Quilombolas da comunidade do Charco, em São Vicente Ferrer (Baixada Maranhense), além de outras 30 comunidades, fizeram um protesto, na manhã de ontem, em frente ao Tribunal de Justiça do Maranhão, na Praça Benedito Leite (Centro de São Luís). Eles dizem que vão acampar no local para reivindicar celeridade da Justiça no julgamento de processos que tratem da regularização de terras a assentados. Também denunciam assassinatos de trabalhadores rurais cometidos durante os conflitos agrários. Os quilombolas afirmaram que só deixarão o acampamento após receberem a visita de algum representante do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de Brasília e da Fundação Palmares.
POR JULLY CAMILO
Segundo o advogado Diogo Cabral, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MA, e representante da Comissão da Pastoral da Terra (CPT), atualmente existem 190 conflitos de terras no estado, com um total de 23 pessoas ameaçadas de morte, 280 áreas com processo de titulação junto ao Incra, além da morte de cinco lavradores (ocorridas nos municípios de São Mateus, São Vicente Ferrer, Codó e Santa Luzia do Paruá). Ele revelou que o houve um aumento de 62,5% de casos de violência contra o homem do campo e em consequência destes números o Maranhão já é o primeiro lugar no país em conflitos de terra, ultrapassando o Pará, que desceu para o segundo lugar. Em terceiro, vem o estado do Tocantins.
“A lentidão dos órgãos responsáveis em regularizar as terras favorecem o grileiros, que expulsam os quilombolas e ocupam as áreas com plantio de arroz, criação de búfalos, peixes, entre outros. Porém, isso é proibido, pois essas comunidades têm direito a propriedade definitiva garantida em lei”, disse Diogo Cabral.
De acordo com Cabral, no caso da comunidade do Charco, já existe um processo penal e administrativo em relação às terras da Fazenda Juçaral, de mais de 1.400 hectares. A gleba teria sido pleiteada em 2005 pelo Instituto de Colonização e Terras do Maranhão (Iterma) e pelo Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Sintraf) do estado. “Porém, um ano depois, o Incra teria feito uma divisão irregular da área, beneficiando quatro herdeiros do fazendeiro Manoel de Jesus Martins Gomes, o Manoel de Gentil, que se diz proprietário da área em questão. Por sua vez, o Incra tem até agosto deste ano para produzir um Relatório Técnico de Demarcação. Caso contrário as 145 famílias do Charco serão despejadas. Mas o instituto já nos disse que não tem recursos para executar o projeto, e ainda tem a corrupção dentro do órgão. São fatores que provocam a lentidão no processo”, declarou Cabral.
As Comissões denunciam que vários trabalhadores rurais estão sendo ameaçados de morte. Após o assassinato do líder quilombola Flaviano Pinto Neto, de 45 anos, morto a tiros no município de São João Batista, em outubro de 2010, outras lideranças comunitárias foram perseguidas.
Em decorrência disso, o trabalhador rural Manoel Santana foi integrado ao Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos da Presidência da República e está sendo acompanhado e protegido 24 horas por homens da Força Nacional. “Vamos integrar também ao programa o vice-presidente da Associação dos Quilombolas do Povoado Charco, Almirandir Ferreira, que teve sua casa atingida por três tiros, disparados por pistoleiros, na última sexta-feira, 27. Queremos ajuda do Incra nacional e da Fundação Palmares, pois os órgãos maranhenses fecharam os olhos para o problema”, afirmou o advogado Diogo Cabral.
O vice-presidente da Associação dos Quilombolas do Povoado Charco, Almirandir Ferreira, disse que já esperava pela ação criminosa por parte dos grileiros, mas ressaltou que não teme por sua vida e sim pela segurança e integridade física dos familiares. Ele afirmou que continuará na luta a favor das áreas pertencentes a sua comunidade e que tem certeza que só deixará está terra quando Deus o chamar.
O fazendeiro Manoel de Jesus Martins Gomes, o Manoel de Gentil, já havia sido preso provisoriamente no dia 22 de fevereiro, mas ficou detidos menos de 24 horas, graças a habeas corpus do Tribunal de Justiça do Maranhão. A soltura do fazendeiro foi criticada pela Comissão de Direitos Humanos da OAB/MA.