Para compreender o tamanho do nosso desafio, precisamos entender os problemas estruturais que expulsam a nossa juventude dos seus territórios e pioram a nossa qualidade de vida.
Por Larissa Padilha e Paulo Romário
Do Brasil de Fato | São Paulo (SP)
Afirmamos que o agro-hidro-mineral negócio e o capital financeiro expropriam os nossos territórios, a classe trabalhadora e a nossa juventude promovendo fome, miséria e a destruição ambiental. Somos nós, filhos e filhas da classe trabalhadora quem primeiro sofre as consequências brutais do capitalismo, morremos primeiro, somos expulsos do campo e não temos acesso a educação, a trabalho e à vida digna. Portanto, é a nós que interessa a construção de um projeto de país soberano, que combata a fome, a miséria e tenha no centro da questão ambiental, os povos camponeses, tradicionais e indígenas que habitam os territórios.
Vivemos sob a hegemonia do neoliberalismo com a sua ideologia dominante do imediatismo, individualismo, competitividade e do empreendedorismo. Isso se aplica no campo, somos os principais alvos da ideologia dominante e dos valores individualistas, através do Agro é Pop, Agro é Tech, Agro é Tudo, que o agronegócio busca apresentar para a juventude a sua ideologia dominante de um agronegócio moderno e preocupado com a questão ambiental, o que todos nós sabemos se tratar de uma farsa.
Na verdade o modelo do agronegócio, não distribui renda e nem gera emprego para juventude, é ele o responsável pela precarização da vida, pela crise ambiental, com o envenenamento do solo e da água pelos agrotóxicos, pelo desmatamento, produção e emissão de gás metano pela pecuária, pela perda da biodiversidade através do monocultivo, gerando as mudanças climáticas em curso. Portanto, temos uma desordem ecológica global.
Sabemos que nossas raízes vêm de cada ato de sacrifício e coragem que tomamos enquanto povo brasileiro e filhos e filhas de uma classe trabalhadora que se forja nas ocupações, nas marchas, nos barracos, nos campos, nas águas e nas florestas.
Precisamos olhar para esses territórios e vê-los como um ambiente em que pulsam vidas na sua abundância e diversidade. Portanto, uma questão central é a democratização da terra, por meio da Reforma Agrária e a demarcação de territórios indígenas e quilombolas.
Não existe vida sem a terra. Não existe qualquer possibilidade de reflexão que não passe pelo acesso à terra. Outro elemento importante intrínseco ao direito à terra e aos territórios é a questão ambiental, que está no centro da luta de classes e precisa ser entendida assim. Não temos dúvidas que só os povos camponeses, tradicionais, quilombolas e indígenas são capazes de produzir alimentos e cuidar dos bens naturais.
Sendo assim, sinalizamos abaixo os desafios mais urgentes da Juventude do Campo, das Águas e das Florestas, extremamente necessários para a reconstrução do País. Os desafios estão divididos entre a produção, inclusão digital, vida digna, educação e cultura. Como dissemos não há vida sem a terra.
É necessário, além da produção e reprodução da vida, ver a terra como espaço para gerar renda para a nossa juventude, portanto, avançar na produção é fundamental para se ter alimentos saudáveis para superação da fome. Desse modo, o primeiro ponto é produzir alimentos saudáveis, tendo como matriz tecnológica a agroecologia. Indo além, uma produção cooperada rompendo com a lógica individualista do agro-hidro-mineral.
A Inclusão digital e o acesso à internet é crucial para permanência da Juventude no Campo, nas Águas e nas Florestas, pois possibilita o desenvolvimento de geração de renda e melhoria da qualidade de vida. É necessário garantir a comunicação e a informação como um direito básico, promovendo a inclusão através da criação de mecanismos de integração como rede de energia elétrica, sinal de rádio, televisão e telefone, partindo da estruturação de antenas de rádio e internet, rádios comunitárias, telecentros comunitários, contribuindo para o acesso à informação, criação de redes de comercialização, educação, e uma melhor vida no interior do país.
Não queremos apenas habitar o território, queremos construir caminhos para garantir nossa existência plena e para isso lutamos pelo direito de moradia digna, de infraestrutura, saneamento básico ecológico, garantia de uma cidadania hídrica e a uma política nacional de saúde do campo para nossa juventude. São questões básicas para a garantia de vida digna.
Nosso último desafio se apresenta na perspectiva de reivindicar o direito à educação e à cultura produzidas pelo e para o povo. A educação historicamente foi negada aos sujeitos da classe trabalhadora e, no campo, só foi possível por causa do Programa Nacional de Educação nas Áreas de Reforma Agrária (Pronera), uma política pública que, milhares de camponeses e camponesas puderam se alfabetizar, escolarizar e ter acesso ao ensino superior.
O acesso à educação crítica e emancipadora para a Juventude do Campo, das Águas e das Florestas precisa ser prioridade. Assim como, a construção e afirmação da cultura camponesa, quilombola, indígena e dos povos tradicionais, referenciar a sua forma de ver, produzir e estar no mundo.
As cultura camponesa, quilombola, indígena e dos povos tradicionais precisam ser alicerçadas em novas relações humanas, onde não haja espaço para o machismo, racismo e LGBTfobia. Entendemos que a cultura é central na batalha das ideias, por isso, precisamos de pontos de cultura nos territórios semeando a vida comunitária, a produção cooperada e agroecológica, a identidade camponesa como contra-hegemônica ao modelo disseminado pela cultura do Agro-Hidro-Mineral.
Por fim, enfatizamos que a juventude precisa aproveitar essa janela histórica para estar no centro da reconstrução do Brasil derrotando o Bolsonarismo nas ruas e enterrando para sempre o fascismo e o modelo de sociedade que devasta nossos sonhos. Para tanto, a juventude do Campo, das Águas e das Florestas precisa ter acesso à terra e o direito aos territórios para produzirem alimentos saudáveis, conservando e cuidando dos bens naturais e do bem comum e, combatendo a crise ambiental. Depende da juventude construir novas possibilidades de relações, construir o outro mundo possível.
* Paulo Romário é militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na Paraíba e assessor da Pastoral da Juventude Rural (PJR). Doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).
** Larissa Padilha também é militante do MST no estado da Paraíba e mestra em Direitos Humanos pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel).
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Brasil de Fato
Edição: Rodrigo Durão Coelho