"A terra é a grande testemunha das lutas camponesas”
Fazer a memória das lutas camponesas no Nordeste para alimentar a mística e enfrentar os desafios e combates que se avizinham. Este foi um dos objetivos da Assembleia da CPT Nordeste II. Inspirados na memória das lutas históricas ocorridas no Nordeste, os camponeses e camponesas presentes na assembleia deram seu testemunho de compromisso com as lutas pelo acesso à terra, ao território, por defesa de direitos e pela vida:
"Temos trabalhado e assim buscado nosso objetivo sobre a terra, buscando o alimento para nós e para as famílias de mais pessoas que não estão no campo por motivo de saúde ou por outros motivos. Somos forçados a ser oprimidos por aqueles que têm mais poderes. A terra gera o alimento, gera o emprego, mas também está sendo usada para gerar pensamentos negativos e alguns aproveitam a fragilidade de um povo que vive dignamente do seu suor para se alimentar” - Seu Benedito, Acampamento Santa Cruz, Murici/AL.
“Vou contar a minha história de escravidão... Começou quando eu era escrava de uma empresa. Saíamos às 2h40 e retornávamos às 21 horas. E assim vivi três anos e meio. Depois casei e engravidei, a minha primeira filha nasceu com muitos problemas devido ao veneno [agrotóxico utilizado pela empresa] e quando nasceu meu segundo filho eu pensei... Foi ai que eu decidi lutar pela terra, pois já chega de sofrer. Passamos dois anos acampados e depois conquistamos a terra e começamos a plantar; foi só maravilha pois começamos a comer coisa boa e a nossa vida foi mudando. Sou agricultora e também sou coletora de sementes nativas, também sou pescadora. Tenho várias maneiras de sobreviver”. Ana - Assentamento Professor Mauricio de Oliveiro, Assú/RN
“ Meu avô foi o primeiro a ocupar as terras, mas meu pai tinha uma visão de que o campo não era bom então foi pra cidade. Eu nasci na cidade, nasci na Bahia, mas depois ele percebeu que a visão dele estava errada e voltamos. Ele resolveu trabalhar pra ele mesmo. Nesses 21 anos, eu cresci e me formei e percebi que o quintal de casa era o meu local de estudo. Nós somos a força maior dessa nação e desse país. O Pronaf infelizmente é utilizado para a monocultivo e não para a diversidade. A Diversidade é vida. E nós consumimos os agrotóxicos, não de uma vez, mas aos poucos, estamos nos matamos aos poucos. Todo dia a gente ingere uma pequena dose e chega um dia que vem a dose fatal. Temos que pensar o que estamos fazendo no quintal de casa. Não temos que olhar para a mídia que diz que o agro é tudo. A diversidade é tudo. A diversidade é vida”. Jailson - Acampamento Marinas do Abiai, Pitimbú/PB.
“Na minha comunidade, tem 80 famílias e é um Engenho que sempre vem lutando pelos direitos. O usineiro quis tomar a terra que é nossa por direito. Então, estamos nessa luta, só basta a gente querer. Com o Residência Agrária [formação para jovens], eu pude abrir mais os meus olhos, mas a gente as vezes se vende muito barato. Jovem de agricultor é filho de dono de fábrica de alimentos diversificados, como uma vez me disse o Padre Tiago. Então, me orgulho muito. Eu pensava em sair, mas agora eu penso diferente. Tive oportunidade de perceber que temos ouro nas mãos, mas não nos valorizamos. Os jovens da nossa comunidade se reúnem e pensam em fazer coisas para melhorar nossa comunidade. E estamos tentando abrir os olhos de mais jovens. Até minha mãe mudou de ideia. Uma vez pedi um conselho para ela, se fico no campo ou vou pra cidade. Ela disse que era melhor ir pra cidade, mas depois conversei que na cidade as pessoas são exploradas, não recebem dignamente, e depois ela entendeu e reconheceu que o campo é melhor”. Ester Alves de Lima, Engenho Barra do Dia, Palmares/PE.
“Lá no Engenho em que moro, a gente passa por um conflito. O usineiro não faz questão daquela população [moradores]. Foram pessoas que doaram suas vidas pela terra dele, e ele não deu a mínima. Produtor de monocultivo não quer saber de pequeno agricultor. Muitos aqui nesta Assembleia foram expulsos de suas terras e é isso o que o proprietário está fazendo com a gente agora. Tem gente lá que viveu por 50 anos e teve que sair, mas ainda tem morador antigo, que vive lá há 70 anos e que resiste, porque a vida está ali. Mas com a nossa luta estamos conquistando o direito de produzir o que é nosso. Meu orgulho é ver meu pai e minha mãe produzindo. Eu não estou aqui só por mim, estou por eles, porque eles viveram o conflito e uma vida dura, sabem o quanto é sofrido cada pão ou cada conquista, cada batalha travada a cada dia. Meu irmão é o primeiro universitário da família, vai se formar em agronomia. Isso foi uma conquista que para meus pais valeu muito. Tudo o que a gente passou e ainda passamos é porque vivemos em uma área de conflito e não temos nada certo, não temos a terra ainda. Infelizmente, a qualquer momento podemos ser expulsos, mas a gente resiste e não deixa a nossa luta parar. Resistimos porque gostamos do que fazemos. Hoje eu participo e procuro ajudar minha comunidade. Tem a associação dos trabalhadores e lá tem todo o trabalho e estamos lutando e resistindo por uma causa que é de todos. Gilvana, Engenho Uma, Moreno/PE.