O encontro que celebrará os 30 anos da Comissão Pastoral da Terra Regional Nordeste 2 acontecerá nos dias 11, 12 e 13 de agosto de 2018, em João Pessoa, estado da Paraíba. A data marca também os 35 anos de um episódio que deixou profundas cicatrizes na luta pela terra no país: o assassinato da trabalhadora rural e sindicalista Margarida Maria Alves, em 12 de agosto de 1983, também na Paraíba. A memória da mártir estará presente em todo o encontro, especialmente às 17h do dia 12 (horário de sua morte), quando será realizado um momento místico e celebrativo em sua homenagem.
Margarida Maria Alves nasceu no dia 05 de março de 1932, num sítio localizado no município de Alagoa Grande, estado da Paraíba. O pai dela, morador e arrendatário de um pequeno lote, foi expulso da terra pelo proprietário. Em 1965, com 35 anos de idade, também Margarida, seu esposo, Severino Cassemiro, e o filho pequeno, José de Arimatéia, foram para a cidade por causa de conflitos com o proprietário.
Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, várias vezes reeleita, Margarida lutava pelos direitos dos trabalhadores rurais assalariados e pela reforma agrária, quando foi brutalmente assassinada, vítima de uma trama dos latifundiários, em 12 de Agosto de 1983.
Deixamos Margarida com a palavra:
O Sindicato, o trabalho de base e a luta de classe:
“O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande está com várias reclamações na Justiça do Trabalho, em Campina Grande. E por causa disso tem recebido grande pressão por parte dos empregadores rurais. A diretoria estava fazendo um trabalho de base, indo aos engenhos, fazendas, sítios, e com isso conseguiu descobrir novas lideranças. Os proprietários começaram a fazer pressão na diretoria do Sindicato, fazendo ameaças, dizendo que iria quebrar de pau, atirar na presidente e fechar sua sede, passar carro por cima da presidente. Afinal, falavam: a presidente estava querendo mesmo uma bala, sem esperar... Mas eles não fizeram calar a voz da presidente, nem perder as ações como representante classista. Prometeram também balear o secretário do sindicato porque acompanhava a presidente no trabalho de base. Não conseguiram amedrontar a diretoria...”.
“...companheiros, a prepotência dos proprietários rurais de Alagoa Grande está oprimindo a diretoria do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, e ainda na última sexta feira recebemos uma agressão. Mas quero dizer a vocês que não tememos qualquer ameaça, e vamos à luta até o fim por melhores condições de vida dos trabalhadores rurais da Paraíba. Doa isto a quem doer, goste quem gostar, porque entendo que é melhor morrer na luta do que morrer de fome.”
“... Queremos mostrar ao trabalhador aquilo que é direito, o direito que ele tem. Não é o trabalhador ficar pensando que o Sindicato é dentista, que sindicato é um médico. A gente quis mostrar ao trabalhador isto, tirar essa máscara dele, porque tem muitos que pensam que o sindicato é isso. Aí por causa disso, os proprietários daqui não engolem a gente... Dizem que é só Alagoa Grande que faz essa revolução com eles. Agora que outros sindicatos estão lutando também, a gente tá sentindo que a perseguição contra a gente diminuiu...”.
A luta pelos Direitos:
“...Não fugimos da luta, e é mais fácil vocês ficarem sabendo que morremos do que que fugimos correndo. Vamos conquistar os nossos direitos, se Deus quiser. Dizem os proprietários rurais que em Alagoa Grande estamos invadindo as suas propriedades, mas invadindo estão eles... invadindo os nossos direitos quando não pagam o 13o salário aos trabalhadores rurais, invadindo quando negam o pão aos que trabalham em suas propriedades, invadindo os direitos dos trabalhadores...”.
O problema da Terra:
“... O outro problema é a terra, terra que já não existe para o trabalhador. Quer dizer, porque o povo trabalhador, depois de 64, passou quase todo para a rua. Porque, quando veio a Revolução, botaram o povo todo para a rua. Eu mesmo fui despejada. (...) O meu proprietário dizia que eu era comunista, né? Por isto não queria a gente lá na terra, né? Aí eu saí. Quer dizer que saiu muita gente, foi um despejo mesmo, era a vontade. Gente saindo do meio rural para vir morar na cidade...”.
“... Mas a terra Deus deixou para todo mundo... Pra todo mundo viver nela. A terra é de Deus. Depois é que os homens foram criando ambição e foram cercando as terras. Porque as terras não foram vendidas no começo, não. E, inclusive, eu não lembro a data, mas a lei da terra não é tão antiga, não. O direito de propriedade, de compra da terra, veio depois. A terra é para trabalhar nela. Aqui no Sindicato a gente orienta pra ficar na terra e plantar.”
“... Trabalhadores: não vamos temer nada, a não ser a Deus. Vamos lutar porque, unidos, teremos força para derrubar a prepotência e os poderosos da Paraíba, que não podem ficar eternamente de cima, mandando e massacrando o pobre, prejudicando e usurpando aquilo que é nosso direito”.