Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

O Encontro Estadual de Mulheres Camponesas acompanhadas pela CPT em Alagoas reuniu 110 agricultoras nos dias 02 e 03 de agosto. Com o tema "Mulheres camponesas: empoderamento, ternura e lutas", a atividade marcou o fortalecimento do processo de auto-organização das mulheres nas comunidades.

Para Hilberlândia Andrade, agente pastoral da CPT em Mossoró (RN), o encontro alagoano possibilitou que as mulheres percebessem que são importantes e são mais fortes juntas. Além disso, elas viram que é fundamental participar de iniciativas como essa, estudar e lutar para mudar a realidade de opressão em que vivem.

“A organização das mulheres fortalece a nossa autoestima. A nossa autoestima é construída também no coletivo. Então, quando as mulheres estão juntas, percebem o quanto o depoimento e a luta de uma é importante para fortalecer a outra, e percebem o potencial e a força que a mulher tem”, disse.

No primeiro dia, a programação do encontro contou com momentos de mística e oração, saudação às participantes, depoimentos delas e uma palestra sobre autoestima e combate à violência. Estiveram presentes na mesa de abertura, além de Hilberlândia, Margarida da Silva, a Magal, dirigente nacional do MST em Alagoas; Lucia Maria Santos, representando a Central Única dos Trabalhadores (CUT); e Maria das Graças Alves, agente pastoral da CPT.

No dia seguinte, as mulheres debateram sobre estima e importância de ser mulher. Houve, ainda, a exibição do filme Pureza, seguido de debate.

Para a camponesa Fábia Melo Silva, do assentamento Santo Antônio, situado no município de Major Isidoro (AL), as mulheres ali presentes se enxergaram dentro do filme, porque elas conhecem, e muitas vivenciam, histórias como da personagem principal.

“O filme mostrou a realidade de uma mulher que foi em busca do filho que saiu de casa e desapareceu. Eu observava e falava: Olha gente, é exatamente desse jeito! E a gente é enganada. Às vezes temos o chamado de um emprego bonito, muitos saem de sua terra e vão para Mato Grosso, para São Paulo, sendo enganados. Acontecesse isso de verdade. É a realidade que a gente vive! A reação do povo foi de ficar tudo mudo. Ninguém falava, só observando o filme. Parecia que estávamos dentro do filme”, disse Fábia. 

Por fim, as participantes discutiram acerca do movimento camponês e organização das mulheres.

Para Maria Quitéria, o encontro mostrou para as camponesas o quanto elas são importantes. A camponesa da comunidade do pré-assentamento Bota Velha destacou que os homens não conquistaram a terra sozinhos. As mulheres foram protagonistas na luta. “Mulher quando quer uma coisa ela chega a sonhar e só para quando realiza. Então, não vamos desistir, quando vocês voltarem para suas comunidades, digam assim: ‘Agora é com a gente! Se vocês não fizerem a parte de vocês, a nossa parte”, disse Quitéria.

 

Depoimentos das mulheres:

“A dificuldade é grande, não podemos parar, porque se a gente fraquejar no meio do caminho, a gente nunca vai conseguir o nosso lugar que vocês sabem onde é. Não é só dentro do assentamento ou do acampamento. É na rua, na prefeitura, aonde nós quisermos chegar. Nós temos o direito de ir e vir. Mas, os nossos maridos inventam de nos prender um pouquinho. ‘Não vai não, porque quem vai sou eu’ – Dizem. Mas eles mesmos não resolvem.  Eu vivo num apartamento, eu era sem Terra há 23 anos e hoje tenho a terra, que nós conquistamos graças à Deus. Até hoje eu não vi nada que os homens fizeram sozinhos. Então, vamos cair em campo, juntando as mulheres e conversando para chegar lá. Vamos na prefeitura buscar isso, vamos lá buscar aquilo... Mulher tem o objetivo de não desistir. Mulher quando quer uma coisa ela chega a sonhar e só para quando realiza. Então, não vamos desistir, quando vocês voltarem para suas comunidades, digam assim: Agora é com a gente! Se vocês não fizerem a parte de vocês, a nossa parte. O Brasil não vai para frente, se nós vamos continuar presas e submissas aos nossos maridos. Agora os maridos têm que fazer por merecer para a gente ver se vai valer a pena”.

(Maria Quitéria – Pré-assentamento Bota Velha, Murici/AL)

 

É preciso que cada uma de nós não esqueça de dizer isso para nossas filhas e filhos. Entendeu? porque o que você vai levar amanhã para casa de bagagem – eu quero dizer uma bagagem na mente – na zona rural, nos nossos assentamentos, quem mais não sabe ler são as mulheres porque elas trabalham o dia todo.

A roça tá cheia de mato. Quem vai ajudar? É aquela com história de ajudar, sendo que você trabalha igual a ele e, às vezes, muito mais do que ele. E nós não estudamos.

Hoje, eu vejo no assentamento Dom Hélder Câmara outra realidade. No ano 2000, a maioria das mulheres não sabia ler e a CPT fazia de tudo para formar educadores populares para levar conhecimento aos assentamentos. Depois de 2011, todas as mulheres estavam na escola. Hoje eu conto nos dedos as que não sabem ler. Têm 3 mulheres que não sabem ler. Hoje nós temos um número grande de mulheres no ensino médio, algumas que já terminaram e outras que estão no Ifal. Isso é prazeroso para a gente. Mas a luta, quem nos ensinou? As mulheres já nascem aprendendo a lutar.

Quando elas nascem, ainda pequenininhas, elas já sabem lutar. Vocês já observaram? Elas pegam uma boneca, abraçam de um lado e fazer a comidinha, vão colher flores... Eu fico olhando as meninas. Elas já sabem lutar. Elas só reconhecer. E esse é o momento de formação para a gente continuar lutando. E a luta é bonita! Eu me lembro que uns falaram uma vez: ‘Só andam com a Ir. Rita para cima e para baixo. Traz o que hein?’. Eu sei que muitos maridos dizem isso: ‘Vai para esses encontros e vai trazer o quê?’ – A gente traz conhecimento, traz empoderamento.

(Maria Rita dos Santos – Assentamento Dom Hélder Câmara, Murici/AL)

 

Sou aposentada e continuo trabalhando na roça. Tem de tudo na minha roça. Vai fazer 17 anos que meu marido morreu dentro da roça mesmo. Sempre que tem uma atividade eu venho mesmo, não perco, porque sou dona das minhas venta [sic], sou meu próprio marido e mulher e minhas filhas já estão criadas. Estudo à noite no EJA e lá a gente junta um grupo da escola para vender bolos, pé de moleque e outras coisas em Porto da Rua. A escola fica lá no assentamento Jubileu mesmo e na escola a gente se junta e se organiza para vender nossos produtos.

(Genilda Antônio Ferreira, Dona Dida – Assentamento Jubileu 2000, São Miguel dos Milagres/AL)

 

Com o filme, eu descobri como os ricos adquiriram as terras. Eu escutava falar, mas não tinha um fato real sobre como aconteceu. E eu vi no filme como foi. Eles chegavam e se apropriavam da área, desmatavam, usando o trabalho forçado, pegavam uma área grande dizendo que era para fazer pasto para os animais, iam ao cartório e passavam os documentos para o nome deles. Então a gente descobriu como foi que eles conseguiram aquelas terras todas e isso existe até hoje. O filme mostrou a realidade de uma mulher que foi em busca do filho que saiu de casa e desapareceu. Eu observava e falava: Olha gente, é exatamente desse jeito! E a gente é enganada. Às vezes temos o chamado de um emprego bonito, muitos saem de sua terra e vão para Mato Grosso, para São Paulo, sendo enganados. Acontecesse isso de verdade. É a realidade que a gente vive. A reação do povo foi de ficar tudo mudo. Ninguém falava, só observando o filme. Parecia que estávamos dentro do filme.

(Fábia Melo Silva – Assentamento Santo Antônio, Major Isidoro/AL)

 

Por: Lara Tapety - Ascom CPT/AL

 

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