* Por Mieceslau Kudlavicz
Outra pergunta que deve ser feita é a seguinte: por que o governador do Estado não vai a imprensa adjetivar os usineiros de “fajutos” quando estes utilizam uma prática que deveria estar abolida no Brasil há mais de cem anos, qual seja a utilização de mão de obra escrava de índios e não-índios? Mas ao invés disso prefere chamar de “trabalhos antropológicos fajutos” (Jornal Rio Brilhante, 10/09/2008) a demarcação de terras indígenas que sequer foi executada.
Cabe lembrar que a demarcação prevista, se este for o resultado do trabalho antropológico de identificação das áreas, é uma área de terras que representa praticamente um quinto do que existe de terra devoluta neste Estado, segundo Carlos Caroso presidente da Associação Brasileira de Antropologia, ou seja, entre 500 e 600 mil hectares (Jornal do Povo, 09/09/2008).
Porém, infelizmente, nada disso nos surpreende quando se trata de defender os interesses da oligarquia rural, sabemos que a classe política dominante representa os interesses dos latifundiários que historicamente se assenhorearam do Estado de Mato Grosso do Sul em benefício próprio, inclusive para grilar as terras indígenas e de camponeses, principalmente a partir de 1850 quando da aprovação da Lei de Terras. Segundo o professor Ariovaldo Oliveira (2008), o Estado possui mais de 1,3 milhões de hectares de terras documentadas além do que a realidade permite, ou seja, tem município com mais terra titulada do que seu tamanho real. Isso é estapafúrdio, indício maior das fraudes praticadas para titulação de terras em favor de particulares senão com a participação direta do poder público, no mínimo por omissão.
Em vista destas suspeitas de fraude que estão na origem da propriedade privada da terra em Mato Grosso do Sul, que autoridade moral tem a classe latifundiária do Estado para questionar a demarcação das terras indígenas? O mesmo questionamento também se aplica ao governador pelo uso político parcial que faz do poder ao qual foi investido pelo voto, contribuindo, senão para impedir, no mínimo para criar um clima de pânico na população não-indígena e, mais, aprofundar as hostilidades em relação aos indígenas. Enfim, sua postura na defesa explícita da classe dos latifundiários objetiva criar obstáculos na aplicação do que manda a Constituição Brasileira em relação a demarcação das terras indígenas e deve ser repudiada pela sociedade.
* Agente da CPT/MS e acadêmico do curso de Geografia/UFMS