A Comissão Paramentar de Inquérito (CPI) instalada na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul para investigar a atuação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no estado está suspensa por decisão liminar da Justiça Federal.
(Fonte: Cimi)
Os trabalhos da chamada CPI do Cimi deveriam recomeçar nesta terça-feira, dia 2, mas conforme o juiz da 2ª Vara Federal de Campo Grande Pedro Pereira dos Santos não há conflito federativo no escopo das apurações da comissão. Desse modo, a CPI do Cimi extrapola as atribuições do Poder Legislativo sul-mato-grossense para o que é de competência Federal.
A decisão liminar é o resultado de uma Ação Civil Pública impetrada pelo defensor público da União Danilo Dias Vasconcelos, ligado ao Núcleo de Direitos Humanos e Tutela Coletiva da Defensoria Pública da União (DPU) de Campo Grande. Uma das funções da DPU é atuar em favor dos indígenas, que como afirma o juiz da 2ª Vara Federal são “hipossuficientes”.
A CPI do Cimi investigou, durante quase quatro meses, supostos financiamentos e incitações da entidade a retomadas indígenas de terras tradicionais. De acordo com o despacho do juiz, os beneficiados por esses aportes econômicos seriam os próprios indígenas – e as questões fundiárias que os envolvem são de competência Federal. O juiz trouxe ainda em seus argumentos decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a inexistência de conflito federativo em disputas fundiárias envolvendo interesses territoriais de povos indígenas, o que enfatiza a falta de correção na instalação da CPI.
Mesmo que a Assembleia Legislativa tenha legitimidade constitucional para abrir comissões parlamentares de inquérito, é incompetente naquilo que pretende fiscalizar com a CPI do Cimi. “Os financiamentos e incitamentos que animaram os ilustres deputados a instalar a CPI não fazem parte de um contexto do qual só o Cimi participa. Nele devem ser inseridos os beneficiários dessas ações, ou seja, os indígenas, os quais, depois da obtenção da posse dos imóveis têm recebido o apoio de órgãos federais para que ali permaneçam, sempre com fundamento nos referidos arts. 20, XI, e 231, 2º, da CF, o que também reforça o interesse federal (SIC)”, discorre o juiz na decisão liminar.
Informado pelo Ministério público Federal (MPF), o juiz mencionou uma recente investigação da Polícia Federal contra o Cimi, tendo como foco a participação da entidade em “invasões indígenas”, reiterando os argumentos de que se trata de temática enxuta ao ambiente Federal. O juiz também citou o fato de que as retomadas indígenas ocorrem, via de regra, em terras já incorporadas aos trâmites normativos constitucionais que garantem o direito ao território tradicional a estas populações, caso dos procedimentos demarcatórios.
Na decisão liminar, o juiz ainda rechaçou o argumento de que a CPI do Cimi teria procedência justificada no que concerne à segurança pública do estado. “Por força do art. 144, IV, da Constituição cabe à Polícia Federal exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária da União (...) O fato de a Polícia Militar ter sido requisitada pela Justiça Federal para auxiliar a Polícia Federal e/ou a Força Nacional nas reintegrações deferidas pela Justiça Federal decorre simplesmente da estrutura no tocante ao quantitativo de pessoal (SIC)”, diz trecho da liminar.
Pré-candidata atrás de holofotes
Cabe agravo da Presidência da Assembleia Legislativa à decisão liminar no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). Conforme apurações realizadas junto a assessores parlamentares, a presidente da suspensa CPI do Cimi, a deputada ruralista Mara Caseiro (PMB), deverá pressionar o gabinete Presidência da casa para que entre com o agravo. Caseiro é pré-candidata à Prefeitura de Campo Grande pelo Partido da Mulher Brasileira (PMB) e sessões semanais da CPI transmitidas pela televisão e internet, além da cobertura de imprensa, garantiriam mais exposição pública à parlamentar.
Outros deputados ruralistas, porém, desde o ano passado avaliam que o melhor seria encerrar a CPI. Não é certo o consenso no interior da bancada. A avaliação é de que a comissão gerou distúrbios no cotidiano da Assembleia Legislativa, cada vez mais exposta a desgastes públicos. Depois do início da campanha de boicote ao agronegócio sul-mato-grossense, outras vozes ruralistas se somaram a essa corrente de opinião. Integrantes da Federação de Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (Famasul) chegaram a pedir que Caseiro encerrasse a CPI.
O elevado número de convocações para depoimentos, que arrastaria mais a CPI, com prorrogação já anunciada por Caseiro, também passou a ser alvo de críticas – para esse ano, perto de 50 depoentes ainda seriam inquiridos.
Por outro lado, povos indígenas ocuparam a Assembleia Legislativa em protestos quase semanais. Em outras mobilizações, tumultos terminaram em agressão física contra manifestantes, rendendo possíveis processos judiciais contra a Casa. Em certa ocasião, o relator da CPI do Cimi, o deputado ruralista Paulo Corrêa (PR), perdeu a compostura e partiu aos berros contra apoiadores dos povos indígenas presentes na Assembleia.
No caso da CPI do Genocídio, por enquanto, não há decisão contrária ao seu andamento e na próxima quinta-feira, dia 4, está confirmada a retomada dos trabalhos.