Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

A maior mobilização de povos indígenas no país começa nesta quarta-feira (24), em Brasília, com o 15º Acampamento Terra Livre. A expectativa da organização nacional é levar 5 mil pessoas para marchar na capital federal e, como dizem, plantar o acampamento. Lideranças de várias etnias de Pernambuco também participam do evento, que acontece até o próximo dia 26. O primeiro Terra Livre no governo Jair Bolsonaro (PSL) deverá ser um marco na mobilização e articulação dos povos indígenas brasileiros.

Diante das ameaças que o governo federal representa para as políticas indigenistas, a mobilização ganhou peso. Por 14 anos, anualmente a Esplanada dos Ministérios em Brasília foi ocupada de forma pacífica por diversos povos vindos das cinco regiões brasileiras com trajes, pinturas e suas expressões culturais. Em 2019, o clima é de tensão.

A caminho do acampamento, na última terça-feira (23), Marcos Luidson Araújo, 39 anos, cacique dos Xukurus, confessou apreensão. “Recebemos informações que há um aparato muito forte em Brasília para nos receber. Mas estamos preparados para o que der e vier”, comentou. A Força Nacional já recebeu ordens de reforço na vigilância na Esplanada dos Ministérios e na Praça dos Três Poderes. A ordem veio do ministro da Justiça Sérgio Moro. Além disso, pela primeira vez, faltando poucos dias para acontecer, ainda não há autorização do governo distrital para o evento.

Uma comitiva de cerca de 400 indígenas, integrantes de 12 povos diferentes, sairá de Pernambuco, o quarto estado brasileiro com maior população de povos indígenas. Carmem Pankararu, representante dos trabalhadores indígenas no Conselho Nacional de Saúde, embarcou na noite do dia 22 em direção a Brasília, e comenta que a estratégia é buscar diálogo com diversas instituições de forma pacífica, mas sem recuar.

“O governo tem se colocado em rota de colisão com os interesses indígenas e a princípio a intenção dos povos indígenas é continuar na luta pelos seus direitos constitucionais para que não haja retrocesso”, explica Carmem. Segundo a ativista, ainda há incerteza sobre a montagem do acampamento, mas, de acordo com a programação, no dia 24 as atividades começam com uma marcha “ainda com mochila nas costas”.

Para Vânia Fialho, antropóloga e professora da Universidade de Pernambuco (UPE) no mestrado de culturas africanas e de populações indígenas, o cenário de riscos aos direitos dos povos indígenas vem piorando nos últimos meses. “Desde 2 de janeiro já veio uma avalanche de coisas, a flexibilização de políticas indigenistas tem rebatimentos na saúde, na mineração, na exploração das florestas. As áreas indígenas são áreas que têm sido atacadas por uma política ultraliberal e o horizonte que vemos é complicado. O que nos resta é realmente a resistência. A mobilização dos povos indígenas é um grande símbolo dessa resistência”, analisa.

“É uma marcha em busca dos nossos direitos, mas de uma forma pacífica, onde a nossa principal arma será o diálogo. Isso é o que nós pretendemos, não estamos aqui para confrontar o governo, nós estamos aqui com o nosso grito de paz e marcando a nossa posição pela luta pela terra”, afirma Carmem Pankararu.

O cacique Marcos Xukuru disse ainda que, para além das pautas da política indigenista, o acampamento também será um momento de defesa dos direitos dos brasileiros. “Também vamos defender a Previdência pública que está sendo ameaçada pela reforma que o governo quer fazer”, comentou.

“Luta pela terra e pelo território”

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Acampamento Terra Livre historicamente acontece na semana do Dia do índio, em Brasília. Imagem: Mídia Índia Oficial

“Sangue indígena. Na veias, a luta pela terra e pelo território” é o tema da 15º edição, que toma como mote o sangue indígena, tom presente na mobilização de outros anos. Em 2019, segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a pauta extensa inclui o posicionamento contrário a iniciativas do governo Bolsonaro como a transferência da Funai do Ministério da Justiça para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; a municipalização da saúde indígena; a proposta de marco temporal (uma tese político-jurídica inconstitucional, segundo a qual os povos indígenas só teriam direito às terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988); a transferência do poder de demarcação para o Ministério da Agricultura sob comando da bancada ruralista; a intensificação das invasões às terras indígenas e as ameaças às lideranças.

Carmem questiona as declarações do presidente Jair Bolsonaro, que chegou a dizer em uma de suas redes sociais que o evento é custeado com dinheiro público. Além disso, em outro momento, ele disse defender um “desenvolvimento” para os indígenas, mas seu governo propôs por fim a espaços de participação, a exemplo do Conselho de Política Indigenista. “Hoje temos ameaça declarada do presidente de que os índios não terão mais um centímetro de terra e ele insiste em dizer que o que busca para os índios é o ‘desenvolvimento’, e usa o termo integração. A gente morre de medo dessa história de 519 anos que fez com que muitos dos nossos povos fossem dizimados”.

Em nota, a APIB negou que utiliza dinheiro público para realizar o acampamento e cobrou responsabilidade de Bolsonaro. Vaquinhas online estão sendo realizadas para reunir os recursos para o evento. “É necessário acabar com a farra com o dinheiro público e isso não se fará com o congelamento do salário mínimo, ou cortes em saúde e educação. Se fará com o fim da corrupção, dos cheques, dos motoristas laranjas ou de tantos outros escândalos que vemos por aí”, diz a nota.

Segundo Carmem, os povos pernambucanos contaram com ajuda de uma vaquinha estadual, organizada pelo Povo Pankararu, apoio de organizações da sociedade civil, doações individuais e também apoio de parlamentares.

 

Fonte: Marco Zero Conteúdo

 

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