Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

“Sinal dos tempos. Um novo sopro.” Foi assim queD om Tomás Balduíno expressou sua percepção quanto à renovação de forças que defendema democratização de terras no Brasil. O fato que serviu de base para apercepção é o tamanho do público que conferiu as palestras proferidas por elee, dois dias seguidos nos estados de Goiás e Piauí. Envolvido na defesa deste direito humano há várias décadas, Dom Balduíno tem grande vivência elegitimidade para seu indicador subjetivo, que atesta a crescente mobiizaçãosocial em prol da divisão das terras, ser levado em consideração.

A fala de Dom Balduíno na mesa de abertura do IEncontro Nacional de Acesso à Terra no Semiárido, realizada ontem (10), noCentro de Artesanato Mestre Dezinho, em Teresina, foi de quem conheceprofundamente a história de privatização da terra no Brasil. E por conhecer afundo, é capaz de levar a plateia a fazer um passeio pelos ciclos de maior oumenor pressão social a favor da democratização das terras

Clique abaixo para escutar trechos da fala dobispo.

Com voz pausada e tranqüila, típica de religiosos,o bispo ressaltou alguns fatos relevantes da história do Brasil queinfluenciaram a consolidação da concentração de terras e o movimento deresistência e luta das organizações camponesas. Ele destacou como ponto deinício para a mobilização social o Concílio da Igreja Católica que marcou aabertura da igreja para o mundo. Na América Latina, as orientações do concílioforam referendadas em Medelín e foi validada a opção da igreja na defesa dospobres. “A igreja aparece como uma força de consenso e grande credibilidadejunto à sociedade”. Daí, começam a surgir as comunidades eclesiais de base, que”percebem as pessoas como sujeito, autor de sua própria emancipação. Elas nãoeram mais vistas pela igreja como objetos de ação caritativa”.

A mobilização destas comunidades é ameaçada com ogolpe militar de 64, que segundo o bispo “quebra a espinha dorsal dasorganizações camponesas.” “Porém, no meu testemunho pessoal na diocese de Goiástínhamos um centro de treinamento de líderes, os lavradores se reuniam lá comassessoria que eles mesmos convidavam. Para os militares, os homens estavamreunidos para oração. Na verdade, era o nascimento das organizações populares.Não digo que foi só a única força, mas que atuou na área indígena e camponesa,em vista de transformação. Houve uma nova força dentro do país no sentido demudança. As organizações camponesas começaram a se articular e foram elas quefinalmente colocaram um operário no governo, Lula. Graças a essa força dasbases, essas massas populares conscientizadas e formadas com suas liderançaspróprias. O que veio depois? O marasmo. O próprio Lula não incentivou a reformaagrária. Qual o plano da reforma agrária? Nenhum”.

Em seguida, ele pontua as leis queinstitucionalizam cada vez mais a propriedade de terra nas mãos da elite. Aprimeira lei de privatização da terra foi a Lei da Terra, em 1850, trinta anosantes da abolição da escravatura. A segunda, foi em 1931, no governo de GetúlioVargas, que dificultou a posse da terra pública pelo instrumento jurídico do Usucapião,quando é comprovado que a família ou comunidade vive naquela terra há mais dezanos. A terceira fase de medidas legais que dificultaram ainda mais a divisãodas terras, de acordo com o bispo, ocorreu no governo Lula com as medidasprovisórias que regularizam a grilagem na Amazônia.

Diante do cenário apresentado de aumento da posseda terra em mãos de poucos, o Dom proferiu uma tese defendida há 25 anos pelaComissão da Pastoral da Terra (CPT), da qual foi fundador, presidente e hoje émembro. “A solução é ocupar. Se for esperar que seja dividida entre osnecessitados, isso não acontece de forma alguma. Tanto que saiu uma sentença deum ministro do Superior Tribunal de Justiça dizendo que a ocupação não é umafurto, nem roubo de terra. É uma forma de mostrar ao país, ao governo, que nãohá reforma agrária, não se faz reforma agrária. É um testemunho de indignação”.

O bispo também salienta que toda a luta pela terrafoi no sentido de mudança social, não só de sobrevivência pela posse da terra.E cita o movimento Zapatista do México que defende a ideologia da mudança dasociedade a partir da inclusão dos pobres. E, por fim, evoca: “Não basta tomaro poder. Precisamos levar uma visão diferente do mundo, do homem, da mulher”.

Por Verônica Pragana – Asacom
Teresina – PI
11/08/2011

 

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