Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

A Desembargadora Federal, Maria Lúcia Luz Leiria, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Sul) reconheceu, ao cassar na última quarta-feira (09) uma liminar que impedia a regulamentação das terras dos remanescentes de quilombo da Comunidade Paiol da Telha, do Estado do Paraná, o direito fundamental das comunidades tradicionais aos seus territórios.

A decisão da desembargadora, segundo Maria Rita Reis, da Terra de Direitos, representa uma importante vitória para o reconhecimento dos territórios pertencentes às comunidades tradicionais quilombolas, no momento em que o governo federal tenta modificar instrução normativa do INCRA, devido às pressões da bancada ruralista e de setores militares.

A decisão liminar concedida pelo juiz de 1º grau, Paulo Cristóvão de Araújo Silva Filho, na Ação Ordinária movida por Cooperativa Agrária Industrial de Guarapuava, Paraná, declarava a inconstitucionalidade do Decreto n° 4.887/2003 e da Instrução Normativa nº 20/2005 do INCRA, dispositivos que permitem a regularização das terras ocupadas por remanescentes de quilombos. A decisão do juiz fez com que o procedimento de titulação do território da Comunidade de Remanescentes de Quilombos – Paiol de Telha, que estava em andamento, fosse suspenso. O Incra recorreu da decisão do juiz alegando que o processo de titulação do território da Comunidade Paiol da Telha está resguardado pelo Art. 68 do Ato das disposições constitucionais transitórias resgatando “uma dívida histórica do povo e do governo brasileiro para com os remanescentes de quilombos”.

Foi em resposta ao agravo apresentado pelo Incra que a Desembargadora, Maria Lúcia Luz Leiria, decidiu cassar a decisão anterior do juiz de 1º grau. Dentre outros argumentos, Leiria descartou em sua decisão a inconstitucionalidade alegada e esclareceu que o caso se enquadra na “possibilidade constitucionalmente prevista para desapropriação para fins de preservação do patrimônio cultural”. Outro ponto destacado pela desembargadora foi o artigo 13.1 da Convenção 169 da OIT, dando relevância para “a importância especial para que as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui na sua relação com as terras e territórios, ou com ambos, segundo os casos, que eles ocupam ou utilizam de alguma maneira e, particularmente, os aspectos coletivos dessa relação”, cita a decisão . A constitucionalidade está ainda fundada na premissa de que o Decreto 4887/2004 e Instrução Normativa não criam direitos, apenas instituem procedimentos para a sua realização.

A desembargadora afirmou ainda que a convenções 169 da OIT, lei basilar dos direitos dos quilombolas, prevê ações afirmativas, que implicam dizer “que todos os tratados de direitos humanos são materialmente constitucionais e compõem, pois, o bloco de constitucionalidade, de forma que, por um lado, ampliam o núcleo mínimo de direitos e garantias constitucionalmente consagrados, adicionando novos princípios que equivalem às próprias normas constitucionais, como se nelas estivessem escritos, e, por outro lado, constituem o próprio parâmetro de controle de constitucionalidade”.

Para a Terra de Direitos, “Essa decisão é muito relevante pois afirma a constitucionalidade das normas referentes à titulação do território em um momento muito importante já que nacionalmente está ocorrendo uma grande ofensiva contra os direitos territoriais das comunidades quilombolas”. Entre os dias 15 e 17 de abril será realizada uma consulta pública para mudança da instrução normativa nº 20 do INCRA, a medida visa burocratizar o procedimento, para assim, na prática, impedir a titulação dos territórios. A comunidade de remanescentes de quilombos - Paiol de Telha, com mais de 100 famílias fica localizada no município de Guarapuava, Paraná, é o primeiro grupo a ser reconhecido como quilombola no estado do Paraná, com certidão emitida pela Fundação Cultural Palmares.

 

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