Para o deputado federal Zenaldo Coutinho, autor do requerimento para a audiência no Conselho de Direitos Humanos, o objetivo era ouvir os bispos e o procurador geral da república do Pará sobre os caminhos institucionais para a punição aos crimes denunciados. O presidente do Conselho, Percílio de Sousa Lima Neto, deliberou que uma Comissão visitará autoridades do Pará nos dias 19 e 20 de maio e que as propostas dos bispos serão consideradas pela entidade. Os bispos cobram, entre outras coisas, maior presença do Estado para coibir a violência, apuração rigorosa para saber de onde vêm as ameaças às lideranças, punição exemplar para os criminosos e segurança para os ameaçados. “Somos mais de 300 pessoas ameaçadas de morte no Pará. Apenas cem têm proteção”, afirma dom Azcona. “Isso indica que sociedade está doente, moribunda e a cidadania não existe”. Ele afirmou que chegam a divulgar o preço pela cabeça de lideranças. “Isso é uma apologia ao crime. É um grito à consciência dos senhores deputados e senadores”, disse ao pedir que os parlamentares busquem solução para a violência no Pará. Os religiosos denunciam a exploração sexual de crianças e adolescentes e o tráfico de mulheres, além da falta de um plano de desenvolvimento para a região que ouça a população local. Para o representante do Ministério Publico Federal do Pará, Felício de Araújo Pontes Júnior, o conflito na região é conseqüência da tensão entre os dois modelos de desenvolvimentos. “Um modelo é predatório, que é o modo tradicional de cultura da terra: agricultura, pecuária, monocultura, e o modelo sócio-ambiental de desenvolvimento”, explica. De acordo com Pontes, por causa disso, há uma explosão demográfica sem possibilidade de planejamento. A presidente da Comissão para a Amazônia, Janete Capiberibe, afirmou que a audiência pública não ficará sem resultados. “Vamos fazer um relatório desta audiência e levar ao presidente Lula para que ele conheça melhor a realidade apresentada pelos bispos”, disse. “Além disso, vamos pedir a ele que constitua uma força-tarefa para buscar as soluções”, afirmou. Dom Azcona reafirmou que em Marajó há uma rede de prostituição infantil e tráfico humano “com a conivência das autoridades”. “Há a ‘cultura do estupro’ e uma rede de exploração sexual com trafico de mulheres para Guiana Francesa já denunciado pela imprensa em 2006”, disse o bispo. Ele lembrou também o caso da malária em Anajás, um município com 24 mil habitantes. Segundo afirmou, a cidade é “um hospital a céu aberto”. “Em 2007 houve 10 mil casos de malária em Anajás. O nível tolerável é de 50 casos para cada mil pessoas. Em Anajás o nível é de 800”, observou. “Há investimento, mas não se resolve o problema. Isso é incompetência ou corrupção”. Dom Flávio O bispo de Abaetetuba, dom Flavio Giovenale, avaliou a reunião como uma iniciativa importante porque divulga o problema da região. Para ele, a busca de soluções não é tão simples e “seria ingenuidade pensar que se resolve de repente”. Ele reconhece que há preocupação das autoridades em dar proteção aos bispos, “mas isso é difícil pelo nosso estilo de vida”. Dom Flávio também denunciou exploração sexual de crianças e adolescentes em Abaetetuba e, por isso, vem recebendo ameaças de morte. Tanto no CDDPH quanto na Comissão da Amazônia, dom Flávio expôs a realidade de Abaetetuba, reafirmando a necessidade de ação em duas direções: na repressão ao crime e na prevenção. Segundo afirmou, o maior problema na região é a droga. “Abaetetuba já foi chamada a Medellin do Brasil. O Estado precisa estar presente”, cobrou. Dom Flávio lembra o sucateamento da estrutura das polícias civil e militar e reivindica a construção da delegacia e do quartel para a cidade, além de um posto da Policia Federal. “A Policia Federal é nosso sonho, é uma questão de vida ou de morte”. O bispo reivindica também melhorias na educação como forma de combater a violência e apresentou dados que comprovam o alto índice de evasão escolar na região. Ao mesmo tempo, cobrou da universidade instalada na cidade cursos adequados à realidade local. “A Universidade Federal do Pará em Abaetetuba foi uma bênção, mas os cursos que oferece não atendem à necessidade local”, observou. Além disso, ele solicita a instalação do CEFETE prometido para a cidade mas que ainda não está funcionando. Dom Erwin Há quase dois anos com proteção policial, o bispo do Xingu, dom Erwin Kräutler, fala do desconforto de ter que andar acompanhado por três policias 24h por dia. “Perdi a liberdade de ir e vir e de exercer a missão que tenho como bispo, embora cumpra todos os meus compromissos”, explica dom Erwin. A presença de seis policiais que se revezam em dois turnos foi uma exigência da secretaria de segurança. “A Secretaria de Segurança me disse: ‘não fique indisciplinado porque a situação é gravíssima’”, disse o bispo. Segundo dom Erwin, a morte da Irmã. Dorothy em fevereiro de 2005 foi o ponto de partida para as ameaças. “Como bispo, não podia me calar diante da morte da Irmã Dorothy e comecei a exigir a punição para o assassino e o mandante do crime”, explica. Para ele, “há um consórcio do crime” na região. “Sinto que estamos num terrorismo psicológico. Mas, não vou embora de Altamira”, avisou. “Não sou revolucionário, sou contra a ganância de certos segmentos da sociedade”, disse dom Erwin ao explicar as críticas que faz ao projeto de desenvolvimento para a Amazônia. “A hidrelétrica Belo Monte é projeto de cima para baixo. Não recebemos informações a que temos direito. Afirmam ser uma unidade, mas acreditamos que seja complexo”, esclarece. Outra denúncia feita pelo bispo é o abuso sexual de adolescentes, mas até agora “não aconteceu nada”. Acompanhando os bispos, o vice-presidente da CNBB, dom Luís Soares Vieira, ratificou o apoio da entidade aos bispos e fez coro às denúncias apresentadas. “A Amazônia ainda é considerada periferia do Brasil. Se essas ameaças acontecem com os bispos, vocês podem imaginar o que está acontecendo com nosso povo”, ponderou. Dom Luiz concorda que “há um vazio do Estado” para erradicar a violência na Amazônia e se disse esperançoso com a audiência. “Espero que a audiência desperte o Congresso e o Brasil para uma ação concreta que diminua a violência contra os pobres e excluídos. Fonte: cnbb.org.br quarta: 07 de maio de 2008 |
Bispos ameaçados confirmam denúncias de violação de direitos humanos no Pará
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Os três bispos ameaçados de morte no Pará estiveram em Brasília nesta terça-feira, 6, e confirmaram as denúncias de violação dos direitos humanos na região. Dom José Luiz Azcona, da Prelazia do Marajó; dom Flávio Giovenale, da Prelazia de Abaetetuba, e dom Erwin Kräutler, da Prelazia do Xingu, foram, pela manhã, ao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) e, à tarde, participaram de uma audiência pública proposta pela Comissão da Amazônia da Câmara dos Deputados. Esteve, ainda, presente o pároco de Anapu, padre José Amaro Lopes de Souza, que também é ameaçado.