Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Na 7ª Reunião das Partes sobre o Protocolo de Cartagena de Biossegurança – MOP7 – o principal momento de debate internacional entre nações sobre Organismos Vivos Modificados (OVMs) –, a disputa entre os interesses comerciais e a defesa de mecanismos de proteção tomou a cena. Durante o evento, realizado entre 29 de setembro e 3 de outubro, na Coréia do Sul, as negociações tiveram forte pressão de empresas transnacionais de países que não fazem parte do Protocolo, interessados em facilitar a exportação de transgênicos e evitar avanços em pesquisas que possam explicitar problemas socioeconômicos de decorrência os OVM. A 12ª Conferência das Partes sobre Convenção da Diversidade Biológica – COP12 começou em seguida à MOP e vai até o dia 18 de outubro.


A posição do governo brasileiro na MOP teve como tônica a tentativa de desarticular os eventuais avanços relacionados à biossegurança nas aprovações comerciais de OVM. Somado à pressão das empresas transnacionais que monopolizam o mercado de transgênicos e outros Organismos Vivos Modificados no país, os Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) também adotaram posturas pró-mercado, em detrimento dos impactos socioeconômicos, à biodiversidade, à saúde causados por transgênicos . Países que não assinam o Protocolo de Cartagena, como Estados Unidos da América, Argentina, Canadá e Austrália, buscaram influenciar a posição dos demais países em convergência com a do governo brasileiro.


Apesar da queda de braço nas negociações, o placar permaneceu empatado, sem retrocessos em decisões já referendas em MOPs anteriores. Exemplo disto é deliberação pela continuidade do Grupo de Experts (AHTEG) formado para elaborar um guia de avaliação que possa ser seguramente utilizado por todos os países que optarem por consumir e/ou cultivar OGMs após uma avaliação sobre os impactos à biodiversidade causados pela liberação comercial de transgênicos. A manutenção do grupo fortalece a tentativa de estabelecer os requisitos mínimos de avaliação e gestão de riscos para que países em desenvolvimentos possam ter algum instrumento frente ao avanço dos OGMs em seus territórios. Ademais, a elaboração de novos guias de avaliação de riscos contribui para a continuidade do debate científico internacional sobre os impactos dos transgênicos, superando o argumento das empresas, sem base científica, de que não há qualquer impacto à biodiversidade derivado da utilização em larga escala de transgênicos.


A continuidade da realização dos guias de avaliação de riscos também contribui para que países que já detém conhecimentos e especialistas no tema, a exemplo do Brasil, possam ter um parâmetro internacional sobre a eficácia da avaliação realizada no país. No Brasil diversas são as críticas realizadas à CTNBio, uma vez que o órgão realiza as liberações comerciais sem observar a legislação interna e internacional, colocando em ricos a biodiversidade e a saúde da população brasileira, como afirmado por organizações de direitos humanos, cientistas e movimentos sociais que realizaram, ano passado, um seminário sobre os impactos de dez anos de liberação comercial de transgênicos no Brasil.


Quanto às falhas da CTNBio no processo de liberação comercial de transgênicos a Terra de Direitos, em parceria com o Instituto de Defesa do Consumidor – IDEC e a Associação Nacional dos Pequenos Agricultores-ANPA, conseguiram importantes avanços, tais como o reconhecimento da necessidade de realização de estudos em todos os biomas nacionais para as liberações comerciais. >> Clique aqui para saber mais.


Outro Grupo de Experts mantido nos trabalho dos países parte do Protocolo trata dos impactos socioeconômicos da liberação de OGMs no meio ambiente e/ou para fins de alimentação humanos, animal ou de forma processada. Este tema está contemplado no artigo 26 do Protocolo de Cartagena e permite às Partes que decidam sobre pedidos de autorização de importação OGMs considerando aspectos socioeconômicos, estimulando assim a realização de estudos de impactos. A carta da sociedade civil brasileira com recomendação ao governo brasileiro, elaborada por 20 movimentos sociais e organizações, apontou posicionamento favorável a manutenção do Grupo de Experts sobre o tema.


A permanência dos grupos marca o reconhecimento da necessidade da elaboração de estudos acerca dos transgênicos. Entre os fatores mais preocupantes está a dependência do uso de agrotóxicos em produções transgênicas, como comprova Victor Pelaez, diretor do Observatório da Indústria de Agrotóxicos e professor da Universidade Federal do Paraná. Pesquisas do Observatório apontam que, entre 2000 e 2004, após a utilização da soja transgênica no Rio Grande do Sul, ainda de maneira ilegal, o consumo do glifosato aumentou 162%. Recentes estudos da Universidade Nacional de Rio Cuarto (UNRC), da Argentina, comprovam os danos genéticos e, consequentemente, as doenças causadas por este agrotóxico. O glifosato continua sendo um dos venenos mais utilizados no Brasil.


André Dallagnol, assessor jurídico da Terra de Direitos que participou da MOP7, ressalta os impactos socioeconômicos dos transgênicos, no cotidiano de produtores rurais convencionais, que acabam utilizando mais agrotóxico, e na vida de produtores agroecológicos, orgânicos e comunidades tradicionais,que podem ter seus cultivos contaminados pela semente transgênica e por venenos. Na outra ponta estão os consumidores que, “pelo avanço dos transgênicos nas prateleiras dos supermercados, se vêem cada vez mais sem o direito de opção”. Dados do relatório do Isaaa (Serviço Internacional para Aquisição de Biotecnologia Agrícola), publicado no primeiro semestre deste ano, mostram que o Brasil é país que mais cresce em área para produção com transgênicos, com um aumento de 10% em 2013. A área com uso de transgênicos aumentou em 3,7 milhões de hectares no país, entre 2012 e 2013.


A preocupação de Dallagnol é de que até a próxima MOP, que deve acontecer no México, em novembro de 2016, “novas liberações comerciais devem acontecer sem que existam parâmetros internacionais de biossegurança, desconsiderando os impactos socioeconômicos dessas tecnologias sobre a população em geral.Quem paga a conta, dessa demora, somos nós”.


A inexistência de parâmetros internacionalmente uniformes para as liberações comerciais de OGMs tem impacto direto na população, tendo em conta que no Brasil a análise de impactos socioeconômicos não é realizada, uma vez que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio não tem competência para tal função e o Conselho Nacional de Biossegurança não se reúne para realizar tal avaliação.


Sociedade civil brasileira na COP MOP


A sociedade civil brasileira participou da MOP7 com a presença de André Dallagnol, assessor jurídico popular da Terra de Direitos, Marciano Silva, do Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA, e Lourdes Laureano, da Articulação Pacari. O grupo representou cerca de 20 organizações que participaram de uma oficina preparatória à MOP7, realizada em setembro.


O encontro resultou na carta de recomendações “De Onde Brotam as Sementes”, que foi entregue ao Itamaraty, à Secretaria Geral da Presidência da República, à Casa Civil, e aos Ministérios do Desenvolvimento Agrário, do Meio Ambiente, da Ciência e Tecnologia, da Saúde e da Defesa. Para esta oficia, a Terra de Direitos elaborou o 4º boletim informativo, que serviu de subsídio para o debate, assim como em edições anteriores da COP MOP.

 

Fonte: MST

 

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