Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

 

Qual a semelhança da preparação de um pão e de um povo I?*

Para preparar um pão, você tem que ter a massa, 
Uma forma – instrumento, 
Uma receita – teoria de como fazer e alguém que prepare. 
Para preparar um povo, pode-se seguir a mesma regra. 
Pegue a massa, tenha um instrumento e aplique uma teoria.

Primeiro, reúna um grupo de dirigentes que guiará todo o processo, 
Não precisa ser muito. 
Esses dirigentes irão escolher um grupo de coordenadores. 
Esse grupo de coordenadores será um pouco maior do que o grupo de dirigentes.
Os coordenadores se encarregarão de juntar e coordenar a massa, o povo. 
Ao povo caberá a tarefa de seguir seus coordenadores, 
Que por sua vez, serão guiados pelos seus dirigentes.

Quem e o que orientará os dirigentes? 
Os dirigentes não serão orientados por ninguém, 
Pois os mesmos seguirão uma orientação teórica. 
Também não precisa criar uma teoria, 
Ela já foi criada, importada e será o guia. 
Os dirigentes municiados de uma teoria orientarão os coordenadores, 
Que por sua vez conduzirão a massa. 
Bom, já temos uma receita.

Com a receita em mãos, agora é preciso ter um instrumento.
Também não precisamos nos preocupar com isso. 
Temos um acúmulo de construção de ferramentas. 
É preciso definir qual a melhor para o momento. 
Ah, que bom que existem os dirigentes 
Para definir qual a melhor para ser usada. 
Não é preciso ficar em cansativos debates, 
Desde as massas e entre os coordenadores para definir qual melhor instrumento. 
Tem os dirigentes para fazer isso.

Já temos a receita e o instrumento, que foi definido pelos dirigentes. 
Agora é levar a receita e o instrumento para a massa. 
A massa apropriada de uma teoria - um conhecimento que lhe externo, 
Com um instrumento que não lhe coube pensar e construir, 
Seguindo uma coordenação e guiada por um grupo dirigente, 
Pode ser chamada de um povo preparado, formado. 
Essa é uma forma de preparar um povo.

 

 

Qual a semelhança da preparação de um pão e de um povo II?

Referente ao pão, tem vários tipos, 
Portanto, várias formas e formas para prepará-lo. 
Já o povo, não se prepara e não se forma. 
O povo se constitui nos processos sociais e de produção, 
Conforme os lugares em que vivem.

A massa, o povo é diverso, 
Étnico-culturalmente e geograficamente localizado. 
Há vários processos organizativos que orientam 
Os diversos povos e grupos sociais.
Povos e grupos sociais se classificam em seus processos de emancipação
E em suas lutas para permanecerem existindo – 
Lutas emancipatórias e de re-existências.
Sejam nos campos, nas águas, nas florestas 
Ou nos espaços tomados pelo concreto – a cidade.

E o que orienta esse povo e suas lutas? 
Alguns, sua ancestralidade, os saberes repassados por gerações, 
Os saberes construídos pelos viventes e pela humanidade. 
Os saberes que são postos lado a lado, 
Sem necessariamente negar um ao outro. 
As experiências de vida vivida e a projeção de uma vida plena 
Que não se deixam ser podadas, mutiladas e negadas. 
É uma conjunção de lutas contra quem os nega 
E lutas com quem se dispõe a construir caminhos. 
Uma teoria forjada na vida vivida e nos processos de luta.

Os instrumentos são construídos conforme os processos de lutas. 
Claro, alguns já existem e continuam sendo utilizados. 
Outros precisam ser modificados, atualizados e aprimorados 
Pelas necessidades atuais. 
Muitas vezes, os instrumentos utilizados por um povo ou grupo social 
Não necessariamente servirão para outro povo ou grupo. 
Muitas vezes, as experiências são partilhadas 
E servem para diversos processos de lutas. 
Ou seja, não há um instrumento a ser priorizado. 
Há instrumentos a serem utilizados, testados e confrontados.

É, não temos receitas, temos vários processos. 
Não temos um instrumento a priorizar, 
Temos instrumentos disponíveis para os mais variados processos de lutas. 
Não temos um povo, 
Temos várias formações sociais, culturais, econômicas, étnicas, ecológicas – territoriais. 
Para o povo, não há de ter forma, formatação,
Muito menos receita.
Não temos que negar o que construímos,
Temos que nos atentar para o que está em curso. 
O mestre já falou, “ninguém liberta ninguém, (...)”.

 

Plácido Junior
01/05/2018
* Texto escrito para reflexão, crítica e autocrítica entre companheiros e companheiras que sonham e lutam por um mundo justo, que colocam suas vidas em luta em defesa de tantas vidas.

 

 

 

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