Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

O tiro saiu pela culatra. Latifundiários e políticos conservadores de Pernambuco pretendiam isolar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), prendendo Jaime Amorim, uma de suas lideranças, em 21 de agosto. A justificativa para a prisão era seu mau comportamento em um protesto. O motivo foi considerado “sem fundamentação”, pelo ministro Nilson Naves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ, e Amorim foi solto, uma semana depois. Em entrevista ao Brasil de Fato, o coordenador do MST analisa a violência no campo pernambucano. Narra também as condições precárias do presídio em que ficou. Com outros presos, debateu alternativas políticas para melhorar o sistema carcerário e lutar contra a exclusão social. Brasil de Fato - Como você avalia o crescimento da violência no campo em Pernambuco? Só em agosto, tivemos ameaça de despejo do acampamento Chico Mendes, assassinato de duas lideranças do MST, a sua prisão e a prisão de mais dois militantes. Jaime Amorim - O que ocorre aqui em Pernambuco é o que ocorre em todo o país. De fato, com gravidade um pouco maior. A violência assume diferentes formas, dependendo do período e do território. Temos aqui, em alguns momentos, enfrentamentos diretos com o latifúndio, com as milícias armadas dos latifundiários. Em outros momentos, como ultimamente, enfrentamos a agressão direta do Estado, com seu aparato repressivo. Também sofremos com outra parte do Estado, o Poder Judiciário. O poder, digamos, da injustiça social e jurídica do Estado. Sofremos com prisões, reintegrações de posse, prisões preventivas e inquéritos injustificados. Lembrando que todas as reintegrações de posse solicitadas pelos usineiros e fazendeiros, a Justiça tem atendido prontamente. BF - Você declarou que sua prisão tinha relação com o processo eleitoral. Por quê? Amorim - Com minha prisão, o Estado estava provocando o MST para que viesse, com a força do povo, fazer pressão nas portas do Judiciário e do presídio. Assim, eles poderiam justificar a repressão contra o movimento, vinculando o fato a um processo político eleitoral e tentando nos isolar cada vez mais. Conduzimos a questão de forma bastante madura. Só deixamos as mobilizações populares acontecerem depois de esgotadas todas as possibilidades jurídicas. Tivemos muitos apoios, locais, nacionais e internacionais. Não lembro de uma manifestação que teve o apoio de tantos parlamentares. Muitos podem dizer que esse apoio foi eleitoral, e pode ser. Só que a elite queria fazer justamente o contrário, queria que os candidatos não viessem nos apoiar, achando que iam perder voto. Mas eles vieram. Isso demonstra que as pessoas estão dispostas a defender a reforma agrária. BF - Você acredita que a sua prisão teria como objetivo desviar o foco das investigações das mortes de Josias e Samuel, militantes assassinados um dia antes de sua prisão? Amorim - Não necessariamente, porque, de qualquer forma, eles não vão investigar a fundo. Podem investigar - até já foram decretadas as prisões preventivas dos suspeitos -, mas o objetivo é outro. Além de criminalizar e isolar o MST da sociedade, nesse caso, a idéia era tentar afastar uma liderança, em um momento importante. Eles acreditaram que o movimento ia agir contra a incoerência do Estado e eles justificariam sua reação. Mas o que eles fizeram saiu pior para eles do que para nós. Todo mundo sentiu a incoerência de uma prisão no meio do sepultamento de um companheiro e com outro ainda para sepultar, vítimas da exclusão social. BF - Você fez declarações na imprensa sobre a necessidade de assumir a luta pela melhoria do sistema penitenciário. Amorim - Não poderia sair de lá sem fazer uma declaração em relação à situação dos presídios - apesar de eu estar em uma cela especial. Passei uma semana detido e, tirando a prisão, não passei nenhuma dificuldade. Fiquei no meio de médicos, advogados, policiais, portanto, da “nata” do presídio. Não tenho nada a reclamar de onde eu estava. Só que, do meu lado, estavam mais de 700 presos amontoados. Aproveitei a semana inteira para fazer muito debate. Debate na cela onde eu estava, debate com médicos, psicólogos, trabalhadores do presídio e com outros presos. Foi daí que obtive uma informação que não tinha: para cada preso, o Estado paga ao sistema penitenciário brasileiro R$ 1.700. Isso é o cúmulo, se você constatar a situação dos presídios desse país! A maioria dos presidiários está abandonada. São vítimas da exclusão social. BF - Como está a reforma agrária em Pernambuco? Amorim - Há uma tentativa de melhorar o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de Pernambuco. Mas, infelizmente, a instituição é muito ruim, a maioria dos servidores ainda é do período da ditadura militar, reacionários na postura, atrasados na questão técnica. Isso impede avanços. Tem também muita oposição dentro do próprio governo federal, em relação ao que fazer com a reforma agrária. Há ainda uma burguesia agrária com um poder político muito forte. A maioria dos juízes está vinculada à burguesia agrária. O atraso e as posturas conservadoras em relação à reforma agrária são resultado do vínculo familiar e econômico com a burguesia agrária. A perspectiva de mudança, em curto prazo, é muito pequena. Vamos dizer assim: depende da nossa capacidade de mobilização. (Leia a íntegra da entrevista na Agência Brasil de Fato - www.brasildefato.com.br) Quem é Jaime Amorim é dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Pernambuco. Participa da organização desde a fundação desta, em 1984. Nasceu em Santa Catarina , mudou-se para a Bahia, em 1985. Sete anos depois, foi para Pernambuco. É formado em Pedagogia. Entrevista com Jaime Amorim Publicada no Brasil de Fato Mariana Martins do Recife (PE)

 

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