O Estado de S. Paulo
27 de abril 2010
Jamil Chade
Presidente da maior estatal chinesa do setor agrícola admite interesse em cultivar grãos no País e já investe em 40 países com atividades de produção
Com a chegada ao Brasil, a China amplia sua busca por terras para garantir o abastecimento à população. A constatação é de que, para alimentar 9 bilhões de pessoas em 2050 anos, os investimentos em agricultura terão de dobrar no mundo, o que já está fazendo vários países irem em busca de terras.
Mas o fenômeno da compra de terras no exterior vem causando polêmica, e entidades como a ONU começam a debater a criação de um código de princípios que países devem seguir. A preocupação é que a compra de terras crie obstáculos a populações locais e falta de acesso a terras.
No caso da China, a estatal que debate investimentos no Brasil está diretamente ligada ao Conselho de Estado. Com cinco anos, a estatal tem ativos de US$ 2 bilhões e 80 mil funcionários para promover a segurança alimentar da China. Dez mil funcionários da empresa já atuam no exterior, em pelo menos três continentes. No Brasil, nosso interesse é investir em soja e milho, diz Qingzhi. Ele prefere não falar nem onde será o investimento nem o valor, por enquanto.
Global. A estatal está presente em 40 países com atividades de produção. Na Tanzânia, já detém 6 mil hectares, e Qingzhi garante que o governo local quer a expansão do projeto. Os chineses ainda investem no cultivo de frango e produção de ovos na Zâmbia e arroz em Guiné, Benin, Argentina e Peru.
No Senegal, os chineses investiram na pesca e têm a maior empresa estrangeira do país, com 2 mil empregados. Não estamos apenas explorando, mas também treinando funcionários locais, diz o presidente da estatal, lembrando que também garante a transferência de tecnologia nas cidades de Benin.
Os chineses insistem que não estão apenas desembarcando para ocupar e que estão desenvolvendo projetos de doação de alimentos, construção de escolas e centros de saúde, como na Zâmbia. Respeitamos as leis locais e garantimos benefícios mútuos, diz o chinês. Nossos investimentos promovem o desenvolvimento do país onde estamos aplicando, afirmou.
A estatal admite que a compra de terras tem uma dimensão política. Mas insiste que esses acordos estabilizam relações diplomáticas.
Especialistas reunidos ontem na ONU indicaram que, de fato, o avanço de países em busca de terras tem a China como um dos principais atores. O safári produzido por Pequim na África chegou a assustar a FAO. Seu diretor, Jacques Diouf, alertou há poucos meses os governos africanos para o risco de um neocolonialismo, desta vez pelos chineses. O que ele teme é que a produção seja inteiramente destinadas aos países que adquiriram as terras, sem levar em conta os interesses das populações locais, ou mesmo a adaptabilidade das terras. A China já comprou ou negocia terras no Congo, Zâmbia e Sudão.
PARA ENTENDER
Hoje, limite é de 3,8 mil hectares
A legislação atual permite que estrangeiros comprem terras na Amazônia Legal no limite de até 3.800 hectares, desde que tenham empresa constituída no Brasil.
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou em outubro substitutivo do deputado José Genoino (PT-SP), pelo qual estrangeiros que adquirissem área superior a 1.140 hectares antes da aprovação do projeto poderiam manter as propriedades, desde que produtivas.
A matéria foi analisada em caráter definitivo pela Comissão de Constituição e Justiça, que o aprovou por unanimidade. Falta agora a votação do Senado.