O Diário da Manhã conversou com dom Tomás na porta do gabinete da presidência da Agepel. O bispo estava de saída depois de acertar com a presidente da agência, Linda Monteiro, lançamento da Agenda Latino-americana durante o Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica), que, este ano, acontece de 16 a 21 de junho. A publicação, editada em oito idiomas e vendida em 30 países, foi a deixa para o religioso começar a entrevista falando com entusiasmo do que chama de início da libertação da América Latina. “Estou voltando da Itália. Fui ao Vaticano participar da celebração que lembra a morte de dom Romero, assassinado em 1980, em El Salvador. Depois de tanto tempo de luta, os países da América Latina estão se libertando. É uma beleza ver índios, negros, mulheres e trabalhadores assumindo suas identidades. Sendo agentes de suas próprias histórias.”
Dom Oscar Romero foi morto no dia 24 de março de 1980 dentro da capela do Hospital Divina Providência, em San Salvador, capital de El Salvador. É cultuado como mártir pela corrente da Igreja Católica que fez a opção pela defesa dos mais pobres. Dom Tomás diz que esse movimento incomoda porque provoca mudanças profundas. “Dom Oscar foi morto porque defendeu os camponeses. Esse processo de libertação chegou a países como Venezuela, Bolívia, Equador, Paraguai e El Salvador. As populações marginalizadas, como as comunidades indígenas, eram ignoradas. Era como se não existissem. O que acontece no Paraguai é impressionante. Os guaranis, que eram os donos de tudo, foram relegados. Era como se não se reconhecesse a sua existência. E eles estão aí se apresentando, buscando seus direitos históricos”, lembra.
Dom Tomás diz que a Igreja plantou uma semente que frutificou em movimentos sociais sólidos no continente. “Temos uma pequenina responsabilidade. Na verdade, o próprio povo, em suas bases, estava pronto. Nos anos 1970 e 1980, a opção pelos pobres foi o fermento de um projeto revolucionário. A Igreja semeou no campo fértil do coração do povo. Nós mostramos o caminho.”
O entusiasmo do bispo com os camponeses tradicionais, que plantam para a subsistência, parece fora de foco no ambiente goiano, dominado por grandes empresas rurais, que produzem a preços baixos, beneficiadas pela economia de escala. Ele tem prontos os argumentos: “Não somos contra a empresa rural. Somos contra o latifúndio improdutivo, que é desonesto. Pois a terra não cumpre sua função social. E somos contra a monocultura que devasta a natureza. Precisamos salvar o nosso planeta.”
Dom Tomás diz que a monocultura da cana só serve para destruir o Cerrado. “Dizem que o álcool é combustível limpo. Ele é limpo só do cano de escapamento do carro para fora. Vai melhorar o ar dos países ricos ao custo do sacrifício das nascentes que alimentam as grandes bacias do Amazonas e do Rio da Prata. Até trabalho escravo foi descoberto em áreas de produção de álcool.”
Dom Tomás diz que sua missão é lutar pela reforma agrária e apoiar os mais pobres. E sabe o tamanho do combate: “Existe uma guerra do Poder Judiciário e de grande parte da mídia contra os movimentos populares. A ditadura que começou em 1964 veio para quebrar a espinha dorsal da organização camponesa. Isso volta hoje. O pessoal que não quer mudança está ligado à repressão. Defendo ocupação de terra improdutiva. Apoio os trabalhadores com orientação bíblica e jurídica. Sou subversivo.”
Fonte: Diário da Manhã, 7/04/09