As mortes dos dois trabalhadores, que aconteceram em setembro e outubro, só foram descobertas a partir de visitas feitas por agentes da CPT no bairro de Barra de Jangada, município de Cortês, no dia 17 de novembro. Na ocasião, a CPT foi informada que dois trabalhadores haviam falecido enquanto trabalhavam nos canaviais da usina Pedrosa.
O agente da CPT, Plácido Junior, comenta que muitos casos de trabalho escravo e mortes em canaviais não tornam-se de conhecimento público por vários fatores. “Muitos trabalhadores que se encontram em situação de exploração não denunciam suas péssimas condições de trabalho, com medo de perderem seus empregos e da ação violenta da Usina contra os que denunciam.” Outro fator é a conivência do poder público e de órgãos responsáveis para fiscalizar os canaviais. Das inúmeras denúncias feitas por organizações e movimentos sociais do campo, poucas são as que geram um processo de investigação e fiscalização, complementa Plácido.
Os casos
O trabalhador rural Severino Leite da Silva, de 49 anos, natural de Alagoinha (PB) e pai de três filhos, faleceu de infarto na manhã de 11 de setembro, enquanto trabalhava no corte da cana, na Usina Pedrosa. Segundo seus familiares, Severino trabalhava há muitos anos na Usina e, quando terminava o corte da cana, ele ainda fazia outras atividades na Usina. Severino chegou a morrer segurando uma feixe de cana.
O segundo caso aconteceu no dia oito de outubro, quando o jovem Macionildo Pereira de Lucena, de 24 anos, também natural de Alagoinha (PB), faleceu enquanto cortava cana, no Engenho Barra de Jangada, também da usina Pedrosa. De acordo com a certidão de óbito do trabalhador, a causa da morte foi um Edema agudo nos pulmões e infarto agudo no miocárdio.
A mãe de Macionildo, Dona Neuza, comentou que no ano passado Macionildo trabalhou sete meses na mesma Usina. Ela lembra que o filho saiu de casa “gordo” e voltou “magro”, que ele comentava com a família que trabalhava como um burro de carga, se queixava muito de dores de cabeça, do sol quente e de que tinha que almoçar em pé, sem nenhuma proteção do sol, o que muitas vezes azedava a comida. Dona Neuza afirmou ainda que o agenciador (gato) não procurou a família para dar satisfações do ocorrido.
Esses não são os primeiros casos de mortes em canaviais. Só em São Paulo, maior produtor de etanol no Brasil, foram registrados 21 mortes de trabalhadores em canaviais do estado, entre os anos de 2004 e 2008. De acordo com a pesquisa realizada por Maria Aparecida de Moraes Silva, professora da Universidade Estadual Paulista (Unesp), as condições de trabalho atuais nos canaviais brasileiros são piores que na época da escravidão. A pesquisa comprova a relação das mortes com o excesso de esforço físico, com à rotina "penosa" e "desumana" dos canaviais. Nas décadas de 80 e 90 o canavieiro e canavieira permanecia na atividade por 15 anos. Hoje, ela acredita que esse prazo tenha diminuído para 12. Um trabalhador chega a cortar mais de 15 toneladas de cana por dia, sob o sol forte, o que ao longo dos anos vai destruindo o seu corpo.
Além de serem causadas pela exaustão física, as mortes nos canaviais também estão relacionadas ao uso e contato intensivo com os agrotóxicos e a falta de Equipamentos Individuais de Proteção (EPIs). Para Aristides Santos, presidente da Fetape, “É lamentável a falta de cuidado com o ser humano, a preocupação do empresariado é de tirar o máximo do trabalhador”, comenta.
Dados do Trabalho escravo em Pernambuco - Em 2008 e 2009, Pernambuco aparece entre os estados onde mais foram encontrados trabalhadores em situação análoga ao trabalho escravo. De acordo com dados da CPT, em 2008 foram 309 trabalhadores libertados nos canaviais no estado. Dados parciais da CPT mostram que o ano de 2009 já superou 2008: mais de 360 trabalhadores já foram libertados até o mês de novembro em PE. “Esses números de trabalho escravo não são à toa. Em plena expansão do setor, essas mortes revelam a crueldade do processo de produção do etanol, que tem origem no processo colonial e que persiste até hoje” denuncia Plácido Junior.
Outras informações:
Plácido Junior
Comissão Pastoral da Terra
Fone: (81) 8893-4175
Aristides Santos
Fetape
Fone: (819226-1874)