Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Brasil quer virar líder em enterro de gás carbônico Técnica que injeta CO2 em excesso no subsolo pode frear mudança do clima. Petrobras inicia neste ano testes na Bahia e na bacia de Campos; processo é eficiente em seqüestrar gás, mas custo é um problema

É quase como jogar sujeira para debaixo do tapete. Como o Brasil tem lugar de sobra em seu subsolo para enterrar gás carbônico -2 trilhões de toneladas, segundo uma estimativa-, por que não dar uma mão para amenizar o aquecimento global? Neste ano, a Petrobras começa a seqüestrar carbono e depositá-lo em áreas já usadas para a extração de petróleo. Há duas décadas, pelo menos, as empresas de petróleo injetam gás carbônico (CO2) em alguns de seus poços porque isso ajuda a retirar o restinho de combustível do subsolo.

Como o CO2 produzido pela queima desse mesmo petróleo virou um problemão ambiental, a prática ganhou uma nova função. Segundo o IPCC, o painel do clima das Nações Unidas, será preciso sumir com 25 bilhões de toneladas de CO2 por ano até 2050. E o enterro de carbono pode ajudar: segundo o IPCC, a tecnologia tem o potencial de eliminar pelo menos 21% disso nesse período. O plano das empresas de petróleo tem várias fases. O carbono que seria emitido para a atmosfera nas refinarias é capturado por uma chaminé. O gás então é injetado no subsolo, onde ele ficará guardado por milhões de anos -segundo os técnicos.

"O Brasil, sozinho, tem capacidade para estocar o equivalente ao que o planeta emite em 80 anos", afirma João Marcelo Ketzer, coordenador do Cepac (Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de Carbono) da PUC do Rio Grande do Sul. É dele a estimativa sobre a capacidade de armazenamento do país. As áreas usadas para a extração de carvão mineral ou os aqüíferos salinos (cuja água é imprestável para o consumo) também podem servir como regiões de estoque. No mundo hoje, segundo Ketzer, existe potencial de estocar 1 trilhão de toneladas de CO2 em reservatórios de petróleo, 10 trilhões em aqüíferos e 40 bilhões em minas de carvão.

Porém, a logística da captura em uma refinaria ou em uma usina não é trivial. Uma das dúvidas é a segurança. O CO2 pode vazar no transporte, matando asfixiadas pessoas em volta. (Isso aconteceu em 1986, quando 1.700 camaronenses morreram após um depósito natural do gás vazar de um vulcão.) Ou, o menos provável, o vazamento do próprio reservatório -causando um problema ambiental.

"Qualquer processo pode ser feito de forma perigosa", afirma Robert Socolow, físico e especialista em técnicas de estocagem de carbono, da Universidade de Princeton (EUA).

"O custo da tecnologia é um dos problemas que ainda precisam ser resolvidos", diz Paulo Cunha, do Cenpes (Centro de Pesquisa da Petrobras). O transporte do carbono de uma refinaria no continente para o reservatório -muitas vezes no mar, a centenas ou milhares de quilômetros de distância- pode exigir a construção de dutos, como os usados para o transporte do gás natural.

No Brasil serão feitas, no segundo semestre, injeções em larga escala de carbono em terra, na Bahia, e sob o mar, na bacia de Campos. A Petrobras, afirma Cunha, espera chegar a 2014 com um armazenamento de CO2 da ordem de 10 milhões de toneladas por ano.

Se a meta for atingida, será um dos maiores projetos de seqüestro geológico do mundo. Hoje, em grande escala, existem apenas três. O pioneiro funciona na Noruega, e é feito, sob o mar, pela petrolífera local Statoil. No Canadá, em Weyburn, na terra firme, é feito o estoque de carbono capturado nos EUA pela canadense EnCana. O último fica na Argélia e está associado com o gás natural. Cada um seqüestra até 2 milhões de toneladas de CO2 por ano.

Fonte: EDUARDO GERAQUE, DA REPORTAGEM LOCAL Folha de S. Paulo,20/01/08.

 

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