Ocorrida entre os dias 23 e 25 de agosto, no município de Tamandaré, localizado no litoral Pernambucano, a 28ª Assembleia da Pastoral Social teve como tema: "Em tempos difíceis fazer memória, resistir e semear” e reuniu representantes de pastorais sociais e membros da CNBB nos estados que compreendem o Regional Nordeste 2 - Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Confira abaixo a carta final da Assembleia:
CARTA DE TAMANDARÉ
"Nenhuma família sem casa. Nenhum camponês sem terra. Nenhum trabalhador sem direitos.” (*Papa Francisco)
A humanidade vive uma crise civilizatória sem precedentes: crise que reside na raiz do atual processo de desenvolvimento econômico que enaltece o deus dinheiro e o deus mercado, representado pela exploração da força de trabalho e de todos os recursos naturais. Essa lógica aprofunda a desigualdade e a injustiça institucionalizada numa sociedade muito mais voltada ao individualismo do que ao compromisso com uma sociedade justa, fraterna e ambientalmente sustentável.
“Todos aqueles que estão empenhados na defesa da dignidade das pessoas podem encontrar na fé cristã razões mais profundas para tal compromisso” (Laudato Si, n.º 65)
Olhando a realidade brasileira, em especial o Nordeste, palco de contradições, lutas e resistência, nos deparamos com as consequências dos grandes projetos e seus impactos socioambientais, a exemplo das famílias despejadas de sua dignidade e de seus bens básicos como a moradia tal qual ocorre no território da Diocese de Palmares, parte integrante do Regional Nordeste 2 da CNBB, no âmbito da demolição de imóveis nessa área de circunscrição, sem quaisquer indenização, promovidas pela Transnordestina Logística S/A.
Tendo em vista não haver até o presente momento nenhum projeto concreto por parte das autoridades públicas constituídas, nas três esferas da federação, no tocante ao uso da secular ferrovia, abandonada desde o ano de concessão no final da década de 1990 do século passado, apelamos por uma solução a estas famílias, alicerçada nos mais profundos ideias do Evangelho, na restauração da dignidade da pessoa humana.
Também nos preocupa os projetos em curso, tais como os grandes parques de energia eólica e solar, as usinas nucleares, tendo sua construção sinalizada no território deste regional, bem como os impactos socioambientais da transposição do Rio São Francisco e a exploração da mineração e do turismo incompatível com o cuidado da Casa Comum.
Diante do exposto, nós, as Pastorais Sociais e Organismos do Regional Nordeste 2 da CNBB, composto pelos Estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Alagoas, reunidas em Assembleia na cidade de Tamandaré, Pernambuco, entre os dias 23 e 25 de agosto de 2019, queremos apresentar:
A defesa intransigente da democracia frente ao avanço do neofascismo no mundo, ao modelo implantado pelo atual governo brasileiro e o desmonte de direitos sociais, garantidos na Constituição Cidadã de 1988 e outros marcos legais advindos dela;
A demolição de mais de cinco mil unidades habitacionais nos municípios de Cabo de Santo Agostinho, Catende, Escada, Gameleira, Jaqueira, Joaquim Nabuco, Maraial, Palmares e Ribeirão, impactando diretamente na vida de mais de 20 mil pessoas, agrava a desigualdade sistêmica de nossa região, e por isso, exigimos medidas concretas para garantir o direito à moradia dessas famílias;
A necessidade de uma matriz energética, de base descentralizada, sustentável e buscando a autonomia energética das famílias;
A salvaguarda da voz e vez dos sujeitos sociais no debate, formulação e execução das políticas de desenvolvimento;
O apoio total as experiencias de economia solidária, sinais do bem viver em nosso meio;
Defesa da revitalização do Rio São Francisco e fortalecimento das comunidades ribeirinhas e tradicionais deste importante rio e de outros afluentes da região;
A exemplo do avanço das tecnologias sociais no campo do semiárido, estimular a implantação de tecnologias que apontem para uma vida urbana ambientalmente justa e socialmente democrática.
A demolição dos lares dessas famílias da Diocese de Palmares fere o direito à moradia e é por nós repudiada. Irmanados ao Papa Francisco, defendemos o Sínodo da Amazônia e todos os desdobramentos deste importante momento de nossa Igreja, no cuidado da Casa Comum, pois nenhuma terra será vendida definitivamente porque a terra pertence-me, vós sois apenas estrangeiros e meus hóspedes (Lv 25,23).
Tamandaré, 25 de agosto de 2019.