Começou na tarde desta segunda-feira, 05 de agosto de 2019, no Santuário de Padre Ibiapina, agreste paraibano, a 17ª assembleia da Comissão Pastoral da Terra Regional Nordeste 2. Cerca de 150 pessoas - entre quilombolas, assentados/as, acampados/as, sitiantes e agentes pastorais - se reúnem no local dedicado à memória de Padre Ibiapina, um dos precursores no debate sobre os cercamentos das águas e grande inspirador de movimentos de libertação no sertão nordestino, como aquele liderado por Antônio Conselheiro.
O primeiro momento da Assembleia foi dedicado a uma análise de conjuntura, com uma metodologia “desde baixo”, na qual os/as camponeses e camponesas, divididos em grupos, partilharam e refletiram suas realidades, para em seguida, partilharem e debaterem em plenária. Entre os desafios apontados pelas diversas comunidades foi comum a menção ao desmonte de políticas públicas; os danos causados pelos grandes projetos desenvolvimentistas; a expropriação e devastação dos territórios pelo agronegócio; a apropriação dos recursos naturais e a violência provocada pelo Estado contra os povos historicamente oprimidos. Violência essa vista como uma política de Estado propagada e defendida pelo atual presidente da República Jair Bolsonaro.
As medidas implementadas pelo Estado brasileiro para negar direitos aos povos do campo foram pontos de destaque no debate. Entre elas, ressaltou-se o papel do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que deixa de atuar pelo cumprimento a função social da propriedade para ser um órgão de defesa da classe dos latidundiários. Para Carlos Lima, agente pastoral da CPT em Alagoas, “não é de hoje que o INCRA está sendo desmantelado, em governos anteriores isso já vinha acontecendo. A novidade é que nesse o problema ganha outra dimensão. Temos um governo que é declaradamente contra a Reforma Agrária e contra os povos tradicionais”. Vitória Roberta, jovem quilombola do município de Iguaraci/PE, também constata tal realidade. “O território é da gente, a gente sabe, só que para o governo não é”, afirma.
As reflexões dos camponeses e camponesas durante a Assembleia trouxeram a certeza de que as desterritorializações e os mais variados métodos de violência têm o objetivo de destinar terra aos grandes projetos do capital, ao latifúndio e ao agrohidronegócio. Agnaldo Fernandes, presidente do Sindicato das Trabalhadoras e trabalhadores rurais de Apodi/RN, deu o exemplo dos parques eólicos da região onde que vive, que têm expulsado centenas de famílias camponesas de suas terras. O sindicalista questiona: “Que energia limpa é essa que segrega e expulsa famílias de seus territórios?”
Durante as reflexões sobre o contexto ao qual estão inseridas, os/as participantes da 17ª Assembleia também debateram sobre as experiências e iniciativas que vêm desenvolvendo em suas terras e territórios e que lhes ajudam a superar os problemas enfrentados. “Na atual conjuntura brasileira, se de um lado é fundamental a continuação da luta por políticas públicas, do outro, e em convergência, é preciso aprofundar processos de autonomia camponesa na gestão de seus territórios, com o resgate dos saberes tradicionais, da espiritualidade libertadora, com a autodemarcação de suas terras, com a insistência na agroceologia como saída para enfrentar a atual crise planetária”, afirma João Paulo, da Comissão Pastoral da Terra. A Assembleia prossegue até quarta feira próxima, prometendo ser um espaço de rebeldia, profetismo e esperança.
Texto: João Paulo Medeiros