Os índios que estão acampados no assentamento Mucatu, em Alhandra,um dia depois de serem despejados pela polícia de dois lotes, que pertenceriam ao coronel da PM,Lima Irmão, receberam a visita de muitos padres brasileiros e estrangeiros que estão participando de um encontro em Campina Grande. Entre eles, estavam o bispo da Diocese de Nova Iguaçu, da Comissão de Direitos Humanos, no Rio de Janeiro, Dom Luciano Bergamin, e Frei Beda,que desenvolve trabalhos sociais em vários estados brasileiros.
Dom Luciano classificou a ação como falta de sensibilidade das autoridades em relação à luta por terra e contra o capitalismo. Ele disse que é incrível o que está acontecendo no local. “Tantos lugares, com tanta terra nesse estado e mesmo assim reprimem índios e trabalhadores que estão lutando pela sobrevivência de suas famílias”, disse.
Segundo o deputado estadual Frei Anastácio (PT), que está apoiando a luta dos índios e dos assentados, a comitiva que lotou dois ônibus, foi prestar solidariedade aos tabajaras e aos trabalhadores que foram feridos com balas de borracha durante a operação de despejo realizada pela polícia, na noite de quinta-feira. “Com essa visita, a luta contra a instalação da fábrica de cimento na grande Mucatu,ficou conhecida em diversos países, já que padres e missionários de várias nacionalidades conheceram de perto os motivos das ocupações na área”, disse o deputado.
O deputado disse que algumas das cápsulas de balas de borracha de espingarda calibre 12, disparadas durante a operação, foram recolhidas e serão entregues a Ouvidoria Nacional do INCRA, para que as providências jurídicas em relação à operação sejam tomadas. “As pessoas feridas também estão prontas para prestar depoimento, em relação a essa ação de despejo que foi realizada à noite, de forma ilegal”,disse Frei Anastácio.
As causas do conflito em Alhandra
Os trabalhadores e os índios descobriram que o ex-comandante da PM, coronel Lima Irmão estaria vendendo dois lotes, que ele adquiriu no assentamento, para a Cerâmica Elizabeth, que está planejando implantar uma fábrica de cimento no local. Ao terem informação da transação de possível venda, os trabalhadores e índios realizaram a ocupação do local, no dia 26/01, já que os lotes estariam nas mãos do coronel, de forma ilegal, segundo eles, sem nenhum registro no INCRA.
Frei Anastácio disse que essa é mais uma ação conjunta, entre trabalhadores e índios, contra a implantação da fábrica de cimento na grande Mucatu,uma área de assentamentos da reforma agrária, que atinge os municípios de Conde,Alhandra e Pitimbu, no litoral sul da Paraíba.
Primeiro despejo foi no ano passado
A primeira ocupação ocorreu no mês de dezembro do ano passado, em dois lotes, que teriam sido vendidos por assentados para a cerâmica. Através de decisão judicial, os manifestantes foram despejados, mas permanecem acampados numa área próxima. Os índios alegam que no momento em que terras da reforma agrária são vendidas perdem sua função social. Com isso, os lotes que forem vendidos serão reivindicados por eles, que estão lutando pela demarcação de 10 mil hectares na área.
FUNAI nacional pediu providências
O deputado explica que além da presença física dos trabalhadores e índios, com apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o caso ganhou reforço da FUNAI,INCRA e Procuradoria da República. “A FUNAI nacional já fez gestão para que o processo contra a ocupação da área seja transferido da justiça comum para a justiça federal. Dessa forma, a FUNAI quer o embargo da área para evitar qualquer ação de implantação da fábrica, até que a conclusão do processo de demarcação das terras indígenas, cerca de 10 mil hectares, que estão sendo reivindicadas pelos tabajaras. O INCRA já tem processo formalizado, para investigar se a transação de compra e venda de dois lotes, entre Elizabeth e assentados e está fazendo levantamento para formalizar processo sobre os lotes do coronel da PM ,”explicou o deputado.
Situação dos cinco assentamentos da Grande Mucatu
O deputado estadual Frei Anastácio (PT) está contestando as informações repassadas à imprensa pelo advogado da cerâmica Elizabeth, de que a área da grande Mucatu, em Alhanda,Conde e Pitimbu não é de assentamentos da reforma agrária, e que seria um paraíso de granjeiros. “O advogado está usando de má fé, ou não tem conhecimento sobre aquelas terras. Eu fiz um levantamento de toda área, no INCRA, e constatei que dos 201 lotes da grande Mucatu,apenas 40,8% estão emancipados,ou seja, já receberam o título definitivo da terra”, disse Frei Anastácio.
O parlamentar explica que isso significa que apenas 82 famílias já pagaram o que deviam ao INCRA, mas, mesmo assim, os lotes não perderam a designação de assentamento. Dessa forma, a grande maioria ainda está totalmente ligada ao INCRA e trabalha de sol a sol para tirar o sustento da família. “Dizer que a área é um reduto de granjeiros, significa uma afronta às famílias que trabalham duro para sobreviver”, afirma o parlamentar.
“É bom lembrar que enquanto um lote não é emancipado, o assentado não pode realizar qualquer negócio com ele. Se houver venda, as duas partes ficarão no prejuízo, já que o lote é retomado pelo INCRA e tanto quem vendeu,como quem comprou irá responde a processo na justiça. Essa é a realidade de quase 60% dos assentados da grande Mucatu, que não podem fazer nenhum tipo de negócios com os lotes”destacou Frei Anastácio..
Diante do levantamento, Frei Anastácio também rebate as notícias de que 70% dos lotes já teriam sido vendidos na grande Mucatu. “As informações que temos dão conta de que num universo de 201 lotes apenas oito pessoas venderam, que foram Luiz Marinheiro, Manuel Araújo, João Barbeiro, Mário Firmino,
Hildo Capitulino,Pedro Virginio e José Cosme.Isso representa apenas 3,9%,longe do percentual de 70%”,enfatizou.
O parlamentar disse que a Paraíba é o único estado no Brasil onde uma área de assentamento da reforma agrária está sendo alvo do interesse da administração pública, com destino ao capital privado. “Mais de 10 mil famílias serão atingidas com as fábricas, que estão sendo planejadas para a área. E se algumas famílias estão vendendo suas terras para a cerâmica Elizabeth, a grande maioria não quer fazer nenhum tipo de negócio, nem quer sair da área. E eu estou ao lado dessas famílias que chegaram até a derramar sangue na luta por aquelas terras, que foram as primeiras áreas a serem desapropriadas para reforma agrária na Paraíba, na década de 70”, destacou.