PGR e PGT defendem improcedência de ação que contesta divulgação de cadastro de empresas com empregados em condição análoga à escravidão
A fragilização do cadastro de empregadores que mantêm empregados em condição análoga à escravidão, conhecido como lista suja do trabalho escravo, vai de encontro a compromissos constitucionais e internacionais do Estado brasileiro. Em memorial encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o procurador-geral do Trabalho, Alberto Balazeiro, expõem os motivos pelos quais a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 509 deve ser julgada improcedente pelos ministros da Suprema Corte.
A ADPF, de autoria da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), pede a impugnação da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH 4, de 11 de maio de 2016, e as já revogadas que tratam sobre o cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravos. O cadastro consiste na divulgação de autuações administrativas da Auditoria-Fiscal do Trabalho – documentos de caráter público – para a sociedade.
Aras e Balazeiro pontuam que o cadastro é uma das mais importantes políticas de Estado para a erradicação do trabalho escravo contemporâneo no país, dando concretude a princípios, valores, fundamentos, objetivos, direitos fundamentais, entre outros, previstos na Constituição Federal. A publicação do cadastro está amparada no art. 87, parágrafo único, II, da Constituição, e faz cumprir o mandamento constitucional da publicidade do ato administrativo e de transparência na Administração Pública (art. 37, caput), tornando efetivo o direito à informação expresso no art. 5º, XIV e XXXIII, da Carta Magna. Nesse contexto, explicam, materializa o disposto na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011).
“O cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravos viabiliza o aprofundamento de estudos acadêmicos a respeito da matéria, permite o acompanhamento e controle do cumprimento da legislação trabalhista no âmbito das cadeias produtivas na economia brasileira e serve como instrumento orientador para a formulação e implementação de políticas públicas e para o próprio exercício de responsabilidade social nas transações comerciais pelos cidadãos”, destacam, no memorial.
O PGR e o PGT argumentam que os agentes do mercado têm o direito de optar por não adquirir produtos maculados pela exploração ilegal do trabalho humano. Lembram que as restrições de crédito existentes não são estabelecidas nos enunciados das portarias impugnadas pela ADPF. Para eles, o cadastro revela-se instrumento adequado para que instituições financeiras afiram requisitos para concessão de crédito público e privado, assim como já o fazem quanto aos demais cadastros que tratam de questões de menor relevância, a exemplo das relações de devedores do SPC ou Serasa.
Os procuradores-gerais lembram que países consumidores de produtos brasileiros vêm manifestando preocupação em negociar com empresas sem governança eficiente ou boas políticas de transparência quanto à fabricação de seus produtos. “A lista em apreço, inclusive, foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das mais relevantes e salutares práticas para o enfrentamento da escravidão contemporânea no Brasil”, asseguram.
Aras e Balazeiro afirmam que a erradicação do trabalho escravo contemporâneo consiste em dever assumido pelo Estado brasileiro perante a ONU por meio de instrumentos normativos, a exemplo da Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948; a Convenção Suplementar sobre a Abolição da Escravatura, do Tráfico de Escravos e das Instituições e Práticas Análogas à Escravatura, de 1956; o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Sociais Econômicos e Culturais. É, também, meta estabelecida entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.
Eles concluem que a transparência quanto às autuações administrativas da Auditoria-Fiscal do Trabalho presta um grande favor ao ordenamento jurídico brasileiro, inclusive, às obrigações internacionais.
Via Secom/MPF
Foto: Leonardo Prado