Recém-empossada ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a senadora licenciada Kátia Abreu afirmou, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo publicada no último dia 05, que não existe mais latifúndio no Brasil. A declaração causou indignação à sociedade civil e organizações sociais do campo, mas, no entanto, não foi uma surpresa. Repudiada por diversas organizações sociais nacionais, a nomeação da Senadora, internacionalmente conhecida por Miss Desmatamento, foi um verdadeiro tapa na cara daqueles/as que tinham a esperança de avanços na pauta da Reforma Agrária e dos direitos humanos no campo neste segundo mandato da Presidenta Dilma Rousseff.
A postura da nova ministra já era prevista, a exemplo de nota emitida pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) antes de sua posse: “a nomeação de Kátia Abreu é uma sinalização clara e explícita de que para a Presidenta, neste novo mandato, os povos indígenas, as comunidades quilombolas e outras comunidades tradicionais, os sem terra em geral, continuarão a ser tratados como entraves que devem ser afastados de qualquer jeito para que o ‘desenvolvimento econômico’ aconteça em nosso país”.
Integrante da bancada ruralista, Kátia Abreu assume a estratégia de negar e silenciar a existência do latifúndio para que ele permaneça intocável e violento. No entanto, a realidade desmascara o discurso da nova ministra. Só nos dois últimos anos (2013 e 2014) 64 pessoas foram assassinadas em conflitos no campo no país, de acordo com dados da CPT. Mais de 200 mil trabalhadores e trabalhadoras rurais encontram-se atualmente reivindicando um pedaço de terra no país, como apontam os levantamentos dos movimentos sociais do campo.
Os números apontam os conflitos causados pela estrutura fundiária, não só concentrada, mais também improdutiva e violenta e por isso, explicitam, a contragosto da ministra, a urgente e necessária Reforma Agrária no país. Para Denis Vensceslau, agente pastoral da CPT, a declaração de Kátia Abreu expressa que o latifúndio não é defendido somente por pistoleiros e capangas com armas em punho, mas a própria estrutura do estado defende o latifúndio com suas armas.
Levantamentos feitos pelo próprio Incra apontam que no Brasil os latifúndios não só persistiram como aumentaram. Durante os anos de 2003 a 2010 (Governo Lula) foram 100 milhões de hectares a mais para os latifúndios. Nesse mesmo período, o percentual de terras improdutivas correspondia a 40% das grandes propriedades.
Do outro lado, e em uma pasta bem menos prestigiada pelo Governo, Patrus Ananias, novo ministro do Desenvolvimento Agrário rebate as afirmações de Kátia Abreu ao defender em sua posse que é preciso quebrar as cercas dos latifúndios. Esta solução, no entanto, não virá do Governo Federal, a exemplo da histórica discrepância orçamentária e de prestígio entre as duas pastas, que já está ainda mais visível neste segundo mandato da presidenta.
A declaração de Katia Abreu anuncia o que vem pela frente neste mandato de Dilma Rousseff: latifúndio vivo e voraz versus enfrentamento e resistência dos movimentos sociais e comunidades camponesas. A depender do Governo, o Brasil permanecerá no topo da lista dos países que mais concentram terras no planeta, que mais utilizam agrotóxicos, que mais produzem transgênicos, que mais registram casos de violência em conflitos agrários, que mais degradam o meio ambiente. O agente da CPT, Plácido Junior ironiza a ministra declarando que se o Brasil não tem latifúndio é porque ele já é um próprio latifúndio. Um latifundio onde os povos do campo resistem e sonham em refundar o país. "É preciso refundar o Brasil”.
CPT NE 2