Com o tema: “Para além das cercas que nos cegam: as naturezas das r-existências no campo na América Latina”, o SINGA realizou sua nona edição. O simpósio aconteceu na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em Recife, nos dias 11 a 15 de novembro e contou com um total de dez mesas-redondas, 21 grupos de trabalho, trabalhos de campos, lançamento de livros, filmes, aula pública e 35 oficinas temáticas.
Em seus anos de existência, o Simpósio Internacional de Geografia Agrária se consolidou como um dos mais importantes espaços sobre o mundo rural na atualidade. Para que isso acontecesse foi preciso a tomada de algumas decisões, sendo uma das mais importantes o reconhecimento do papel de protagonista para as comunidades tradicionais, camponesas e movimentos sociais. Isso explica a grande quantidade de indígenas, quilombolas, povo cigano e mais uma diversidade de sujeitos que convivem com a terra partilhando espaço no SINGA com estudantes e professores universitários. Esse arranjo permite que a realidade agrária, suas dinâmicas e conflitos, seja entendida a partir da fala dos sujeitos que ali se territorializam, é o momento em que a academia não narra, mas escuta.
Nesse processo de narrativa e escuta, foram trazidos os principais desafios do espaço agrário, como a ainda persistente concentração da terra; os projetos de desenvolvimento que continuam a expulsar comunidades; os limites e erros dos governos progressistas em sua relação com as comunidades tradicionais; a natureza mercantilizada, expropriada e servindo como geração de lucro; o papel do Estado como serviçal do capital; a afronta às espiritualidades ancestrais; o racismo, o patriarcalismo e etc. Para Vanúbia, da Comissão Pastoral da Terra da Paraíba, o encontro trouxe “uma provocação bem pertinente para o momento atual, a de que para além das cercas que nos cegam" existe a resistência dos povos e comunidades camponesas. As cercas são várias, apontadas nas mesas de debate e nos GTs, percebermos as estratégias do poder econômico, tendo o Estado como aliado principal para o avanço sobre os territórios camponeses. Vimos que mudam os territórios, os biomas, povos, e nações, porém as cercas são, quase sempre, as mesmas: soja, eucalipto, mineração, energia eólica, gado, cana. Elas vão desmatando, envenenando as terras e as águas, tornando impossível a vida nos territórios”.
O encontro aconteceu em meio a uma grande ebulição política, avanço do fascismo e projetos ultra-neoliberais, golpes de Estado, como na Bolívia, e movimentos de resistência e libertação, como no Chile. À eles foram feitas menções durante todo o simpósio, inclusive por estarem presentes delegações do Chile, Colômbia, México, Venezuela, Equador e outros países. As resistências e experiências locais, que partem das comunidades e territórios, tiveram também grande repercussão. Para Simara, da Comissão Pastoral da Terra do Maranhão, “está em solo pernambucano, nordestino, latino americano, tem um sentindo muito forte, pois as resistências às cercas e ameaças aos territórios e aos territórios corpos também tem encontrado formas de romper e superar todas elas”.
O SINGA deixou a impressão que os povos da terra continuam a romper as cercas por eles não inventadas, e que por mais de cinco séculos tem servido ao capitalismo e ao Estado como instrumento de opressão. Para além das cercas tradicionais, que transformam a terra sagrada em dinheiro, as re-existências cotidianas são contra o cercamento das águas, contra as cercas do saber, contra a privatização de todas as formas e expressões de vida. Dom Pedro Casaldáliga já tem dito, “Malditas sejam todas as cercas! Malditas todas as propriedades privadas que nos privam de viver e de amar!.