Violência em despejo deixa três sem terra feridos em Alagoas
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Brasília - Na tarde desta quinta-feira (31) foi realizada uma violenta operação de reintegração de posse em Porto de Pedra(AL)
Logo no início da manhã, as trinta e duas famílias que viviam há cinco anos no acampamento Lucena acordaram diante de um contingente do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar de Alagoas (BOPE), sob comando da Polícia Federal, posicionado na entrada da ocupação.
A área onde se localiza o acampamento, com 390 hectares, foi desapropriada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA-AL) em 2001. Desde então, as famílias, ligadas à Comissão Pastoral da Terra em Alagoas, aguardavam a imissão de posse para obterem a titulação definitiva do terreno, de propriedade do usineiro Flavio Nunes Magalhães.
Magalhães entrou com recurso e obteve, em junho, a liminar de reintegração de posse através do juiz Frederico Dantas, da 7ª Vara da Justiça Federal de Alagoas. Para o superintendente do INCRA local, Gilberto Coutinho, existem enormes dificuldades de fazer avançar a reforma agrária no estado. “De um lado, há a intransigência dos proprietários, que não aceitam as propostas do INCRA para aquisição das áreas. Do outro, existe uma incompreensão do Judiciário em considerar as terras improdutivas”, declarou Coutinho.
O despejo ocorreu hoje, de forma violenta, a despeito do histórico de boas relações entre as polícias alagoanas e os movimentos sociais. A Polícia Militar de Alagoas chegou a receber prêmios nacionais em reconhecimento ao seu respeito pelos direitos humanos. Ademais, já estava agendada, para esta sexta (1/9), em Brasília, uma audiência do INCRA local e representantes da CPT com o Ouvidor Agrário Nacional, Gercino Silva, que vinha tentando mediar o conflito, inclusive com gestões junto à Justiça.
Segundo Henrique Santos, coordenador estadual da CPT, dezenas de trabalhadores sem terra de outras regiões do estado se deslocaram para o acampamento Lucena, em ato de resistência e solidariedade junto às famílias do local. Santos afirmou que o BOPE entrou no acampamento de forma repentina, usando bombas de efeito moral e disparando balas de borracha, enquanto os sem terra faziam uma vigília.
O coordenador também se mostrou surpreendido com a operação policial. “Apesar de vários momentos de conflito, nunca chegamos a esse nível de violência. Sempre negociamos com a Justiça e a polícia, cumprimos todos os acordos e acatamos todas as decisões judiciais”, declarou.
Defensores de direitos humanos, religiosos e representantes de entidades da sociedade civil tiveram sua entrada barrada no acampamento durante a tarde.
O consultor da ABRANDH em Maceió e presidente da Comissão de Direitos Humanos da seção alagoana da OAB, Narciso Fernandes, lamentou o uso da força por parte da polícia. “Temos a nossa polícia treinada para respeitar os direitos humanos e lidar com esse tipo de situação da forma correta. Quando imaginamos que os conflitos agrários não mais resultariam em pessoas feridas como conseqüência da repressão, acontece uma coisa como essa, cuja responsabilidade é do juiz federal, que recusou o pedido do ouvidor agrário nacional para suspender novamente o despejo”, lamentou Fernandes.
Henrique Santos também informou que a polícia destruiu as lavouras da comunidade e que o clima é tenso entre as famílias. “A lavoura que abastecia o acampamento e era até comercializada na região foi destruída, o que é inaceitável. E o pessoal está com muito medo, nunca passamos por uma situação de extrema violência como essa”, disse.
Três pessoas saíram levemente feridas pelo estilhaços das bombas e pelos projéteis de borracha. E amanhã (sexta, 1/9) as vítimas farão exame de corpo de delito para confirmar a violência sofrida na ação policial.
A desocupação foi concluída no final da tarde, mas já nesta noite as famílias começavam a retornar para o acampamento. O Relator Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Água e Terra Rural, Flavio Valente, vai acompanhar o caso.