Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Com 175 deputados, Frente da Terra vai rivalizar com bancada ruralista levantando a bandeira da reforma agrária e da defesa da biodiversidade.

Bloco vai lutar para aprovar a PEC do trabalho escravo e defenderá junto ao governo a atualização dos índices de produtividade.

Fonte: Agência Carta Maior

Jonas Valente e Verena Glass – Carta Maior

Uma das mais poderosas bancadas do Congresso Nacional, o grupo dos ruralistas ganhou nesta terça (10) uma nova oponente com o lançamento, em Brasília, da Frente Parlamentar sobre Terra, Território e Biodiversidade: agricultura familiar camponesa, reforma agrária e desenvolvimento sustentável. A Frente da Terra, como foi apelidada, não chegou aos mais de 200 parlamentares de sua adversária, mas estreou com um número considerável de 175 assinaturas.

Segundo o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, a iniciativa vem em “momento bastante oportuno”, pois na esteira do debate sobre os rumos do desenvolvimento brasileiro é preciso incluir a discussão acerca do modelo desejado para o meio rural. “Temos que escolher se queremos para o futuro um campo dominado por grandes extensões de terra e pelas máquinas, ou com muitos produtores gerando trabalho e renda”. Segundo Cassel, a Frente Parlamentar nasce para defender o segundo projeto. Ao adotar este caráter, o bloco será importante aliado dos defensores da reforma agrária e da agricultura familiar e camponesa, completou o presidente do Incra, Rolf Hackbart.

O coordenador provisório da Frente, deputado Dr. Rosinha (PT-PR), destacou o caráter amplo dos temas que serão tratados pelo grupo, lembrando que sem a defesa da biodiversidade não há uma perspectiva futura de reprodução da vida. O parlamentar foi além e afirmou que o objetivo último deste projeto tem como horizonte a superação da atual ordem econômica e política. “A nossa vitória final só acontecerá quando derrotarmos o capitalismo, nossa luta é pela libertação do capital”, declarou. Para contribuir com esta empreitada nada fácil, continuou, a Frente não se restringirá à atuação no parlamento, e não vai “se negar a apoiar a luta do povo brasileiro”.

A vinculação do bloco com a luta social foi ressaltada pelos próprios representantes dos movimentos sociais presentes. “A Frente é mais uma trincheira que estamos abrindo”, afirmou Rosângela Cordeiro, do Movimento de Mulheres Camponesas. “Os Movimentos sociais acham que frente vai ser ferramenta das lutas dos trabalhadores pela reforma agrária, pela agricultura familiar e camponesa”, acrescentou Marina dos Santos, da Coordenação Nacional do MST.

Agenda legislativa Durante o lançamento da Frente, integrantes do governo, parlamentares e representantes de movimentos sociais estavam afinados sobre os projetos prioritários que merecem atenção. Rolf Hackbart, que já trabalhou na assessoria do PT voltada para o tema agrário, destacou a Proposta de Emenda Constitucional 438 de 2001, que permite a expropriação de áreas com comprovada existência de trabalho escravo, lembrando que a matéria já está pronta para ser votada em 2o turno na casa. “Se for aprovada [a PEC do Trabalho Escravo], vai facilitar em muito a desapropriação de terra”, explicou o deputado Adão Pretto (PT-RS).

Outra medida que está na mira da Frente é a atualização dos índices de produtividade. Os critérios que determinam se uma propriedade rural alcança ou não o mínimo de sua capacidade produtiva são da década de 1970, e sua revisão à luz dos avanços tecnológicos pode ampliar o número de propriedades rurais que poderão ser reivindicadas para reforma agrária.

Segundo Adão Pretto, embora a medida deva ser feita por meio da publicação de um Decreto, não passando pelo parlamento, a Frente vai se posicionar e cobrar que o Governo Federal tome providências a respeito. Guardado em uma gaveta no Palácio do Planalto, no entanto, o esboço de Decreto vem sendo mantido na geladeira até hoje pela força da bancada ruralista.

A Frente buscará reverter também o pacote de projetos apresentados no relatório original (e não aprovado) da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Terra, que “destravam” a reforma agrária, como a simplificação do processo de desapropriação de terras, a remoção de obstáculos jurídicos para facilitar esta ação e o controle do uso das liminares como instrumento de postergação deste processo. Com a derrota para o relatório apresentado pelos ruralistas, as matérias foram transformadas em Projetos de Lei e serão encaminhados para tramitação na Câmara.

orça ruralista A avaliação de que a defesa da reforma agrária e dos movimentos sociais do campo vai precisar de uma atuação parlamentar coordenada e eficaz se baseou, entre outros, na crescente ofensiva contra o setor por parte do bloco parlamentar vinculado ao agronegócio.

Uma das forças mais atuantes no Congresso, a chamada bancada ruralista, composta até pouco tempo por representantes dos grandes produtores rurais, nas últimas eleições se qualificou e fortaleceu com o apoio de parlamentares conservadores de outras áreas, como evangélicos e empresários, chegando a um total de 220 nomes só na Câmara. No Senado, além da reeleição de Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), dez parlamentares continuarão no mandato até 2011 e foram eleitos cinco senadores novos, incluindo os antigos deputados Eliseu Resende (PFL/MG) e Kátia Abreu (PFL/TO).

Uma característica dos ruralistas é que sua agenda não segue a lógica governistas/oposição, mas atua transversalmente no Congresso na defesa de seus interesses. Fortalecidos com o prestigio do agronegócio junto ao presidente Lula, a bancada têm hoje cerca de 1.400 projetos de lei em tramitação, 400 dos quais “importantes” e 26 “prioritários”.

Entre os últimos, estão propostas como diminuição das reservas legais previstas no Código Florestal, a atribuição ao Congresso do processo demarcatório de Terras Indígenas e da fixação dos índices de produtividade, a flexibilização das leis que regulamentam os contratos de trabalho no campo, e, sobretudo, os dois Projetos de Lei da CPMI da Terra, que propõe dar conotação jurídica de ato terrorista às ocupações de terra para pressionar a realização da reforma agrária, e que o esbulho possessório (definido no texto como saque, invasão, depredação ou incêndio de propriedade alheia) com fins políticos (com o fim de manifestar inconformismo político ou de pressionar o governo a fazer ou deixar de fazer alguma coisa) seja enquadrado como crime hediondo (pena de reclusão de três a dez anos).

Segundo o advogado Darci Frigo, coordenador da ONG Terra de Direitos, o desafio de defender um modelo mais sustentável de desenvolvimento do país será grande. “Não bastou eleger um presidente, estamos vendo que é preciso ocupar também o parlamento” afirmou. E acrescentou: “precisamos discutir o modelo energético, precisamos sim de energia limpa, mas não queremos o modelo em que os grandes usineiros são os heróis”.

 

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