posso construir um futuro melhor dentro da minha comunidade. Saber que eu não estou só nesta luta é muito importante. Todos nós estamos lutando pelo mesmo objetivo", afirma a jovem Gilvana da Silva, moradora do Engenho Una (município de Moreno/PE) em depoimento contido na publicação.
Para o Padre Tiago Thorlby, agente pastoral da CPT, “este Almanaque não foi feito com resíduos. Foi feito com resistências de vida. Foi feito com muitas faíscas que brilham em tempos sombrios e temerosos, como os de hoje. Com essa publicação, saberemos que nas comunidades camponesas há jovens que brilham como faíscas, como vagalumes em noite escura. São esses jovens que vão balançar o coreto”.
Curso Residência Agrária “juventude camponesa: educomunicação e agroecologia”
O curso foi realizado pela Comissão Pastoral da Terra Nordeste 2 (CPT NE 2) e pelo Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Espaço Agrário e Campesinato (LEPEC) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em parceria com o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA) e com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Iniciado em janeiro de 2015, o curso rapidamente foi apelidado pelos jovens de "Resistência agrária", por contribuir não somente com a sua formação, mas principalmente por ser um grande estímulo à organização e à valorização da identidade da juventude camponesa. Por isso, em pouco tempo, o número de jovens interessados em participar do curso aumentou de cerca de 40 para mais de 70.
O curso Residência Agrária funcionou por meio da pedagogia da alternância. Durante os períodos em que estiveram todos reunidos nos chamados módulos do Tempo Escola, os jovens dedicaram-se ao estudo dos conceitos ligados à questão agrária e à resistência dos povos do campo. O conceito de campesinato, de território, a agroecologia, o modo de produção capitalista, a história das lutas no campo e a atualidade da questão agrária foram alguns dos temas trabalhados.
Além dessas temáticas, os jovens também estudaram os mecanismos de constituição discursiva dos meios de comunicação de massa sobre as lutas camponesas. Mas não só isso. Durante o curso, os jovens também se apropriaram de ferramentas midiáticas para dar visibilidade ao modo de produção camponês e denunciar os crimes praticados contra as populações em seus territórios.
Durante o tempo em que estavam em suas comunidades, os jovens realizaram diversas atividades de estudos, debates, pesquisas e leituras. Os participantes também organizaram encontros de intercâmbios, troca de experiências entre comunidades, além de formarem grupos comunitários com o objetivo de fortalecer a organização da juventude e as práticas de produção agroecológica e de valorizar a identidade camponesa.
Fonte: Comissão Pastoral da Terra – Regional Nordeste 2