Pesquisa realizada pela Vigilância Sanitária do Estado, entre janeiro de 2003 e março de 2006, detectou em nove alimentos comercializados em Pernambuco, entre frutas, verduras e legumes, concentrações de agrotóxicos acima do limite máximo permitido e a presença de pesticidas de uso não autorizado no Brasil. Segundo o gerente da Vigilância, Jaime Brito, 25% das amostras analisadas de pimentão, morango, tomate, couve-flor, mamão, alface, maçã, repolho e cebola apresentaram problemas. Ao todo, foram avaliadas 319 amostras e, dessas, 80 estavam irregulares.
Os produtos, analisados pelo Laboratório de Toxicologia do Instituto de Tecnologia de Pernambuco (Labtox/Itep), foram coletados em sete supermercados, por meio do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). “A situação é preocupante. Encontramos resíduos de agrotóxicos com concentrações que variam de duas a 77 vezes acima do limite estabelecido pelo Ministério da Saúde”, alerta Jaime Brito, acrescentando que já foi detectada em uma mesma amostra de morango a utilização de até dez tipos de veneno, quatro deles não autorizados para o cultivo dessa fruta. “Quando, em análises realizadas em 2002, verificamos a gravidade da situação chamamos o Ministério Público Estadual, que firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com os supermercados, obrigando-os, a partir de 2003, a realizar regularmente, com distribuidores e produtores, a análise dos produtos”.
“Quando detectada qualquer irregularidade em algum dos alimentos analisados, o supermercado tem que suspender imediatamente a comercialização do produto”, explica Ivana Botelho, promotora de Defesa da Saúde do Ministério Público Estadual, que vem acompanhando o programa, na Promotoria de Defesa do Consumidor. De acordo com a Vigilância Sanitária, nos últimos três anos, foram suspensos contratos com 62 produtores, que só voltaram a fornecer os alimentos após a regularização.
O diretor da Vigilância conta que chegou a ser surpreendido ao coletar amostras de mamão de um produtor da Paraíba. Além de fornecer para vários Estados do Brasil, ele também distribui para o exterior. “Todas as amostras que iam para fora do País estavam satisfatórias. Já as que seriam vendidas aqui apresentaram sérios problemas, como a presença de um veneno chamado Dicofol, um organoclorado altamente tóxico não autorizado para esse tipo de cultura.” Brito explica que o cuidado com os alimentos exportados acontece porque a comunidade internacional tem parâmetros rigorosos de importação e no Brasil o controle quase não existe, sendo essa experiência do programa desenvolvido pela Vigilância praticamente a única iniciativa de monitoramento de resíduos de agrotóxicos em alimentos comercializados no País. Atualmente, 17 Estados participam do programa.
RISCOS – A produtora Cultural Melina Hickson foi uma das vítimas do uso indiscrimidado de defensivos agrícolas em alimentos. Após consumir morangos comprados na rua, a produtora teve uma intoxicação e passou um mês em tratamento. “Eu fiquei com o corpo todo vermelho e cheio de carocinhos. O médico disse que eu estava quase envenenada.” Segundo o oncologista Jaime Queiroz, a ingestão de agrotóxicos pode causar desde intoxicações a insuficiências renais e hepáticas, problemas cardíacos e até mesmo o desenvolvimento de vários tipos de câncer.
Para Vigilância, a falta de uma fiscalização mais efetiva do poder público é uma das principais causas da utilização indiscriminada dos pesticidas. A chefe da Unidade Estadual de Inspeção Vegetal da Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco (Adagro), Kalua Matos, afirma que, entre janeiro de 2004 e maio de 2006, foram fiscalizados 386 estabelecimentos, entre casas agropecuárias, agroindústrias, propriedades rurais, transportadoras e depósitos de agrotóxicos. Nesse período, foram apreendidos 309 litros de produtos irregulares. “O maior problema que encontramos é a venda de agrotóxicos sem o receituário agronômico, o que causa o uso inadequado dos produtos“, ressalta Matos.
O Brasil é o terceiro maior consumidor de agrotóxicos no mundo. Existem, hoje, 20 grandes indústrias produtoras do veneno, movimentando US$ 20 bilhões por ano. Dessas, oito ficam no Brasil, fazendo circular US$ 2,5 bilhões anualmente. Só no País são produzidas 250 mil toneladas por ano de herbicidas, inseticidas e fungicidas. Os agrotóxicos são utilizados para controle de pragas na agricultura, além de ser utilizados na pecuária, armazenamento de alimentos, campanhas sanitárias e dedetizações domésticas.
ANÁLISE II
Estado já tem 20 feiras agroecológicas Publicado em 09.07.2006
Para fugir dos alimentos cultivados com agrotóxicos, muita gente está recorrendo às feirinhas agroecológicas que se espalharam por todo o Estado. Atualmente, é possível comprar frutas, verduras e hortaliças produzidas naturalmente, sem o uso de venenos, em 20 municípios pernambucanos, do litoral ao Sertão.
O aposentado José da Cunha, que frequenta o Espaço Agroecológico, no bairro das Graças, no Recife, há mais de três anos, conta que prefere os alimentos orgânicos porque acredita que a utilização de pesticidas nos produtos alimentícios causa prejuízos a qualquer pessoa. “É claro que um veneno, por mais que seja usado em pequena quantidade, faz mal à saúde.”
O agricultor Biu Sanfoneiro, 58 anos, do município de Bom Jardim, comercializa seus produtos há seis anos na feira orgânica das Graças. “Comecei a trabalhar na terra com dez anos, utilizando venenos e queimadas. Em 2000, conheci a agroecologia e desde então não uso nenhum tipo de agrotóxico. Produzo quase 30 tipos de frutas, verduras e cereais e estou ganhando até dez vezes mais do que quando eu trabalhava para os outros”.
Para o agricultor Jones Severino Pereira, as pragas acontecem por causa do desequilíbrio ecológico. “Em vez de atuar na causa do problema, as pessoas utilizam venenos para tentar resolver. O que precisamos é compreender os sinais da natureza e respeitá-la”, alerta Pereira, que há 12 anos trabalha com a agroecologia e vende seus produtos na feirinha das Graças.
ANÁLISE III
Ceasa abre posto, mas não faz análise Publicado em 09.07.2006
Em setembro de 2005, um Posto de Monitoramento de Resíduos de Agrotóxicos foi inaugurado no Centro de Abastecimento Alimentar de Pernambuco (Ceasa). No entanto, até agora, a Secretaria de Produção Rural e Reforma Agrária do Estado não está realizando as análises dos produtos.
A chefe da Unidade Estadual de Inspeção Vegetal da Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco (Adagro), Kalua Matos, explica que o monitoramento não está sendo feito por causa do alto custo da análise, que é de R$ 785, por cada amostra. A análise é realizada pelo Laboratório de Toxicologia do Instituto de Tecnologia de Pernambuco (Labtox/Itep).
“Precisamos expandir esse monitoramento o quanto antes aos alimentos comercializados no Ceasa, que é responsável por mais de 60% dos produtos hortifrutícolas consumidos no Grande Recife”, ressalta Geraldo Mendonça, promotor de Defesa do Consumidor do Ministério Público de Pernambuco (MPPE).
Para viabilizar a realização das análises, o MPPE vai firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Adagro, o Ceasa, o Sindicato de Hortifrutigranjeiros de Pernambuco (Sindfrutas) e a Associação dos Usuários e Comerciantes do Ceasa Recife (Assucere). O presidente do Sindfrutas, Alex Costa, diz que as instituições estão apenas aguardando que o MPPE convoque os envolvidos para assinar o termo. ”Decidimos ratear os custos das análises, cobrando uma taxa de R$ 1 a cada veículo de hortifrutigranjeiros que entrar no Ceasa”.
Fonte: Jornal do Commercio – PE
Publicado em 09.07.2006