Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Desde 2010, nº de assistidos do Provita caiu de 1.048 para aproximadamente 500 pessoas, apesar da maior procura por auxílio. Mulheres ameaçadas em Rondônia defendem a entrega de casas construídas para trabalhadores pelo consórcio Energia Sustentável do Brasil. A rede federal de proteção de pessoas ameaçadas de morte chega aos 18 anos sem fôlego para acompanhar o ritmo de aumento da violência. Com verba prevista de R$ 11,7 milhões, o Programa de Proteção de Vítimas e Testemunhas (Provita) executará no máximo R$ 2,6 milhões até o fim do mês, conforme dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos.

 (Por Leonencio Nossa e Fabio Serapião, O Estado de S.Paulo | Imagem: Joka Madruga)

De 2010 para cá, o número de assistidos do Provita caiu de 1.048 para aproximadamente 500 pessoas. Criado em 1999 pelo então secretário de Direitos Humanos, José Gregori, para proteger testemunhas que colaborassem inicialmente em inquéritos de narcotráfico, o programa tem demanda cada vez maior. Só nos primeiros seis meses de 2017, 43 pessoas foram assassinadas em conflitos agrários, setor com mais casos de necessidade de proteção hoje. É a maior taxa de mortos no mesmo período em sete anos.

O sistema federal conta com programas lançados mais recentes, como o de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), de 2016, que atende 356 pessoas e tem uma fila de 130 à espera de vagas, e o de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM), de 2003, que assiste 431 menores e 750 famílias, também com problema de falta de recursos. “A precarização das políticas de proteção se dá em um momento de acirramento da violência, especialmente nos conflitos rurais”, avalia Sandra Carvalho, da organização Justiça Global. “Há um desmonte do sistema de proteção.”

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A ex-presidente Dilma Rousseff assinou, em abril de 2016, o Decreto 8.724, que surpreendeu ativistas ao afastar as entidades não governamentais da coordenação dos programas e os transformou, segundo eles, em caixa-preta. A Secretaria Especial de Direitos Humanos se comprometeu a reavaliar a questão.

Não há estimativas do governo ou de ONGs sobre o número de pessoas que necessitam de proteção federal hoje. Há apenas indicativos parciais de ameaçados. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) listou 200 casos de agressões e ameaças no ano passado no campo. O ranking dos ameaçados é liderado pelo Maranhão (72 casos) e traz sem-terra, quilombolas, advogados, religiosos e índios que têm a cabeça a prêmio nos grotões e periferias especialmente no Norte e no Nordeste.

Paulo César Moreira, da coordenação nacional da CPT, observa que das 1.848 pessoas da lista de ameaçados no campo nos últimos dez anos, 302 foram alvo de mais de uma agressão. Nesse período, a CPT registrou 405 assassinatos. “A tendência é que a situação dos ameaçados se agrave ainda mais, com os conflitos no campo”, afirma. Paulo César avalia que a impunidade está por trás das ameaças.

Entre os que esperam ser atendidos está a ativista Iza Cristina Bello, a Índia, de 28 anos, liderança comunitária de Nova Mutum Paraná, um distrito formado por peões e ribeirinhos no rastro das obras das usinas hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau, em Porto Velho. Era alvo de agentes policiais e grupos de milícias e hoje vive escondida em uma casa alugada na periferia de Porto Velho, com três filhos menores, uma irmã com esquizofrenia e o marido, que teve de abandonar o emprego.

Recursos

Ao Estado, a Secretaria Especial de Direitos Humanos admitiu, por nota, que o gasto neste ano com o Provita será menor que em todo o ano passado, quando o sistema de proteção recebeu um total de R$ 14,2 milhões, incluindo recursos federais e contrapartidas dos Estados participantes. 

Já o programa voltado a menores tem orçamento previsto de R$ 10 milhões em 2017. A pasta não informa o porcentual executado até agora. Também não divulga o total de pagamentos feitos do programa de defensores, com previsão orçamentária anual de R$ 4,5 milhões.

O órgão rejeita a versão de que há déficit de vagas na rede de proteção e cita um teto de 646 vagas. A secretaria associa a redução de vagas e recursos a demandas de outros órgãos. 

“O quantitativo de pessoas protegidas pode variar tendo em vista que a permanência das pessoas é voluntária”, destaca o governo em nota. “Tendo em vista que não trabalha com busca ativa, o programa depende do fluxo de solicitações por Ministérios Públicos, autoridades judiciárias e policiais e organizações da sociedade civil”, completa. “Por se tratar de uma política pública realizada de forma federativa, é necessário que haja a parceria dos Estados e isso pode causar oscilações no orçamento.”

O drama das mulheres de Nova Mutum Paraná

Um relatório do Conselho Nacional de Direitos Humanos, escrito em julho de 2016, pediu ao governo federal a inclusão “imediata” da ativista Iza Cristina Bello, a Índia, de 28 anos, liderança comunitária de Nova Mutum Paraná, um distrito formado por peões e ribeirinhos no rastro das obras das usinas hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau, em Porto Velho. O documento obtido pelo Estado destaca que Índia era alvo de agentes policiais e grupos de milícias. “A Secretaria de Direitos Humanos, em Brasília, nunca me telefonou para perguntar se estava tudo bem”, afirma a ativista.

Da esquerda para direita está a representante de Djanira Krenak, seguida por Ludma e Índia, após receberem a Homenagem Maria do Espírito Santo Silva

pela valorização das defensoras de direitos humanos, promovida pela Justiça Global. Crédito: Raoni N. Dias/ Justiça Global

Hoje, ela vive escondida em uma casa alugada na periferia de Porto Velho, a 106 quilômetros de distância da área de conflito, com três filhos menores, uma irmã com esquizofrenia e o marido, que teve de abandonar o emprego. Índia ainda recebe telefonemas de ameaças. Outra liderança da comunidade citada no relatório do conselho, Lurdilane Gomes da Silva, a Ludma, de 39 anos, também teve de abandonar sua casa e fugir com a família. Ela passou recentemente por uma cirurgia de retirada de um tumor no cérebro.

O ativista João Marcos Dutra, do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), em Rondônia, relata que a entidade apresentou, no começo de 2016, os pedidos de inclusão de Índia e Ludma no programa dos defensores, anexando relatórios com gravações de vídeos e áudios. “A gente estranha a demora na análise, pois os pedidos estão bem fundamentados”, afirma.

As mulheres ameaçadas em Rondônia defendem a entrega a famílias de desempregados nas obras das usinas e ribeirinhas de casas construídas para trabalhadores pelo consórcio Energia Sustentável do Brasil (ESBR), que toca os empreendimentos. Também pedem investimentos das autoridades para geração de renda de famílias de pescadores atingidos pelas represas, que ficaram sem trabalho. Em janeiro de 2016, a líder comunitária Nilce de Souza Guimarães, a Nicinha, colega de Índia e Ludma, teve as mãos e os pés amarrados a uma pedra e o corpo lançado no lago de Jirau.

A lista de ameaçados em Rondônia é formada ainda por testemunhas de crimes agrários e lideranças rurais. No ano passado, 21 pessoas foram assassinadas em disputas por terra no Estado. Atualmente, Rondônia tem 156 conflitos no campo em plena erupção. Milícias, agentes das Polícias Civil e Militar e jagunços estão em terras devolutas disputadas por camponeses e fazendeiros e nos povoados que brotaram do dia para a noite com as obras das hidrelétricas.

 

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