Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

A Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Pernambuco (SRTE/PE) libertou 38 pessoas, entre elas um adolescente de 16 anos, que estavam submetidas a condição análoga à de escravos. Os trabalhadores colhiam cana no Engenho Liberdade, arrendado pela Usina Estreliana ao empregador Paulo Roberto Monte Barreto, localizado no município de Escada (PE). 25/03/2009, Repórter Brasil
Entre os trabalhadores estava um adolescente de 16 anos. Os cortadores estavam submetidos a uma jornada exaustiva de trabalho. O empregador não fornecia Equipamentos de Proteção Individual e realizava descontos irregulares nos salários dos cortadores

Por Bianca Pyl

Os cortadores iniciavam sua jornada de trabalho às 3 horas da manhã, quando preparavam o almoço. Os alimentos eram comprados de um barracão do próprio engenho e o valor das compras era descontado diretamente dos salários dos funcionários. O transporte também era precário: os trabalhadores iam para as frentes de trabalho em cima de carroças acopladas em tratores, sem a menor segurança. Diversos cortadores foram encontrados sem Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), como botas, luvas, perneiras, óculos e chapéus. E os trabalhadores que tinham EPIs - desgastados - tiveram que pagar por eles, sendo que a lei garante que sejam fornecidos gratuitamente.

O empregador não disponibilizava instalações sanitárias adequadas nas frentes de corte. "Observamos a existência de uma tenda com vaso sanitário improvisado, sem que estivesse, ao menos, firme ao solo. Não havia lavatório, nem sistema de descarga, muito menos sistema de destinação de dejetos. Nem o papel higiênico era fornecido", detalha Joselaine Vale, auditora fiscal da SRTE/PE.

Os cortadores também não tinham acesso à água potável e eram obrigados a consumir água imprópria e armazenada em garrafas de plástico, retirada de um rio que corta o terreno do engenho. Os trabalhadores não tinham onde armazenar corretamente a comida que traziam e nem como aquecê-la. "As refeições eram realizadas nos próprios locais de trabalho, a céu aberto, feitas às pressas em razão da dinâmica da produtividade", explica Joselaine. Nas frentes de trabalho havia apenas uma tenda com quatro assentos e uma mesa, quantidade insuficiente para os 38 trabalhadores realizarem suas refeições.

A jornada de trabalho se estendia até às 15 horas, quando os trabalhadores eram forçados a retornar a pé para o alojamento, já que o empregador não disponibilizava transporte para isso - a caminhada durava cerca de uma hora. Os alojamentos foram considerados pelos fiscais como "subumanos, sem condições de serem habitados": os cortadores se dividiam em grupos de até oito pessoas para dormirem nos abrigos improvisados pela empresa, feitos de madeira, com muitas frestas e telha de amianto. Havia risco de desabamento do teto.

Os trabalhadore não tinham acesso a água potável e utilizavam a água de um rio, que corta o terreno do engenho, onde inclusive deságuam os dejetos desses alojamentos improvisados. Os abrigos também não possuíam armários, obrigando os trabalhadores a deixarem utensílios de cozinha e alimentos no chão. Dormiam em colchões desgastados, dispostos no chão dos alojamentos sendo que nos dias de chuva, em decorrência dos alagamentos provocados por goteiras e aberturas no teto, os trabalhadores ficam impossibilitados de se deitar.

Alguns trabalhadores se acidentaram durante o corte, mas o empregador não emitiu a Comunicação de Acidente de Trabalho e nem pagou os dias que os cortadores tiveram que ficar parados por conta do acidente, mesmo com atestado médico.

O empregador não depositava o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Foram lavrados 46 autos de infração e interditadas as frentes e os alojamentos. Os trabalhadores receberam todas as verbas da rescisão do contrato de trabalho e tiveram as passagens de volta para casa custeadas pela empresa.

Os libertados foram trazidos de Juripiranga, na Paraíba, sem a Certidão Liberatória exigida pela legislação, e do município de Itambé (PE) pelo aliciador Marcelo dos Santos, em novembro de 2008. A ação, motivada pela denúncia de dois trabalhadores, aconteceu nos dias 10 e 11 de março e contou com a participação da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Usina Cucaú
A Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Pernambuco foi chamada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) para verificar a situação dos trabalhadores que estavam na usina Cucaú, em Rio Formoso (PE), aguardando o pagamento da rescisão do contrato de trabalho após terem sido emitidos. A ação aconteceu no dia 19 de março.

A Cucaú pertence ao Grupo EQM, também proprietário da Destilaria Araguaia, em Confresa (MT). Essa usina é sucessora da Destilaria Gameleira - palco da libertação de 1.003 trabalhadores escravos em 2005 e que figurou na "lista suja" do trabalho escravo.

No total foram 46 trabalhadores dispensados, sendo 17 safristas vindos de Alagoas e 29 efetivos, do município de Vicência (PE). Eles permaneceram no alojamento da usina sem alimentação ou transporte para voltar para casa. Segundo o auditor fiscal Moisés Lima, da SRTE/PE, o pagamento da rescisão do contrato de trabalho dos cortadores que haviam sido empregados para o período de safra já estava disponível, porém os trabalhadores preferiram esperar a presença do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para saber se os valores estavam corretos.

Já os trabalhadores contratados em caráter efetivo estavam sem receber o valor da rescisão. "Diante dos fiscais, no dia 19 mesmo, a empresa pagou as verbas rescisória de todos os trabalhadores, porém ainda precisa regularizar os depósitos do Fundo de Garantia pelo Tempo de Serviço (FGTS), que ficou acordado para o dia 15 de abril". A usina sofreu duas autuações e a fiscalização ainda não foi concluída.

Mais informações sobre problemas na Usina Estreliana, arrendatária do Engenho Liberdade, estão no relatório "O Brasil dos Agrocombustíveis - Cana", do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis da Reporter Brasil.

 

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