No Maranhão, liderança rural foi encontrada morta na véspera de Natal. Antônio Isídio estava desaparecido e vinha sendo ameaçado de morte. Já em Rondônia, no Vale do Jamari, um jovem acampado foi encontrado morto, em uma fazenda, na véspera do Ano Novo. E no penúltimo dia do ano, em uma rodoviária de Santa Catarina, uma criança indígena de dois anos morreu após ser degolada por um homem.
(Com informações da Anistia Internacional, Cimi e LCP)
Na véspera de Natal, Antônio Isídio Pereira da Silva, liderança rural da comunidade de Vergel, no Maranhão, foi encontrado morto. Ele estava desaparecido desde o dia 20 de dezembro de 2015. Antônio era uma das lideranças que vinha denunciando, nos últimos anos, a ação de madeireiros e grileiros na região. Com isso, sofria ameaças de morte e intimidações.
Um dia antes de desaparecer, Antônio havia dito, segundo Anistia Internacional, que iria denunciar o forte desmatamento na área. “Vergel, localizado a 50 quilômetros de Codó, no Maranhão, é uma comunidade de pequenos agricultores e produtores rurais que enfrentam a pressão constante de ‘grileiros’ e madeireiros que querem expulsá-los de suas terras”, destaca a Anistia Internacional no Brasil, que, juntamente com a Comissão Pastoral da Terra no Maranhão (CPT-MA), acompanha o caso.
“O assassinato de Antônio Isídio é revoltante. Foi uma tragédia anunciada. Nos últimos três anos denunciamos diversas vezes as ameaças sofridas por ele e a violência decorrente de conflitos agrários na região de Codó. E as autoridades – em todos os níveis – não tomaram nenhuma medida para garantir a segurança dessas pessoas”, afirmou Atila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil.
Rondônia
O camponês Lucas da Costa Silva, de 23 anos, foi morto com um tiro na cabeça nas últimas horas de 2015. A polícia encontrou Lucas morto na fazenda Fluminense, município de Monte Negro, no Vale do Jamari, no dia 2 de janeiro, conforme Nota intitulada “Morte anunciada – mais um camponês assassinado no Vale do Jamari”, divulgada pela Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia e Amazônia Ocidental (LCP). Ele foi enterrado no município de Buritis, em Rondônia, onde moram seus pais.
De acordo com o documento, Lucas da Costa era membro do Acampamento Luiz Carlos, organizado para lutar pelas terras da fazenda Fluminense, na linha 25, Gleba Rio Alto, em Monte Negro. “São terras públicas cortadas pelo INCRA, há mais de 20 anos, em lotes pequenos, destinados à reforma agrária, mas que nunca foram entregues a camponeses, foram grilados por fazendeiros e latifundiários, como Jair Miotto, ex-deputado estadual e ex-prefeito de Monte Negro”, denuncia Nota da LCP, que afirma suspeitar que o crime tenha sido encomendado pelo latifundiário.
“Esta é mais uma morte anunciada”, ressalta a Liga. Segundo a organização, no dia 14 de dezembro, em Porto Velho, a LCP, a Comissão de Direitos Humanos da OAB e o Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos (Cebraspo) organizaram uma Audiência Pública, com o apoio da Universidade Federal de Rondônia (Unir), “onde camponeses de várias áreas e acampamentos de todo o estado denunciaram a violência do latifúndio, especialmente na região do Vale do Jamari: despejos, torturas, desaparecimentos e assassinatos”.
Criança indígena
Na rodoviária de Imbituba, município de Santa Catarina, o pequeno indígena do povo Kaingang, Vítor Pinto, de dois anos, estava sendo amamentado pela mãe, Sônia da Silva, quando um homem se aproximou, acariciou o rosto da criança e, com um estilete, o degolou. Enquanto a mãe e o pai, Arcelino Pinto, desesperados, tentavam socorrer a criança, o assassino saiu caminhando pela rodoviária. O crime aconteceu no dia 30 de dezembro.
“Trata-se de um crime brutal, um ato covarde, praticado contra uma criança indefesa, que denota a desumanidade e o ódio contra outro ser humano. Um tipo de crime que se sustenta no desejo de banir e exterminar os povos indígenas”, destacou, em Nota, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
A família do menino é originária da Aldeia Kondá, localizada no município de Chapecó, Oeste de Santa Catarina. “Vítor faleceu em um local que a família Kaingang imaginava ser seguro. As rodoviárias são espaços frequentemente escolhidos pelos Kaingang para descansar, quando estes se deslocam das aldeias para buscar locais de comercialização de seus produtos”, explica o Cimi.
Após o crime, segundo a Nota, a Polícia Militar da região deu por desvendado o fato em poucos minutos. “Prendeu, num bairro pobre, um presidiário que usufruía do benefício do indulto de Natal e Ano Novo. Aparentemente tudo estava solucionado”. Todavia, ainda conforme o documento, a Polícia Civil de Imbituba ouviu o pai e a mãe de Vítor, e ainda outra testemunha, um taxista que estava no local na hora do crime. Mas o homem indicado pela PM como autor do assassinato não foi reconhecido pelas testemunhas.
De acordo com a Nota do Cimi, informações colhidas por um advogado que acompanhou a família Kaingang, na delegacia onde o caso é investigado, apontam que “esse assassinato pode estar relacionado a ações de grupos neonazistas ou de outras correntes segregacionistas, que difundem o ódio e protagonizam a violência contra índios, negros, pobres, homossexuais e mulheres”.
“O Conselho Indigenista Missionário manifesta preocupação com o clima de intolerância que se propaga, na região sul do país, contra os povos indígenas. Um racismo – às vezes velado, às vezes explícito – é difundido através de meios de comunicação de massa e em redes sociais. Ocorrem, com certa frequência, manifestações públicas de parlamentares ligados ao latifúndio e ao agronegócio contrários aos direitos dos povos indígenas e que incitam a população contra estes povos”, frisa o Cimi, em Nota divulgada no dia 31 de dezembro.