Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Vamos acompanhando as notícias de Belo Monte, particularmente a partir de suas vítimas e de todos que se opõem a obra. É perfeitamente possível entender e sentir a indignação dessas pessoas e povos. Nós temos aqui no São Francisco, na carne, o que significa a imposição de uma obra, contrariando toda legislação, todo parecer técnico, todo bom senso, todo respeito pelos direitos dos povos que ainda habitam essa terra.

Desde o princípio dissemos que o que acontecia no São Francisco tinha o caráter do regime militar. Alguns defensores da obra chegaram a dizer que "era melhor realizá-la sob a democracia que sob a taca dos militares". Acontece que os militares executam a obra e ela é uma concepção do regime militar. Agora, quando proprietários de terra da Paraíba resolveram parar as máquinas das empresas por não terem sido ainda indenizados, a empreiteira não teve dúvida: chamou o Exército.

Um dia, sentado na calçada da capela onde fazia seu segundo jejum, um jornalista internacional perguntava e afirmava a Frei Luiz: "Bispo, seu jejum é inútil. O capital não tem interesse em sua vida. O Senhor vai morrer e eles vão fazer a obra".

D. Luis ficou em silêncio por alguns momentos, naquele seu jeito reflexivo e depois respondeu com um provérbio chinês: "Quando você aponta o dedo em uma direção, o sábio olha para onde o dedo aponta, o idiota olha para a ponta do seu dedo".

O jornalista ficou em silêncio e não disse mais nada.

Essa é a questão retomada agora por todos os lutadores no caso de Belo Monte. O gesto profético de Frei Luis apontava muito mais que para uma obra, apontava para a direção do país que queremos. Ele terá rios? Terá florestas? Terá biodiversidade? Terá povos originários morando em seu habitat, preservando o que ainda nos resta de natureza?

Não está garantido que sim. Não é uma obra, nem duas, é uma concepção de mundo. O desenvolvimentismo brasileiro é obreirista, ainda que tenhamos despencado no ranking da educação e da preservação ambiental, exatamente no governo Lula. Portanto, despencamos em questões fundamentais onde residem critérios de qualidade, apesar de avançar em obras.

Transposição, Belo Monte, indicam que, dos militares, passando por FHC e Lula, chegando a Dilma, a compreensão de desenvolvimento implica no sacrifício da natureza e dos povos que habitam esses ambientes.

Nossa solidariedade, ainda que abatida e humilhada, aos povos e lutadores do Xingu.


* Agente Pastoral da Comissão Pastoral da Terra - Roberto Malvezzi, Gogó

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=45301

 

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