Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Depois de escutar o canto do Sabiá, do Curió, do Sibito, aqui em casa, regado a um bom café, claro, me veio à mente algumas questões que compartilho com as cabeças inquietantes. Colocarei algumas questões como apontamentos. É, precisamos aprofundar. Espero que esta tarefa não seja só minha, por isso convido todas e todos a fazermos conjuntamente.

Plácido Junior

Geógrafo e Agente da CPT NE 2

 

A primeira que veio à mente é que as esquerdas, de forma geral, têm que parar de falar de socialismo, comunismo e revolução. Não de acreditar, mas sim de falar, de gritar em discursos longos e cansativos os quais ninguém escuta, nem seus pares que estão em cima dos palanques ou os que estão tremulando bandeiras em baixo. Eles já sabem de cor os discursos. Não funciona. Mais que os discursos, são as práticas que ajudam a elevar a consciência dos oprimidos e injustiçados.

Como esses discursos chegam ao vendedor/a de pipoca? Como chega a um engraxate? Como chega ao desempregado ou a um/a trabalhador/a precarizado/a que muitos chamam de trabalhador/a do comércio informal? O trabalho que chamam de informal/precarizado já ultrapassa muitas categorias de trabalhadores de carteira assinada. Como o campesinato e os povos originários veem, recebem e processam os belos conceitos? Mesmo entre os/as trabalhadores/as de carteira assinada, do proletariado, como esses discursos são absorvidos e como esses conceitos são assimilados?

Depois de ouvir os discursos bonitos e bem formulados, esses/as trabalhadores/as voltam para seus bairros, campos e casas e o esgoto continua correndo a céu aberto; a violência é uma péssima companhia; as drogas chegaram aos seus filhos, irmãs e irmãos; o transporte coletivo que não funciona é caro; a terra não é partilhada, a reforma agrária não é feita e nem as terras dos povos originários e quilombolas são demarcadas; o desemprego ronda a mesa do proletariado; e a fome faz parte da vida de milhões de brasileiros/as.

Mais do que falar e gritar, temos que mostrar o que são e o que significam esses conceitos. Este é o momento da pedagogia. Aprendi com um mestre pedagogo que pedagogia vem do Grego, significa “guia”, “aquele que conduz”. Claro, aqui também precisa de um método. Esse é outro assunto. Mais do que falar e mostrar o caminho, é preciso ir junto. É preciso construir as liberdades, não as idealizadas, mas as da vida real e concreta. Nossas utopias nos orientam. Temos que partir sempre da realidade da vida das pessoas, e enxergá-las como protagonistas dos seus destinos. Este é outro ponto para debate. Em geral, sempre procuram ser protagonistas dos destinos dos outros. O que quero compartilhar é a ideia de que, mais que falar e gritar conceitos, temos que mostrá-los na prática. São conceitos construíveis que se faz em colado à realidade concreta.

A direita trata de desgastar todos esses conceitos e criar um censo comum de que são sinônimos de corrupção, miséria, falta de liberdade e por aí vai. Este é um campo que a direita disputa muito bem, o campo dos discursos e das narrativas. A direita tem todos os meios de comunicação disponíveis para fazer sua propaganda de massa. Ela tem sido capaz de massificar o desgaste de conceitos trabalhados pelas esquerdas.

Priorizamos o campo das narrativas e dos discursos. Construímos secretarias, coletivos, setores de agitação e propaganda. Não que esses sejam irrelevantes, no entanto, devem vir acompanhados de uma prática revolucionária. Não fazemos transformações profundas na sociedade por meio de propagandas e pela internet. Neste campo estamos perdendo.

Por outro lado, as esquerdas deixaram de fazer o trabalho concreto de construção das utopias, exceto alguns agrupamentos, e passaram a fazer apenas agitação e propaganda dos conceitos. É preciso estabelecer um elo entre o conceito e a prática. Assim, a classe trabalhadora, os povos originários e o campesinato podem sentir, vivenciar, experimentar e construir o devir.

A pedagogia é bem vinda. Não no sentido apenas de mostrar caminhos e de mandar ir, e sim no sentido de caminhar junto. Conduzir é ir com. É a partir das nossas práticas que mostramos a essência de quem somos e de quem queremos ser. Aqui, os povos originários e o campesinato podem nos ajudar. Eles transmitem os valores de suas sociedades através do cotidiano, de suas práticas, de seus afazeres, de seus trabalhos, cultos e celebrações.

Fico por aqui com duas inspirações para construirmos con-junta-mente nossas utopias. Uma é a de um Padre rebelde, Padre Tiago da CPT, que teima em nos mostrar que “mais importante que a falação, é a fazação”. Fazer ação. As ideias não nascem antes das nossas experiências. Nascem da nossa capacidade de refletir sobre elas. A outra inspiração é do nosso mestre Paulo Freire, que tem nos alertado que “é fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática”. Vamos fazer-sentir-pensar juntos/as.

 

 

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