Artigo
O governo Dilma já entrou para a história por ter sido interrompido por meio de um golpe político protagonizado por uma ampla aliança das classes conservadoras. Tais setores, não apenas fulminaram a ordem democrática; em tempo sumário, violaram a soberania do país; solaparam direitos dos trabalhadores; e estão retroagindo, de forma intensa a economia e o quadro social brasileiro para posição anterior a 2003. É como se tivessem colocado o país numa máquina do tempo para uma viagem de volta súbita a um passado que julgávamos ter superado.
É verdade que o governo Dilma frustrou expectativas a partir dos interesses populares por suas escolhas econômicas e pela apatia em áreas vitais para as transformações que o Brasil precisa. Mas, além de ter sido fruto da vontade soberana da maioria da população, o governo Dilma manteve o legado social dos governos Lula, diversificando mesmo algumas dessas políticas.
Especificamente na área agrária, após o primeiro período de governo caracterizado pela indiferença, no início do segundo governo, embora às vésperas do golpe, Dilma acenou com o resgate dos compromissos com o programa de reforma agrária. Dos 21 Decretos de desapropriação para fins sociais no ano de 2016, 20 foram de sua iniciativa. O governo Temer publicou um único Decreto envolvendo a desapropriação de 58 hectares; processo antigo, de uma área quilombola no Rio Grande do Sul. Aliás, além do único Decreto de Temer, a sua base no Congresso trabalha incessantemente ações legislativas pela revogação dos Decretos de Dilma.
No conjunto, os 21 Decretos englobaram área de 35 mil hectares. Significa que, afora o ano de 2015 com ‘Decreto zero’, o ano de 2016 teve o pior desempenho em termos de áreas obtidas via Decretos de desapropriação, desde 1995.
Na realidade, o 'Painel dos Assentamentos' mantido no site do Incra informa, com data de atualização de 21/11/2016, que até então tinham sido obtidos pelo programa de reforma agrária, 19.5 mil hectares com uma capacidade de assentamentos para 784 famílias.
A prova cabal do absoluto desprezo do governo Temer para com o programa de reforma agrária: dos R$ 946 milhões previstos na LOA 2016 para o crédito-instalação às famílias assentadas, o valor empenhado foi simplesmente ‘zero’. A conclusão é óbvia: ou não teve família assentada em 2016, ou as pouco famílias assentadas sequer receberam esse crédito vital para o êxito de um assentamento.
A propósito, os dados do SIOP, do Ministério do Planejamento, revelam que na posição de 31 de dezembro, dos R$ 2.7 bilhões das dotações autorizadas para o Incra em 2016, 25% foram consumidos no pagamento de precatórios, o que basicamente se deve à aberração do pagamento, pela via judicial, da compensação ao lucro cessante pela desapropriação de grandes propriedades improdutivas. Trata-se do maior ralo de recursos do Tesouro mantido no programa de reforma agrária em benefício do latifúndio.
Quando consideramos esses pagamentos juntamente com os relativos às atividades meio do Incra, conclui-se que neste ano, apenas 15% das dotações orçamentárias totais da autarquia foram direcionadas às atividades finalísticas do programa de reforma agrária.
O governo iniciou e terminou o seu período em 2016 deixando claras as suas intenções na “política agrária”. Logo após o golpe editou duas Medidas Provisórias. Uma delas, a de nº 726, definiu uma conturbada reforma ministerial supostamente motivada pela crise das finanças públicas que incluiu a extinção do MDA, cujas atribuições foram transferias para o MDS, transformado no MDSA. Em seguida, as atribuições do extinto MDA, juntamente com o Incra, saíram do MDSA e foram transferidas para a Casa Civil da PR.
A extinção do MDA, além da sinalização prévia do rebaixamento de patamar do programa de reforma agrária e das políticas para a agricultura familiar, representou um ato de retaliação do governo aos movimentos organizados do campo que se insurgiram contra o golpe.
Por Gerson Teixeira
Da Página do MST