Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Reafirmando a decisão judicial de primeira instância, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) manteve, ontem, a decisão que condena a multinacional Delmonte Fresh Produce pela morte do trabalhador rural Vanderlei Matos, contaminado pela exposição crônica a agrotóxicos na Chapada do Apodi, em Limoeiro do Norte. A empresa, que havia entrado com recurso, terá que pagar indenização por danos morais e materiais, além de verbas trabalhistas a Maria Gerlene Silva Matos, viúva de Vanderlei.

A história do trabalhador foi revelada pelo Diário do Nordeste na série de reportagem Viúvas do Veneno. Conforme a desembargadora Regina Gláucia, relatora do processo, as evidências científicas apontadas pela Universidade Federal do Ceará (UFC), bem como a perícia médica do Ministério Público, tornam "irretocável" a decisão que responsabiliza a empresa pela hepatopatia grave induzida por substâncias tóxicas.

Causa e efeito
"É inquestionável a existência do nexo causal contaminação e morte. A empresa diz que ele morreu de hepatite viral fulminante, mas isso foi descartado, bem como outras doenças", afirma a desembargadora. O revisor do processo, desembargador Emanuel Furtado, defendeu como "brilhante" a decisão da relatora. "É importante ressaltar que a exposição aos agrotóxicos torna vulneráveis não somente os trabalhadores que trabalhavam diretamente, mas as pessoas próximas", avalia.

A médica Raquel Rigotto, professora e pesquisadora da UFC, acredita que essa decisão judicial irá pressionar as empresas a mudarem a forma de atuar com os trabalhadores e a produção agrícola.

De acordo com Cláudio Silva Filho, advogado da família de Vanderlei, a condenação da empresa nesse processo é um fato inédito no Ceará e raro no País. "Diante de todas as evidências científicas, tanto da Universidade como da própria perícia do Ministério Público, não resta dúvidas da morte pela exposição ao veneno. Essa decisão do TRT é inspiradora para o trato dessa questão em todo o País", acredita Filho.

Atenta aos pronunciamentos dos juízes, a viúva Gerlene Silva aguardava ansiosa por um desfecho. Alheia à literatura jurídica, soube com um sinal de positivo do advogado Cláudio Silva que os desembargadores estavam confirmando a decisão anterior. Emocionada, agradeceu à "grande família" que lhe surgiu, em referência aos pesquisadores e aos movimentos sociais que passaram a acompanhar o caso. Ligou para a mãe dando a boa notícia e, de carona, seguiu de volta para Limoeiro do Norte reencontrar Davi Matos, seu filho com Vanderlei, trabalhador morto em 2008, quando o menino tinha apenas 2 anos.

A história de Vanderlei encapou o terceiro e último dia da série de reportagens Viúvas do Veneno, publicada nos dias 17, 19 e 20 de abril de 2013. Empregado no setor de almoxarifado da empresa Delmonte, na Chapada do Apodi, Vanderlei era responsável pelo manuseio dos agrotóxicos. A ação judicial movida pela família esperava há quatro anos por um julgamento, que veio semanas após a publicação da reportagem.

Fundamentação
A história de trabalho, contaminação e morte de Vanderlei é um dos casos, ainda raros no País, de fundamentação científica que fazem o nexo causal da morte do trabalhador por agrotóxicos. Isso porque pesquisadores do Núcleo Trabalho, Saúde e Meio Ambiente para a Sustentabilidade (Tramas), da UFC, fizeram incursão científica na tentativa de descobrir a causa da morte de Vanderlei.

Para o professor e líder comunitário Reginaldo Ferreira, do Movimento Conlutas, a condenação da empresa serve de alerta para que mais trabalhadores possam conquistar seus direitos. Há vários outros casos registrados de contaminação por agrotóxicos em Limoeiro do Norte. Ainda cabe recurso para a decisão do TRT.

Melquíades Júnior
Repórter

 

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