Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Há 41 anos, no município de Alagoa Grande, na Paraíba, uma agricultora familiar, sindicalista e forte liderança na luta por direitos e contra a violência de latifundiários foi brutalmente assassinada na frente de seu marido e de seu filho, seu nome era Margarida Maria Alves. Ela era uma entre tantas mulheres e homens do campo, das águas e das florestas que todos os dias resistem contra um sistema capitalista e colonial que os persegue, explora, violenta e mata. 

Giovanna Revoredo/ Fetape

 

Margarida Maria Alves - Imagem: Reprodução

 

O dia 12 de agosto então se tornou o Dia Nacional das Mulheres Trabalhadoras Rurais contra a Violência do Campo, uma data que representa o combate à violência no meio rural e a luta pela reforma agrária e agroecologia, como formas sustentáveis de sobrevivência, produção e combate à toda forma de exploração e violência contra as pessoas e o planeta. A data propõe também um olhar atento à situação das mulheres em contexto rural, visto que além de se mostrarem fundamentais na história de lutas dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, 1,9% dos feminicídios e 3,3% das demais mortes violentas de mulheres no Brasil ocorreram na área rural em 2022, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.


No ano passado, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), apontou no relatório Conflitos no Campo Brasil 2023, que foram registrados 2.203 conflitos no campo no país, contando 31 assassinatos. Os casos registrados estão ligados ao acesso à terra, água e direitos trabalhistas e envolvem diversos tipos de violências, afetando trabalhadores e trabalhadoras rurais e chamando atenção para os ataques a povos indígenas e quilombolas.



A Diretora de Política Agrária da Fetape, Rozário França, acompanha uma agenda permanente ligada à luta pela terra em Pernambuco e no Brasil e aponta: ”É urgente que esse seja um tema debatido para diminuir ou acabar de vez com a violência no campo”, acrescentando “A realidade no campo é diferente entre mulheres e homens, as mulheres são as mais afetadas pela violência. Para as mulheres indígenas e quilombolas a realidade é mais difícil ainda dependendo da comunidade ou município, em alguns tem melhorado outros ainda continua difícil”.

O relatório Conflitos no Campo Brasil 2023, também apresenta uma taxa 8% superior às ocorrências documentadas em 2022. O companheiro Geovani José Leão da Silva, Agente de Pastoral da CPT Regional NE 2, que atua na Zona da Mata Sul, destacou: “O combate à violência no campo vem se dando a partir da organização dos agricultores, agricultoras, posseiros e posseiras que residem nas comunidades em conflito, realizando Boletins de Ocorrências quando ocorrem ameaças e destruição de lavouras, denunciando as violações de direitos aos órgãos do estado e judiciais, à Comissão Estadual de Acompanhamento dos Conflitos Agrários de Pernambuco (CEACA/PE) e à Promotoria Agrária”.

A CEACA é fruto do processo mobilizatório e de denúncia citado por Geovani. Quando questionado acerca de outras conquistas dessa luta, ele apontou: ”Nosso maior êxito até o momento, é a permanência das famílias nas terras. No entanto, os conflitos permanecem, apesar de se ter na Justiça, uma enorme quantidade de Processos. E a violência só tende a aumentar, pois o ponto principal não foi resolvido, que é o problema da terra. Só a Reforma Agrária resolverá de uma vez por todas a violência no campo. E é por isso que as comunidades mensalmente vão ao INCRA em Recife para pressionar o Governo a realizar a desapropriação de todas as terras onde estão as famílias ameaçadas de despejos nas comunidades em conflito”.



Ato no Recife em 2022, denunciando o assassinato do menino Jonatas. A criança, que tinha 9 anos, foi morta a tiros por homens encapuzados e era filho de uma liderança comunitária numa área de conflitos por terra, no Engenho Roncadorzinho, em Barreiros. - Imagem: Setor de comunicação da CPT NE2



Um grande símbolo da luta das mulheres trabalhadoras rurais contra a violência no campo é a Marcha das Margaridas que, inspirada em Margarida Alves, é uma mobilização nacional realizada pelas mulheres do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e que a cada quatro anos, leva milhares de mulheres e homens de todo o país à Brasília reivindicando através da ocupação das ruas e de uma pauta densa um Brasil sem violências, onde a democracia e a soberania popular sejam respeitadas, a partir de relações justas e igualitárias.



A última Marcha das Margaridas aconteceu em 2023 e dialogou com o atual presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva. A Diretora de Política para as Mulheres da Fetape, Adriana do Nascimento, foi convidada pela comunicação da federação para comentar sobre as negociações da pauta que é pensada para ser trabalhada durante os quatro anos de mandato. Adriana pontua: “Na pauta da Marcha, temos o enfrentamento à violência no campo como sendo dos principais eixos, tendo obtido como uma das respostas do governo federal a Constituição do Fórum Nacional Permanente de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres do Campo, da Floresta e das Águas. No entanto, por mais que queiramos avançar nessa pauta, temos um Congresso que não ajuda muito”.

 

Mulheres ocupando as ruas de Brasília em 2023, na 7ª Marcha das Margaridas, que teve como lema: ”Margaridas pela reconstrução do Brasil e pelo Bem Viver” - Imagem: Gabriela Torres



Outra importante conquista foi a Lei nº 17.689, de autoria do Deputado Estadual orgânico do MSTTR Doriel Barros (PT), que altera a lei já existente da Política de Prevenção Social ao Crime e à Violência no Estado de Pernambuco, a fim de instituir diretrizes para o combate à criminalidade especificamente no meio rural. De acordo com a chefe de gabinete do mandato, Ana Célia Floriano, esta lei foi construída coletivamente e em diálogo com agricultores e agricultoras familiares. No entanto, apesar de sancionada, o Governo do Estado ainda não a executa de fato.



Matéria: Giovanna Revoredo

 

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